Entrevista:O Estado inteligente

domingo, janeiro 08, 2006

VINICIUS TORRES FREIRE A esquerda dança com a direita

FOLHA
SÃO PAULO - Um sintoma crítico da degradação da esquerda é a louvação basbaque do Bolsa-família. Petistas de cátedra, jovens intelectuais de esquerda, militantes mais articulados e estrelas do esquerdismo mundial, como Antonio Negri, vêem sacrilégios nas críticas às bolsas sociais.
Negri, velho comunista, autonomista, ex-simpatizante das Brigadas Vermelhas e ora comunista pós-moderno, digamos, publicou na Folha de quinta uma defesa irada do governo Lula e do potencial revolucionário do Bolsa-família. O filósofo italiano não sabe do que está falando sobre o Brasil e entra na contradança da direita sobre políticas sociais.
Para a direita liberal, os inempregáveis da economia moderna devem receber sopão e trocados que permitam a seus filhos ir à escola e, no futuro, arrumar empregos na "economia do conhecimento". Negri e cia. dizem quase o mesmo, com a diferença de que quase o mundo inteiro será inempregável e que as bolsas sociais são o embrião da renda universal da sociedade sem trabalho.
Primeiro problema, outro traço comum entre direita e esquerda, é o universalismo vazio, ideológico, como se problemas econômicos e sociais fossem iguais no mundo todo.
O segundo é a conservadora rendição à idéia de que o trabalho acabou, tornou-se "imaterial" e nada há a fazer. O terceiro é ignorar que o Bolsa-família é uma parte menor do gasto social-assistencial. Faz barulho porque serve a mistificações ideológicas. À direita, como "política focalizada de produção de capital humano"; à esquerda, como "renda universal cidadã". Isto é, não é previdência rural (que nem é de fato previdência, mas bolsa administrada por idosos em suas famílias, 7 milhões de benefícios, gasto de R$ 25 bilhões), assistência social para incapacitados (2,2 milhões de benefícios, R$ 6,8 bilhões).
Ideólogos tratam tais bolsas como assistência equivocada, mas elas têm no Brasil quase o mesmíssimo papel do Bolsa-família (8,7 milhões de benefícios, R$ 6,5 bilhões). Enfim, nenhum desses programas surgiu com Lula, vêm de combates sociais velhos dos anos 60, 70 e 80, e serão paliativos insustentáveis se não houver também trabalho para o povo.

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