Entrevista:O Estado inteligente

sábado, janeiro 21, 2006

VEJA Os bastidores da última pesquisa presidencial

...e o segundo turno desapareceu

Na última pesquisa do Ibope, só se
divulgou o resultado do primeiro turno.
Quem ganhou com isso foi Garotinho


Ronaldo França

 

Paulo Liebert/AE
Ricardo Stuckert/PR
Daniel de Cerqueira/AE
José Serra e Lula (acima) continuam na liderança da corrida presidencial. No segundo turno, o tucano teria 45%, contra 42% do petista. Mas isso não foi divulgado: um erro assim... pequenininho, que por acaso ajuda o candidato a candidato Anthony Garotinho

Na noite da última quinta-feira, o Jornal Nacional informou com exclusividade os resultados da mais recente pesquisa do Ibope sobre a eleição presidencial. No dia seguinte, os principais jornais do país também publicaram os números. O quadro eleitoral apresentado não se alterou substancialmente. O que chamou atenção foi a forma como a pesquisa foi divulgada. Os veículos informaram que o Ibope não pesquisou as intenções de voto para o segundo turno – e isso não é verdade. O Ibope pesquisou, sim, o segundo turno. Está na pergunta número 8 do questionário aplicado pelos pesquisadores e disponível no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) desde o início da semana passada. O Ibope constatou, inclusive, que as intenções de voto no presidente Lula no segundo escrutínio aumentaram. Em dezembro, ele tinha 35% dos votos e hoje está com cerca de 42%. Já José Serra, que em dezembro tinha 48%, caiu para algo em torno de 45%. Lula, aliás, ganha de todos os outros candidatos no segundo turno. Menos de Serra. Como a margem de erro foi de 2 pontos porcentuais, para mais ou para menos, estariam num empate técnico. Os números estarão à disposição de todos no TSE na segunda-feira. Tudo isso, que os leitores e telespectadores adorariam saber, foi omitido. A TV Globo e os jornais foram, portanto, induzidos a erro. A empresa Três Editorial Ltda., mais conhecida como Editora Três, que publica a revista IstoÉ, pagou 126.000 reais pela pesquisa, registrou-a no TSE e intermediou sua divulgação na televisão. A forma como foi apresentada, só com os cenários relativos ao primeiro turno, beneficia o ex-governador do Rio de Janeiro Anthony Garotinho, que neste momento luta pela indicação de seu nome como o candidato do PMDB nas próximas eleições e cujas ligações com a Editora Três saltam aos olhos.

Nenhuma pesquisa eleitoral feita agora é capaz de avaliar com rigor as reais chances dos postulantes ao cargo. Elas servem apenas para influir nas convenções que os partidos farão para escolher seus candidatos. E no PMDB a briga interna é feia. O partido, uma espécie de balaio de gatos da política brasileira, tem longa tradição de divisões internas. Os números da pesquisa indicam que, no primeiro turno, Garotinho estaria em terceiro lugar, com 16% das intenções de voto, caso a disputa incluísse o presidente Lula (38%) e Geraldo Alckmin (17%). E que ele se manteria nessa posição, com 12%, se o candidato do PSDB fosse Serra (31%). Essa informação tem importância na batalha campal que é a convenção do PMDB. A pesquisa mostra que um de seus principais oponentes na disputa interna do partido, o governador do Rio Grande do Sul, Germano Rigotto, oscila entre 2% e 3% das intenções do eleitorado, de acordo com o cenário apresentado. Garotinho figuraria então como o nome mais forte em seu partido. Esse é o recado que, marotamente, o ex-governador do Rio de Janeiro pretendeu passar.

A omissão da parte da pesquisa relativa ao segundo turno obedeceu às conveniências de Garotinho em um aspecto adicional. O crescimento de Lula no segundo turno, em relação à pesquisa feita em dezembro, dá fôlego à ala governista do PMDB, comandada pelo senador José Sarney, que cogita uma eventual coligação com o PT. Caso os aliados peemedebistas do governo se fortaleçam, a reboque do crescimento de Lula, existe a chance – ou o risco, dependendo do ponto de vista – de o partido optar por não ter candidatura própria. Essa é uma possibilidade que assombra o ex-governador do Rio, cuja presença no partido é vista com muita desconfiança por seus pares. Ao longo de sua carreira, Garotinho já trocou de partido quatro vezes. Estreou no PT de Campos, no norte fluminense, esteve no PDT, mudou-se para o PSB após uma briga com o ex-governador Leonel Brizola e foi parar no PMDB, uma das maiores máquinas eleitorais do país. É a desconfiança de seus pares que faz com que ele precise se fortalecer internamente.

Basta uma requisição ao Tribunal Superior Eleitoral para que se obtenha o formulário de pesquisa registrado pelo Ibope no último dia 13. Constata-se nele que a pesquisa patrocinada pela Editora Três foi feita à perfeição para atender aos interesses do ex-governador do Rio. Chega-se a perguntar aos entrevistados, nas questões 17 e 18, do que gostam ou não gostam em Garotinho. Nenhum outro candidato mereceu pergunta semelhante. Na questão 19, o Ibope perguntou que ações fariam o entrevistado votar em Garotinho. Incluem-se na lista opções como "mostrar que é a favor dos pobres", "mostrar que saberá combater a corrupção e a impunidade" e "não misturar religião com política". Deveria ter sido incluída, ainda, mais uma alternativa: "Não enganar jornalistas, emissoras de TV e jornais para beneficiar-se em disputa interna partidária". Poderia surgir dela uma lição importante para o candidato Garotinho. A de que a mentira tem pernas curtas, como as de um menininho.

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