Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, janeiro 18, 2007

Dora Kramer - Ninguém é de ninguém



O Estado de S. Paulo
18/1/2007

O governo vai dividido para a eleição da Câmara, mas a oposição também vai

No figurino 'missão impossível', a mensagem do PSDB para que seus deputados votassem em Arlindo Chinaglia, do PT, na eleição para a presidência da Câmara, se autodestruiu.

Não foram 5 segundos, mas também não chegou a muito mais o prazo de validade da orientação dada pelo líder do partido, Jutahy Magalhães Júnior, vocalizando as pretensões dos governadores de São Paulo e Minas Gerais.

Junto com a decisão, fabricada numa marotíssima consulta telefônica a 34 dos 63 deputados tucanos, se desfez no ar o argumento do critério da proporcionalidade. Semana passada o líder o invocava, dizendo que a candidatura alternativa era 'institucionalmente ilegítima' e, mesmo se o escolhido fosse alguém do PSDB, o partido deveria ficar contra por 'não ter direito' a disputar o cargo.

Pois indicado Fruet, o mesmo Jutahy, com a mesma convicção anterior, viu-se na contingência de considerar a escolha 'um fato novo e relevante que deve ser levado em conta', reconhecendo que o PSDB não tem como deixar de apoiá-lo. Sob pena de aprofundar a divisão interna, fortalecer seu principal adversário na luta político-eleitoral e comprometer seu papel de partido de oposição.

Abraçar a candidatura de Fruet, porém, significa admitir que a tese da proporcionalidade era falsa. Mera tentativa de dourar a pílula de um acerto em troca de cargos na Mesa e de apoio petista para eleger tucanos para a presidência das Assembléias Legislativas de São Paulo e Bahia.

Na Bahia, aliás, o critério da proporcionalidade não vale, porque o PSDB tem apenas dois deputados e combinou com o governador Jaques Wagner eleger o presidente em troca do apoio dado pelos tucanos à eleição dele.

Mesmo pagando o preço da incongruência e da face firme - para não dizer caradura -, o partido agora não tem muita saída a não ser apoiar Fruet. Se haverá traição no voto secreto, decorrente de acertos paralelos com Chinaglia, só o resultado dirá.

Fato é, porém, que a candidatura de Aldo Rebelo ganhou um respiro, a de Chinaglia sofreu um (pequeno) abalo e a de Gustavo Fruet ainda depende de conseguir mostrar a que veio.

Nada além disso é possível perceber por antecipação em relação ao resultado, embora seja nítida a instalação de um cenário de cada um por si: o governo vai para a disputa dividido entre dois candidatos, mas a oposição também vai fracionada, já que o PFL se mantém firme no apoio a Aldo Rebelo.

Embora a candidatura Chinaglia tenha um perfil mais oficialista, para todos os efeitos Rebelo também é candidato do governo. Se ganhar, Lula poderá contabilizar a vitória, dizendo que desde o início intuiu quem se investia do caráter de vencedor e espetar a derrota de Chinaglia na conta do PT.

Se o PT vencer, divide com o partido a glória.

O problema de disputas em ambientes onde ninguém é de ninguém é que tudo pode acontecer. Inclusive nada.

Duas canoas

O presidente Lula diz que apóia os dois, Aldo Rebelo e Arlindo Chinaglia, para a presidência da Câmara e faz lembrar um outro presidente, que numa eleição assumiu a defesa de dois candidatos ao mesmo cargo.

Foi em 1990, na eleição para o governo de Alagoas. Fernando Collor oficialmente apoiava os deputados Geraldo Bulhões e Renan Calheiros, seu líder de governo na Câmara.

Calheiros era o preferido das pesquisas, mas, na reta final, percebeu que Collor queria mesmo era a eleição do adversário, quando Paulo César Farias, o tesoureiro do esquema, mandou fechar as torneiras do financiamento à campanha do então líder.

Ganhou Bulhões. Calheiros rompeu com Collor assim que secaram as fontes de recursos, tendo o cuidado de omitir o real motivo, e saiu denunciando fraudes das eleições. Na ocasião houve anulação do pleito em alguns municípios, sendo um deles, o de Piranhas, área de influência do hoje presidente do Senado.

Serve como comparação com a atualidade? Não, confirma apenas a inexistência de querubins. Por mais crédulos que sejam em algum momento, quando ficam espertos dão a volta por cima. Em geral, ao custo da imposição de alguma derrota à esperteza de origem.

Caça-quieto

O PFL está dando 'gracias a la vida' pelo barulho da disputa na Câmara. É que, enquanto isso, o partido trabalha em silêncio pela candidatura do líder Agripino Maia à presidência do Senado.

Os pefelistas reconhecem o franco favoritismo do presidente Renan Calheiros, mas detectam providenciais insatisfações na 'base' com a desconfiança de que na composição do novo ministério o cobertor será curto para o tamanho da demanda por aconchego.

Senadores checam informações entre si e têm descoberto promessas do mesmo cargo feitas a mais de um. Há casos em que a oferta foi feita para três.

Mesmo assim, na avaliação do PFL, o presidente Lula jogou bem ao adiar as nomeações. Não fosse isso, acreditam pefelistas, a oposição teria assegurada a presidência.

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