Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, janeiro 13, 2006

Luiz Garcia Com as vans no coração

O GLOBO

Apenas uma voz foi ouvida no governo estadual condenando a manifestação dos donos de vans que segunda-feira pararam o trânsito no Centro do Rio. Foi a do presidente do Departamento de Transportes Rodoviários (Detro), Rogério Onofre, imediatamente demitido, claro.

O episódio define uma prioridade do governo estadual: ficar de bem com a turma das vans e pouco se lixar para o direito de ir e vir — ou simplesmente ficar em paz — de todos os cidadãos. Passeatas reivindicatórias acontecem em todas as democracias; nas bem organizadas, as reivindicações de uns, expostas livremente mas em ordem, não prejudicam os direitos de todos. Já foi assim no Rio.

Desta vez, o problema não se limitou ao beneplácito com a bagunça. O governo estadual foi além e celebrou um pacto sobre a licitação de linhas intermunicipais com os topiqueiros (nome que vem da marca mais comum das primeiras vans). O documento é marcado por comovente generosidade — ou insuportável ilegalidade, segundo alguns especialistas. Lembra bastante, certamente por coincidência, o carinho com que a família Garotinho costuma tratar, em momentos eleitoralmente estratégicos, os cidadãos de Campos.

Por exemplo, não contarão para as concessões os pontos nas carteiras de habilitação dos candidatos. Ou seja, dispensa-se a única prova possível de que o motorista é competente e respeita as leis. Especialistas denunciaram outros itens claramente irregulares ou simplesmente estapafúrdios. Em todos, é visível a marca do carinho pela turma das vans e o descaso pelos interesses de passageiros e passantes.

Quarta-feira, o governo estadual, ante a óbvia repercussão negativa, tentou melhorar as coisas anunciando que só cumprirá os itens do acordo que forem legais. É a espantosa confissão de que o todo-poderoso secretário de governo presidiu a celebração de um acordo (embora não o tenha assinado, o que é significativo) cujos itens não sabia se eram legais ou não.

Enfim, para alguma coisa serve tudo isso: mostra um estilo de governo. Talvez tudo ainda fique mais claro se existirem e vierem à tona explicações com conotação política, ou expressamente eleitoral, para o especial carinho do Palácio Guanabara com os topiqueiros intermunicipais.

Quanto aos municipais, preparam sua passeata para a semana que vem. É uma oportunidade para a prefeitura mostrar como é possível permitir a expressão do direito de reivindicação e protesto sem prejuízo para o sagrado direito de uso da via pública por quem nada tem a ver com isso.



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