Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, janeiro 26, 2007

Míriam Leitão - Até que ponto?


Panorama Econômico
O Globo
26/1/2007

A última decisão do Copom levantou duas dúvidas: primeira, o Banco Central é do contra? Segunda, até que ponto os juros podem cair? A primeira pergunta é feita por quem acha que o BC deve fazer parte do esforço do governo para acelerar o crescimento. A segunda, por quem olha a rentabilidade das aplicações financeiras e verifica que um fundo DI está se aproximando da caderneta de poupança.

A resposta para a primeira dúvida, apresentada por políticos e industriais, é fácil: nenhum banco central garante crescimento; seu papel é vigiar a moeda. Tem que cumprir a meta, implícita ou explícita, ao menor custo do produto. Como no ano passado o país cresceu menos do que se imaginava, e teve uma inflação abaixo do centro da meta, a crítica mais comum feita ao Banco Central é que ele sacrificou mais produto que o necessário.

A segunda é mais complicada, porque implica se avaliar muitos aspectos da economia brasileira: solidez fiscal, regras de remuneração de aplicações e capacidade de a economia responder ao aumento da demanda sem pressão inflacionária.

Os juros caíram durante 17 meses, saindo do absurdo patamar de 19,75%, em setembro de 2005, para os ainda altos 13%. Até que nível podem cair? Do ponto de vista estritamente financeiro, a situação é esta hoje: um fundo DI da Caixa Econômica rende 12,52%, mas essa aplicação paga 15% de Imposto de Renda, o que leva a rentabilidade líquida para 10,64%. A poupança rende 8,33% (2,33% da TR, mais 6% de juros), não paga imposto e tem menos riscos. Se os outros ativos financeiros não conseguirem competir com a poupança, o que acontece?

Tipo de dilema bom de ter, pois mostra uma economia começando a ter juros mais normais. Mas é difícil resolver. O que se diz no mercado é que os bancos privados podem não querer captar em poupança quando aumentar a demanda por essa aplicação. O banco tem que aplicar parte do que capta em poupança no SFH, empréstimos imobiliários para baixa renda com juros subsidiados. Esses juros subsidiados ficam em torno de 10% hoje. Uma taxa que já foi barata antes, e agora começa a ficar cara.

O que essas e outras contas mostram é que o Brasil ficou tempo demais com juros altos e criou distorções. Será preciso resolvê-las para continuar reduzindo a taxa abaixo de certo nível. Ainda há espaço para novas quedas, mas isso tem que começar a ser pensado agora.

- Se a Selic cair 0,25 ponto percentual nas oito reuniões do ano, chegará ao fim de 2007 em 11% de juro nominal. Se a inflação for 4%, o juro real estará em 7% - comenta o professor Luiz Roberto Cunha, da PUC.

Comparando com outros países - com o México, por exemplo, cujos títulos indexados pagam inflação mais 4,5% -, acharemos a atual taxa brasileira alta. Mas será a mais baixa da nossa história desde que a inflação caiu. Na super e hiperinflação, era impossível comparar, porque houve momentos até de juros negativos, mas porque a inflação subia de repente.

- Hoje há uma convicção entre os economistas de que os juros de equilíbrio de longo prazo no Brasil são mais baixos que no passado. Algo entre 7% e 8%, abaixo de 10%. Os juros ex-ante (descontando-se a inflação futura) estão em torno de 9%. Estamos prevendo 11,5% de juros nominais ao fim de 2007; isso faria com que os juros reais chegassem a 7,5%. Hoje, o governo paga menos para se financiar; o risco soberano é 2 pontos percentuais acima dos treasuries; o Brasil tem dívida externa líquida negativa. A economia é mais estável e mais previsível. Com a dívida/PIB caindo, o risco fiscal é mais baixo, o que faz com que o governo tenda a disputar menos no mercado de crédito. Acho perigosas as políticas de expansão fiscal, pois é justamente o controle fiscal, e a estabilidade que ele traz, que ajuda a fazer com que os juros caiam - diz o economista Roberto Padovani, do WestLB.

A próxima ata terá que explicar muito bem o motivo da redução da queda. Os políticos, os empresários podem achar que foi uma resposta à advertência feita pelo ministro da Fazenda ao presidente do Banco Central no meio da cerimônia do PAC. Não faz muito sentido essa interpretação: o governo não tentou interferir na avaliação técnica feita pelo BC; só foi mesmo um palpite infeliz do ministro.

Mas o que, então, motivou a decisão do Banco Central? Tem gente que acha que houve, nas últimas semanas, uma pequena pressão inflacionária. Na verdade, ela não é importante. Alguns preços que subiram são de áreas em que há competição, como hortifrutigranjeiros, e, quando as chuvas passarem, eles podem voltar a cair. As tarifas este ano pressionarão menos; a energia pode ter reajuste negativo. A preocupação maior do BC seria com o fato de que a queda já ocorrida dos juros - quase sete pontos percentuais - está acelerando o consumo e reativando a economia. Os gastos do governo, inclusive com o PAC, vão aumentar a demanda agregada. A queda de juros continuará produzindo efeitos nos próximos meses. Em resumo: a queda já ocorrida dos juros contratou um aumento da atividade econômica que já aparece em alguns indicadores. Por isso, seria preciso ir mais devagar com o andor.

Pode ser que o BC tenha razão - ou não -, mas de fato, daqui para a frente, será sintonia fina para se saber com que ritmo e até que ponto os juros brasileiros podem cair.

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