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O trabalho é de formiguinha, mas o resultado, já se viu, pode ser o de uma bomba de efeito arrasador. O histórico do grupo de deputados que agora inicia um movimento em busca de nomes para concorrer à presidência da Câmara em alternativa às candidaturas “oficiais” de Aldo Rebelo e Arlindo Chinaglia confere crédito à iniciativa.
São três os exemplos mais eloqüentes de ações que começaram dispersas e aparentemente fadadas ao fracasso, mas acabaram tomando um vulto e um rumo inesperados: a reação à presença de Severino Cavalcanti na presidência, a decisão de criar a CPI dos Sanguessugas em pleno ano eleitoral e a rejeição a um ato conjunto das Mesas do Senado e da Câmara de aumentar em 90% os subsídios dos parlamentares às vésperas do fim da legislatura.
Esse portfólio confere pelo menos bom crédito ao grupo inicialmente formado pelos deputados Fernando Gabeira, Raul Jungmann, Carlos Sampaio e Chico Alencar e hoje já integrado por veteranos de destaque, como Luiza Erundina, José Eduardo Martins Cardozo, Walter Pinheiro e Osmar Serraglio, e novatos de renome, como o ex-ministro da Educação Paulo Renato Souza.
À primeira vista, a tentativa de transpor a reserva de mercado dos candidatos já postos e dos partidos já posicionados não tem força para seguir adiante dentro da Câmara. Pelo simples e objetivo motivo de que a movimentação dos “azarões” contraria toda a lógica da barganha e do corporativismo vigentes no Congresso.
Os partidários da “alternativa” querem buscar alguém não comprometido com a política de privilégios e que se disponha a levantar a bandeira da recuperação funcional e moral das atividades legislativas de modo a recuperar a confiança da população no Parlamento.
Ora, tais intenções são boas, vão ao encontro da demanda da sociedade, mas batem de frente com o compadrio e o fisiologismo correntes e que pautam as campanhas de Rebelo e Chinaglia. Não porque eles sejam os inventores das deformações, mas porque atuam em conformidade com elas para atender aos anseios do colegiado.
Quase ninguém ali está interessado em discutir como sair do fundo de um poço onde o escuro, tal como se apresenta, rende mais confortos que desconfortos. Se a lama de vez em quando produz um mau odor, o importante para a maioria é que é macia.
A doçura das vantagens perenes acaba compensando a aspereza dos momentos críticos.
Quando passam, tudo volta a funcionar na santa paz da dinâmica habitual. Basta ver como Chinaglia e Rebelo se mantêm olimpicamente distantes de qualquer assunto que remeta à avaliação negativa da opinião pública sobre o desempenho da Câmara.
O negócio deles é saber quem terá o apoio do presidente da República, do PMDB, do baixo clero, da oposição, mas sobre a instituição que é bom nada se discute. Ela se queda à matroca no aguardo de alguém disposto a travar o bom combate.
E aí é que entram os valorosos rapazes e moças da banda de música parlamentar, a bater mais uma vez seus bumbos na expectativa de uma adesão popular à sua tese de que vale o esforço de tentar contrariar o velho lema segundo o qual o próximo Congresso será sempre pior que o anterior.
Se esse movimento de agora não der em nada no tocante à eleição propriamente dita, no mínimo vai servir para ampliar a massa crítica do Parlamento, formar um núcleo de inconformados com a desmoralização para contestar e constranger permanentemente as ações do próximo presidente, seja ele Aldo Rebelo ou Arlindo Chinaglia.
Plano de ação
Na segunda-feira, os “contra” se reúnem para traçar a estratégia de ação, tentar chegar a um acordo sobre o nome do candidato alternativo a Rebelo e Chinaglia, elaborar uma plataforma de campanha baseada na agenda da recuperação e discutir a melhor forma de sensibilizar a sociedade.
Há divergências no grupo. Fernando Gabeira, por exemplo, está disposto a se apresentar como anticandidato. Paulo Renato Souza conversou com vários deputados de São Paulo e de outros Estados e percebeu que o lançamento de uma candidatura só para marcar posição não encontrará grandes apoios.
Se não for para disputar de verdade, os deputados não estão dispostos a contrariar as estruturas de seus partidos. “Temos de apresentar um candidato para valer”, diz ele.
Existem vários nomes cogitados, inclusive do PT. Paulo Renato acha até bom que o escolhido seja da base do governo, a fim de não caracterizar a ação como de oposição ao governo e sim de defesa do Legislativo.
São três os pré-requisitos já existentes para compor o perfil do candidato alternativo: parlamentar reeleito, veterano, portanto; filiado a partido com bancada expressiva e sem nenhum tipo de vinculação a qualquer fato comprometedor para a Câmara.
Só por este quesito, Aldo Rebelo e Arlindo Chinaglia estariam fora, pois ambos defenderam o aumento de 90% e não condenaram - ao contrário - as absolvições em massa de parlamentares envolvidos em escândalos.