Desta vez, foram os papas dos papas que se reuniram em Washington não para discutir o que, afinal, poderão fazer com o Iraque, onde homens-bomba matam aos milhares para ter uma virgem só sua a cada dia e outra pela eternidade, mas, sim, se os americanos e os europeu vão ou não desobstruir as seriíssimas negociações sobre a liberalização do comércio agrícola entre os países da OMC. Afinal, o nosso patrício José Barroso já estava cansado, pois, acreditem, essas negociações iniciaram-se em 1995, já duram 12 anos, e, até agora, um passinho para cá, outro passinho para lá, tudo continua no mesmo...
Pobre Bush. Não sabia o que dizer na coletiva com a imprensa. É lógico que somos pela abertura comercial, mas, vocês sabem, os Estados Unidos são também um grande produtor, um enorme celeiro agrícola. Mas, acreditem, vamos encontrar uma solução.
E passou a bola para a coitadinha da Susan Schwab, que se enrolou toda.
Ela disse que era preciso continuar negociando ainda mais, que a Índia e o Brasil precisam fazer algumas concessões, enfim, o lengalenga de sempre, que já dura 12 anos e deve durar outros tantos mais.
ENQUANTO ISSO, NO BRASIL
O nosso inefável ministro Amorim afirmou que as negociações se estavam aprofundando, que os grupos dos agroexportadores estavam ágeis, enfim, a baboseira, sim, baboseira, sem-fim de sempre.
VAMOS À REALIDADE?
Pois o leitor quer mesmo saber o que está acontecendo nesse imbróglio todo? Voltamos às fontes que criamos em 13 anos de Europa e ao nosso informadíssimo correspondente em Genebra, Jamil Chade, falamos com as pessoas que não mentem nem escondem nada no Itamaraty, e aqui vai o resultado da pesquisa revelando as grandes lorotas que as áreas oficiais andam dizendo por aí.
1 - O cenário na negociação que agora se pretende, pela enésima vez, reiniciar, é dos mais complicados para o Brasil, em 2007.
2 - Na OMC, o processo está paralisado e analistas acreditam que, se nada for feito até março para promover a retomada das negociações, a Rodada Doha estará congelada até 2009. E olhe lá. Com otimismo. Quem fez essa afirmação à coluna é dos funcionários dos mais altos níveis da OMC
3 - Os principais obstáculos são as inflexibilidades tanto de europeus como de americanos, que não aceitam cortes mais significativos em tarifas agrícolas e subsídios.
Os americanos estão sendo pressionados para que apresentem um plano de cortes de subsídios que colocaria o teto da ajuda estatal ao setor em no máximo US$ 17 bilhões. Hoje, querem que esse teto seja de US$ 22 bilhões.
4 - Os europeus alegam que apenas reduziriam suas tarifas de importação em 50% se os americanos aceitassem os cortes de subsídios. Nem pensar.
Para os países emergentes e agroexportadores, como o Brasil, o cenário não é nada favorável. Em parte porque o Congresso americano, recém-renovado e com maioria democrata, certamente irá criar dificuldades para aprovar propostas comerciais vindas da administração Bush. Afinal, tanto os democratas quanto os republicanos dependem do voto dos agricultores superpoderosos.
5 - Se nada ocorrer na OMC, o próprio futuro das negociações do Mercosul com a União Européia pode estar em perigo.
Bruxelas não quer apresentar uma nova oferta de abertura de seu mercado ao Mercosul enquanto não souber o que ocorrerá na OMC. Mesmo quando souber, tentará incluir novos temas na agenda, como exigências sociais e laborais, itens rejeitados pelo Brasil.
O QUE ELES QUEREM É A ÁSIA
Os europeus também avisam que, em 2007, suas atenções estarão voltadas para as economias asiáticas, com as quais pretendem abrir negociações comerciais, e para a África, em termos de ajuda social.
6 - Na Alca, o marasmo tem tudo para continuar. Não há uma reunião técnica sobre o processo há mais de dois anos.
Ainda assim, os países são obrigados a arcar com as despesas da sede que se criou para o futuro bloco, na cidade de Puebla, no México.
O governo mexicano destina cerca de US$ 1 milhão todos os meses à manutenção do edifício, mas já decidiu despedir alguns dos funcionários do escritório por um motivo óbvio: não há o que fazer nos escritórios vazios da Alca.
7 - Com todos esses acordos em compasso de espera, o Brasil já indicou que colocará suas fichas no acordo entre cerca de 40 países emergentes para que haja um corte de tarifas entre eles para incrementar as exportações.
O Brasil sugere um corte de 30%, mas indianos querem menos. De todas as formas, a própria ONU já estimou que o eventual acordo geraria ganhos de pouco menos de US$ 2 bilhões para toda a América Latina, enquanto os asiáticos ganhariam quatro vezes mais e seriam os grandes beneficiados da iniciativa brasileira.
Para completar, os chineses não aceitaram entrar no processo, o que deixa de fora do acordo a economia emergente mais importante e que mais renda poderia gerar aos exportadores dos demais países em desenvolvimento.
E O CHÁVEZ, HEIN?
Bem, bem, para não complicar ainda mais nem vamos falar do nosso generalíssimo trapalhão e nem queiram imaginar como o nosso pobre Lula vai sair dessa... Já imaginaram o Chávez negociando com o Bush e a União Européia? Haja louças para serem quebradas.
Querem saber qual é mesmo a realidade? Só o Brasil e o ministro Amorim ainda acreditam em acordos, mesmo porque o nosso ministro fará tudo, como já fez, para continuar mostrando... Trabalho.
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