Entrevista:O Estado inteligente

domingo, janeiro 14, 2007

Em defesa do padrão nacional JOÃO UBALDO RIBEIRO

Não entendo nada de mulher, claro. Aliás, ninguém entende, nem mesmo Freud, que, num momento de aparente exasperação, perguntou o que as mulheres querem e morreu sem saber.

Por sobre isso, mister se faz ressalvar que as considerações abaixo são feitas apenas por um amador, esforçadíssimo mas jamais um craque junto a elas, não contando com a experiência de certos amigos meus (alguns já finados, devem ter morrido disso), muito mais afeitos ao convívio com o afamado Eterno Feminino.

Para parco consolo nosso, creio que minha condição é partilhada pela maioria dos cada vez mais perplexos machos da espécie. Somos mais ou menos como torcedores de futebol — temos teorias que julgamos irretorquíveis, mas bem poucos somos bons de bola.

Sou provocado a aventurar-me em terreno tão resvaladiço por causa das notícias, cada vez mais freqüentes, de moças que, na busca de atingir o padrão de beleza vigente, caem vítimas de anorexia nervosa e morrem.

Ninguém gosta de saber desses acontecimentos tristes, motivados pela ânsia de identificação com o modelo hegemônico ou, mais patético ainda, pelo afã de ter sucesso numa carreira equivocadamente julgada fácil, mas dificílima e penosíssima, onde um número enorme de jovens se perde todos os anos. Mas, claro, só aparecem as lindas e bem-sucedidas, cuja vida para suas admiradoras é um mar de rosas de festas e glamour.

E que padrão de beleza é esse, será mesmo o padrão, digamos, “natural”, será de fato o preferido por homens e mulheres que não estão comprometidos com o conhecido “Barbie look”? Quanto às mulheres, massacradas sem clemência por gostosas irretocáveis (na verdade retocadas pelo Photoshop), que não têm uma Marcelo manchinha na pele, uma estriazinha escondida, uma celulitezinha e ostentam dotes de uma perfeição na verdade fictícia, não posso falar muito. Mas quanto aos homens posso, porque ouço a opinião de muitos deles e não só saudosistas do modelo violão (em inglês “hourglass look”, aparência de ampulheta), mas jovens também.

Em primeiro lugar, devo afirmar enfaticamente, não por demagogia ou qualquer interesse subalterno, mas em função de uma permanente pesquisa sociológica informal, existe vasto e devotado mercado para as gordinhas e até para as mais gordinhas do que as gordinhas. Meu querido e finado amigo Zé de Honorina deplorava a “falta de carne” da atualidade e a ausência de cintura que parece ser causada pela malhação contemporânea e admirava com sincero fervor estético certas enxúndias bem colocadas, em moças e senhoras que passavam pelo largo da Quitanda, onde fazíamos ponto. Eu mesmo tenho uma comadre gordinha, casada há décadas com um marido amantíssimo que a conheceu bem gordinha e fica indignado quando ela perde um quilinho.

Fatores culturais também interferem nisso. Se apreciamos uma calipígia (da bunda bela), as fronteiras com a esteatopígica (da bunda gordinha) são tênues e a rapaziada do boteco qualifica de divinal o que as americanas, que, para começo de conversa, não têm bunda nem para pensar em concorrer com a brasileira e, portanto, tendem a desdenhar o que não podem alcançar, consideram gorda. Mulher tem que ter cintura, violão ou ampulheta não interessa, mas é vital a formosa concavidade entre as costelas e as ancas. Creio mesmo que, consultada a opinião pública, tanto de homens como de mulheres, mesmo as descinturadas por uma malhação perversa, a maioria concordaria em que mulher tem que ter cintura, faz parte da figura feminina, é clássico, é até constituinte do doce mistério das mulheres. E há muitas gordinhas, sim senhor, mantidas no modelo violão. Está bem, violoncelo, mas com a cintura no lugar.

E sei que as descinturadas, conscientemente ou não, também sabem disso, porque noto, entre as muito fotografadas, que elas procuram sempre posar curvando os quadris para um lado, fingindo ainda ter a cintura insensatamente perdida.

Agora, para alegria dos violonófilos e cinturistas, chega evidência científica de que o padrão esquelético ou Barbie nunca esteve com nada, não deverá estar com nada no futuro e só está com alguma coisa no presente devido a interesses de mercado circunstanciais. Diz aqui numa revista científica que o dr. indiano Devendra Singh, da Universidade do Texas, chefiando uma equipe que analisou centenas de milhares de textos literários ocidentais, onde eles refletiam as preferências estéticas de suas épocas, chegou à conclusão de que a cintura, notadamente, a cintura fina, sempre foi elogiadíssima nas mulheres e tida como um elemento básico em sua beleza. Mais ainda, o dr. Singh estudou detidamente os dois grandes épicos indianos Mahabharata e Ram aya na, além de poesia chinesa clássica, e as referências à beleza das mulheres com cintura fina são inúmeras.

A tal ponto chegaram as pesquisas do dr. Singh, também diz aqui na revista, que sua conclusão é de que o cérebro humano é naturalmente programado (wir ed) para considerar a cintura, principalmente a fina, como parte essencial da beleza feminina. E, mais ainda, não se trataria de algo arbitrário na evolução da espécie, mas relacionado com a saúde. As que têm cintura — a-ha! — têm mais saúde. Isto sem dúvida abre horizontes quiçá radiosos para muitos de nós, homens ou mulheres, hoje escravizados pelo pensamento único imposto por estetas de meia-tigela. Os modernos somos nós, os violonófilos; as antiquadas são as Barbies. Espero que o país se una em torno do restabelecimento do legítimo padrão nacional e que a mulher brasileira, pioneira natural solertemente desviada por uma falsa modernidade colonizada, reassuma sua estatuesca e inimitável majestade de Vênus tropical, das cheinhas às magrinhas, todas com cintura e bunda, o Criador seja louvado.

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