Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, janeiro 26, 2007

Infeliz aniversário- Barbara Gancia




Folha de S. Paulo
26/1/2007

Como se pode exigir ordem de uma metrópole que não respeita o seu ar, a sua saúde mental e o seu patrimônio?

SÃO PAULO comemorou ontem seus 453 anos, mas, excetuando o sempre otimista Gilberto Dimenstein, quem pode dizer que a cidade está de parabéns?
Dou alguns exemplos para ilustrar meu pessimismo: recentemente, a prefeitura instalou lixeiras plásticas em vários pontos da cidade. Quando se percebeu que os recipientes estavam sendo furtados e transformados em caixas d"água, a administração pública tratou de furá-los.
Adiantou? Claro que não. Daí para frente, as lixeiras passaram a ser levadas para virar plástico reciclado.
A cada mês, algo em torno de 130 km de fios e cabos são furtados na cidade. E a gente viu, pelo exemplo das ruas Oscar Freire e José Paulino, a mão-de-obra que dá e quanto custa enfiar os fios para baixo da terra.
Tampas de bueiro são roubadas para vender ao ferro-velho por gatunos que andam pela cidade em peruas kombi com fundo falso. Isso mesmo. E a gente ainda se solidariza quando vê alguma perua velha parada no meio da rua, achando que se trata de um problema mecânico.
Na semana passada, fui apresentada ao ministro Guido Mantega e ele me perguntou como encaro o futuro. Bem, por mais que veja com bons olhos um genovês ocupando o cargo de titular da Fazenda, (para quem não sabe, os nativos de Gênova são conhecidos pela muquiranice. Minha avó, também de Gênova, era tão mão-de-vaca, mas tão mão-de-vaca, que não penteava o cabelo para não ter de repartir), quem mandou o ministro, muito cordial, diga-se, cutucar esta humilde datilógrafa com vara curta? Fui obrigada a dizer a verdade. Que, na minha modestíssima opinião, se o sonho não acabou, está cada dia mais distante.
A irrelevância do país na pauta do Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça, é só um dos indicativos mais palpáveis do estado das coisas.
No que diz respeito a São Paulo, por mais que tentem heroicamente salvar o centro ou domar a falta de educação do cidadão, como se pode esperar ordem de uma cidade que não exige respeito com seu ar, sua saúde mental e seu patrimônio?
Quantas vezes o nobre leitor já não viu lata de refrigerante ser jogada pela janela do carro? Como se pode admitir que São Paulo feche o olho para os caminhões velhos e/ou de motor desregulado que circulam livremente cuspindo monóxido de carbono nas nossas fuças? Por que não existe uma lei que impeça a fabricação e comercialização de rojões, bombas e foguetes que, além de perigosos, acabam com os nervos de recém-nascidos, idosos, pessoas enfermas e animais de estimação?
Para quem acha que lixeiras, tampas de bueiro, fios e cabos, fumaça e rojões são café pequeno, proponho um debate mais substancioso.
Já que ainda estamos sob os efeitos da ressaca causada pelo acidente nas obras do metrô, gostaria de saber: por que apenas cinco empresas dominam as concorrências de obras públicas na cidade de São Paulo, no Estado e no resto do país? Por aqui, o Fura-Fila é obra da Queiroz Galvão, a ponte Jurubatuba é obra da Camargo Corrêa, os hospitais são feitos pela Andrade Gutierrez, a linha 4 do metrô está sendo tocada pela Odebrecht e a OAS constrói os CEUs.
Será que não existe mais ninguém na engenharia tapuia que dê conta do recado?

barbara@uol.com.br

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