Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, janeiro 26, 2007

Luiz Garcia - Saindo e não voltando




O Globo
26/1/2007

Há bons motivos de otimismo em relação à inédita combinação de esforços de União e estados contra o banditismo urbano. Pelo menos, estamos vendo sinais visíveis de que agora e por enquanto não só o crime é organizado.

Mas existe uma frente de combate ainda esquecida. É a porta giratória no sistema penitenciário. Giratória, acentue-se, apenas num sentido: de dentro para fora.

O caso mais recente no estado é o de Robson Caveirinha, condenado a 46 anos de reclusão por seqüestro e homicídio. Crimes hediondos, portanto. Mas isso não impediu que um juiz auxiliar da Vara de Execuções Penais, dias atrás, tenha assinado permissão para que Caveirinha deixasse o Presídio Edgar Costa, em Niterói, para visitar a família. Pelo visto, família grande e espalhada: o moço sumiu.

Foi o segundo caso recente no mesmo presídio. Os seus portões também se abriram para o agora sumido traficante Marcelo PQD. Um terceiro bandido - Adlas Ferreira, traficante e seqüestrador - já conseguiu passar para o regime semi-aberto e qualquer dia destes partirá para visitar a família. Podem apostar: família grande e espalhada. Como foi o caso, já há algum tempo, de Zaca do Dona Marta e William Professor, bandidões da pesada que ganharam liberdade condicional.

"Eles saem e não voltam," confirmou esta semana o secretário estadual de Administração Penitenciária, inconformado conhecedor dos precedentes. Em diversos casos, as autoridades têm absoluta certeza de que os bandidos libertados retomaram o comando de suas quadrilhas - o que deveria provocar automaticamente o cancelamento da liberdade condicional. Mas não existe no Brasil qualquer sistema organizado e eficiente de controle da liberdade condicional. Na prática, ela é incondicional.

O Supremo Tribunal Federal deu a sua mãozinha para o agravamento da situação: em decisão de um ano atrás, decidiu que condenados por crimes hediondos têm direito ao sistema de progressão da pena. Pode ser uma decisão correta - ou admissível, o que não é a mesma coisa - mas não leva em conta a realidade. O fator decisivo da concessão é o tempo de cadeia, não a constatação de sinais confiáveis de regeneração. Basta que o interno não mate ninguém nas celas, não participe de motins e não seja flagrado encomendando atos de violência lá fora.

Em resumo: existe a garantia de que os chefões conhecidos das facções criminosas, todos em penitenciárias de segurança máxima, não serão beneficiados pela generosidade indiscriminada. Mas, graças à decisão do STF e a um sistema de liberdade condicional que não impõe condições, seus prepostos - e possivelmente herdeiros -- estão voltando às ruas depois de cumprir uma fração da pena imposta pelos tribunais.

Tenho a impressão de que, nos últimos tempos, já escrevi este artigo umas três vezes. Ou dez. Lamento muito, mas é um problema que insiste em não ir embora.

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