Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, janeiro 12, 2007

Míriam Leitão - Parado no caminho


Panorama Econômico
O Globo
12/1/2007

É desejável uma política de concessões de serviços públicos que defenda a concorrência e leve as tarifas a níveis mais baixos. O problema é que o governo está entrando em seu quinto ano e, só agora, descobriu que o modelo anterior era ruim. E pior: ainda não tem alternativa a ele, como admitiu a ministra Dilma Rousseff. Pelo visto, o que o país mais precisa é de um PAG, Plano de Aceleração do Governo.

O governo Lula é lento demais, e o país vai perdendo tempo que não pode perder. Na área da logística, o Brasil já enfrentou, nos últimos anos, uma série de crises nas rodovias, nos portos, no transporte aéreo. O caso da suspensão das licitações é um erro depois de uma seqüência deles na mesma área.

O governo Lula não conseguiu recuperar as estradas, apesar de ter arrecadado de Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico), imposto a ser usado nas rodovias, R$30,5 bilhões. Também não tocou adiante o programa de concessão de estradas, e não licitou um quilômetro durante os quatro anos do primeiro mandato. Fez uma desastrada operação Tapa-Buracos; tão superficial que os buracos já estão de volta. Agora, no começo do quinto ano de governo, descobre, subitamente, que o modelo é ruim, mas admite que não tem ainda uma alternativa a ele.

O empresário Paulo Godoy, presidente da Abdib, foi ontem a Brasília para uma reunião sobre o assunto com os ministros Paulo Bernardo, Dilma Rousseff e o interino da Fazenda, Bernard Appy.

- Voltei mais animado, porque a ministra disse que a suspensão da licitação não foi motivada por razões ideológicas, e que o governo não tem dúvidas de que quer atrair o capital privado para os investimentos em infra-estrutura - afirmou o empresário.

Outra notícia que Paulo Godoy colheu em Brasília é que não se pensa em criar uma estatal para cobrar pedágios nas estradas. Há dias, isso foi ventilado. A solução seria "destravar" os investimentos nas estradas através de pedágios cobrados diretamente pelo governo federal. Uma espécie de "Pedagiobrás". A idéia - se alguém a teve no governo - é realmente digna de um prêmio de sandice. Num processo em que não há licitação nem concorrência, que preço a estatal do pedágio poderia cobrar? Já pensaram na qualidade técnica do indicado político para a presidência dessa empresa?

Enfim, se esse bode saiu da sala, outras más notícias continuam: o governo não apenas permanece paralisado quando o assunto é infra-estrutura de transporte, como desfaz o que vinha sendo feito a passo de cágado. Nos últimos quatro anos, já foram várias modificações no modelo; tudo estava pronto, quando o governo suspendeu o processo.

Paulo Godoy acha que não faz sentido o argumento de que a suspensão da licitação foi uma decisão tomada para evitar a formação de cartel:

- Se há um processo competitivo, não há cartel. Qualquer risco de conluio pode ser evitado por regras do edital. O que temos visto é uma verdadeira batalha de preços e achamos que cerca de 30 grupos poderão vir a participar do leilão.

O empresário acredita que não deveria haver muita dúvida sobre a tarifa porque, na opinião dele, trata-se apenas de um cálculo matemático e técnico:

- Calcula-se o investimento, o custo de operação, a carga tributária e a taxa de retorno para se chegar ao valor do pedágio.

Porém o que a ministra Dilma Rousseff ponderou é que a taxa de retorno pode estar fora da realidade por dois motivos: o custo financeiro vai cair, pois os juros estão diminuindo fortemente; e a carga tributária será reduzida pelo pacote de desoneração tributária que será lançado em breve e que vai beneficiar principalmente o setor de infra-estrutura.

São duas boas ponderações, mas é bom lembrar que os juros brasileiros não terão níveis internacionais tão cedo e a redução tributária não será tão grande assim. De qualquer maneira, as novas variáveis poderiam apenas entrar no cálculo, em vez desse "pare tudo" que o governo adotou no processo licitatório, que, a propósito, já havia obtido até o aval do Tribunal de Contas da União.

O país inteiro quer pagar menos pedágio, mas, ao mesmo tempo, quer estradas melhores. O custo das estradas no estado em que estão é imenso. A perda de vidas é alarmante; o aumento do custo econômico, preocupante. Paulo Godoy citou um estudo da Escola de Agronomia de Piracicaba que mostra que o custo extra para uma empresa transportar seus produtos numa estrada ruim é de R$34 por quilômetro.

- O país tem de decidir o que quer fazer para ter uma estrada de qualidade. Só há três caminhos: a concessão para a iniciativa privada; uma parceria público-privada; investir na manutenção das estradas com orçamento público. Para evitar problemas como tarifas altas demais ou combinação de preços, basta a agência fazer a modelagem correta.

Apesar de ter voltado animado de Brasília, Godoy admite que o governo não deu prazos para que a decisão seja revertida e se retome o processo de licitação:

- O governo diz que vai retomar o mais breve possível.

Que bom que o empresário está animado, mas "o mais breve possível", no governo Lula, pode ser muito tempo.

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