Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, março 28, 2006

Celso Ming - Tampão ou não tampão

Celso Ming - Tampão ou não tampão
O Estado de S. Paulo
28/3/2006

O novo titular da Fazenda, o economista Guido Mantega, é um soldado leal ao presidente Lula e essa é a principal razão para acreditar em que a política econômica não vai mudar pelo menos nos próximos nove meses.

Mas isso está longe de dizer tudo. Durante os três anos e três meses de governo Lula, Mantega foi mais crítico da atitude conservadora do ministro Palocci do que seguidor de sua orientação. Não escondeu divergências com Palocci nem com o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, nem com o secretário do Tesouro, Joaquim Levy.

Melhor dizer que Mantega mostrou vacilações sobre grande número de temas da política econômica. Mas antes de avançar nesses pormenores, convém avaliar o quadro mais amplo.

Depende do presidente Lula se Mantega será só um ministro-tampão ou se pretende vê-lo efetivado, se arrancar do eleitor um segundo mandato. Muito provavelmente, Lula não definirá isso agora; vai avaliar o comportamento de Mantega e sua aceitação junto aos atores da economia. A condição de ministro interino (ou quase isso) poderá tirar força na condução de sua pasta.

Assim, o primeiro desafio do novo ministro será mostrar que tem drive para comandar a economia e conquistar a confiança que Palocci esbanjou até agora, tanto aqui como no exterior.

Nos próximos dias, consultorias, empresas, analistas e comentaristas do mercado financeiro vão esquadrinhar as posições, algumas delas esquisitas ou polêmicas, que Mantega sustentou antes e durante o governo Lula. E terão mil razões para tentar saber que credo econômico afinal está professando.

Durante todo o tempo do governo Lula, Mantega atacou a falta de crescimento econômico e a prioridade dada tanto ao controle da dívida pública (aumento do superávit primário) como ao combate à inflação.

Dentro do governo, ajudou a bombardear a proposta do ex-ministro Delfim Netto e acolhida pelo ministro Palocci, de aumentar a meta do déficit nominal zero para que os juros pudessem cair mais rapidamente. Nas quedas de braço sobre a economia, ficou mais com a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, do que com Palocci.

Várias vezes Mantega foi instado, até mesmo pelo presidente Lula, a alinhar-se à política adotada. Disciplinadamente deixou-se enquadrar. Em dezembro, no seminário denominado "O Novo Mapa do Brasil", enfrentou outro opositor dentro do governo, o ministro do Desenvolvimento Luiz Furlan, desta vez em defesa da ortodoxia conduzida por Palocci. Nas últimas semanas, preferiu dizer que as condições da economia são tão boas que será muito provável um crescimento econômico de 5%, maior do que vinha sendo projetado até pelo Ministério da Fazenda (4%).

Mantega não foi menos crítico da política de juros do que o vice-presidente da República, José Alencar, com a diferença de que preferiu um vocabulário sem ferrão. Meirelles cobrou também a capitalização do BNDES para que pudesse conformar-se aos limites de concessão de crédito impostos pelas normas do acordo de Basiléia. Agora, Meirelles ficará subordinado formalmente a um dos seus antigos opositores. Boa pergunta é saber como antigas e eventuais novas divergências com o Banco Central serão conciliadas.

Com o secretário do Tesouro, na condição de presidente do BNDES, Mantega manteve um forte confronto sobre o pedaço da dívida pública administrado pelo BNDES. Os principais recursos com que trabalha o BNDES são do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Na medida em que figuram como depósitos, aumentam o passivo do setor público. O tamanho da Taxa de Juros de Longo Prazo, a TJLP, é ao mesmo tempo ponto de discórdia com o Banco Central e com o Tesouro. O Banco Central se queixa de que a TJLP, de apenas 9% ao ano, distorce a política de crédito. Essa distorção obriga o Copom a puxar para cima os juros básicos para compensar a maior generosidade do BNDES.

Uma das vantagens de Mantega é ser do PT. Mas falta saber até que ponto terá condições de defender dentro do partido a linha econômica do governo Lula. Nesse ponto, não conseguirá nunca comparar-se com Palocci e sua fala mansa.

 

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