Deu um vento na goiabeira global e o chão ficou forrado de fruta madura.
Ontem, os preços das ações desabaram. O Índice Dow Jones (Nova York) mergulhou 0,85%; Frankfurt, 1,2%; e o Índice Bovespa (Brasil) fechou em baixa de 4,03% - confira o gráfico que aponta o movimento de um mês. As cotações do ouro caíram 3,08%; as da prata, 4,71%; cobre, 2,58%; e outras commodities metálicas também baquearam. Os preços do petróleo chegaram a recuar 0,88%, mas, ao final do dia, se recuperaram e fecharam em alta de 1,30%.
Para entender o que aconteceu é preciso percorrer dois planos. O primeiro deles está nos medos mais difusos que percorrem a espinha dorsal dos mercados e que, lá pelas tantas, ficam especialmente ativados.
Há meses, as autoridades monetárias dos países ricos vêm passando o recado de que a inflação preocupa. Isso não significa necessariamente que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) e o Banco Central Europeu se ponham a puxar agressivamente pelos juros. Pode significar apenas que os juros seguirão no nível em que estão por mais tempo.
Quarta-feira, o Fed divulgou a ata da sua última reunião destinada a examinar os juros e insistiu em que a inflação americana, que anda à altura dos 3% ao ano, está ameaçando. Para bom entendedor, ficou reforçado o medo de que o aquecimento do consumo está num nível acima daquele que a sociedade americana e as autoridades estão dispostas a tolerar.
Ontem, o Departamento do Trabalho dos Estados Unidos mostrou que a criação de vagas em dezembro superou as expectativas. Em princípio, mais emprego só pode ser bom, porque comprova aumento da atividade econômica, puxa pelo faturamento das empresas, por mais consumo e por melhores resultados na economia. Mas, no contexto anterior, reforçou a percepção de que a economia americana está aquecida demais, situação que implicaria mais ação do Fed.
Mas não foi só isso - e aí já entramos no segundo plano de análise. O inverno no Hemisfério Norte, substancialmente mais quente do que o esperado, está reduzindo a demanda por derivados de petróleo destinados a calefação e geração de energia elétrica.
Foi o que passou a senha para a queda dos preços do petróleo, que, só nesta semana, caíram 7,8% na New York Market Exchange, já contada aí a recuperação do final do dia de ontem. Petróleo mais barato é fator que, em princípio, ajuda a derrubar a inflação. Mas, em vez de atenuar o eventual impacto dos juros futuros, precipitou o ajuste das carteiras dos fundos de hedge, que, nos últimos meses, vinham carregando demais nas commodities.
Desta vez, o mau humor global poupou as posições em títulos (mas não em ações) dos países emergentes. O prêmio de risco Brasil, que mede o grau de rejeição ou aceitação dos títulos brasileiros, conforme o ângulo de visão, caiu 2 pontos nos dez últimos dias. Isso mostra que o movimento dos aplicadores puxou o rendimento dos títulos americanos e reduziu a diferença do seu rendimento (yield) para o rendimento pago pelos títulos do Brasil.
O tranco desta primeira semana de janeiro não mostra nenhuma anomalia séria na economia mundial ou mesmo na americana. Sugere que tudo não passe de um movimento de ajuste, desses que acontecem de tempos em tempos. É como ter de trocar roupa pesada por mais leve depois de perceber que os serviços de meteorologia prepararam a população para um frio bem mais intenso do que o que acabou acontecendo.
O movimento básico persiste: os mercados estão inundados de dinheiro, especialmente de dólares, e há relativamente poucos ativos em que aplicar a dinheirama. Passado o susto, os aplicadores voltarão a fazer posições em ações, ouro e commodities. E em petróleo, como ainda ontem começou a acontecer. Enfim, ainda há muita goiaba lá em cima.
Falha nossa
O rio em cuja margem esquerda o governo uruguaio autorizou a construção de grande fábrica de celulose não é o da Prata, como constou na coluna de ontem, mas o Uruguai.