Por tratar-se de reflexão de um cientista político respeitado, a hipótese da pretensão de Lula a um terceiro mandato, aventada em entrevista do professor Leôncio Martins Rodrigues a este jornal, provocou uma frenética agitação entre políticos e comentaristas, especialmente entre oposicionistas. A opinião geral de que esta é uma possibilidade mais que improvável, pelo menos por enquanto, não elide o fato de tratar-se de um tema exemplarmente descabido e inoportuno. Diga-se, de antemão, que se houve a intenção de líderes oposicionistas de provocar prematuramente sua discussão para torpedear no nascedouro eventuais ambições continuístas do presidente Lula, a discussão do tema, neste momento, pode levar a efeito exatamente contrário, ou seja, acostumar o distinto público à idéia - que em circunstâncias normais só poderia causar estarrecimento.
É de uma obviedade ululante - para usar a ênfase rodriguiana - que, se oferecessem a Lula (e não só a ele!) a possibilidade de exercer uma fileira contínua de mandatos presidenciais, ele não a recusaria, mesmo que “docemente constrangido”, para usar a expressão cunhada por Carlos Lacerda para definir o sentimento com que o marechal Castelo Branco aceitou a prorrogação do próprio mandato. (Mas, justiça seja feita, a verdade é que nossa ditadura militar teve o pudor, inédito na história das ditaduras, de limitar os mandatos dos generais-presidentes.) Em compensação, já houve no Brasil quem tivesse ficado 15 anos contínuos no Poder e a ele tivesse voltado (ao final por eleição).
E impossível nada parece sob estes tristes trópicos, mesmo que nosso sistema democrático tenha evoluído muito e disponhamos de dimensões institucionais bem superiores à de alguns de nossos hermanos de Latinoamerica. O que é incrível é como pessoas lúcidas podem empenhar-se em forjar “profecias auto-realizáveis”, ou incentivar cobiças alheias que vão ao encontro de seus próprios medos!
Claro está que, da parte do próprio Lula, tais especulações são dulcíssimas melodias levadas aos seus ouvidos, sobre as quais manterá um prazeroso silêncio - que poderá ser quebrado mais adiante se sentir-se suficientemente forte para tentar a inédita ousadia do “tricampeonato”. Afinal, não há como deixar de considerar o argumento-chave do professor Leôncio: “Não é fácil acreditar que, dispondo de, digamos, uma aprovação de 60% ou 65% no seu último ano, e tendo uma quantidade tão grande de subordinados na máquina petista e aliada, ele (Lula) mande parar as campanhas em favor de sua permanência. Há ainda o discurso dos movimentos populares e sindicais, de que se ele sair o neoliberalismo volta e estraga todo o progresso obtido.”
O fato é que há os que chegam ao despropósito de considerar que o recém-lançado Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) é, justamente, a plataforma de lançamento do terceiro mandato presidencial. Não estaria havendo, aí, a supervalorização de um programa de governo que está mais para o vaporoso do que para o substancioso, como já se percebeu? Outros acham que a imagem desgastada do Congresso Nacional, a falta de uma boa bandeira oposicionista tanto quanto a inexistência de alguém, nos quadros petistas - ou de seus aliados -, com cacife político para suceder ao presidente, tudo isso conduziria, forçosamente, à solução via terceiro mandato presidencial.
Bem é de ver, no entanto, que aí estão sendo subestimadas a força da opinião pública e a capacidade de mobilização da sociedade brasileira (certamente bem maior do que a venezuelana, a boliviana e a equatoriana, juntas) na defesa de arraigados princípios democráticos, que há muito adotamos. Além disso, ninguém tem o direito de duvidar que, até agora pelo menos, são sinceros os votos de Lula de fidelidade a esses princípios consagrados na Constituição.
Embora aqui não nos cansemos de criticar governantes que não saem do palanque eleitoral, é preciso dar-se o mínimo de crédito de confiança aos que, apesar do primado de suas ambições eleitorais - já realizadas ou por realizar -, pensam também no trabalho em favor do interesse público, com o qual constroem as biografias que pretendem legar. Nem tudo, enfim, consiste em projetos de conquistas de novos mandatos. É preciso que políticos deixem de ficar obcecados com a obsessão que vislumbram em seus adversários.
Entrevista:O Estado inteligente
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