Entrevista:O Estado inteligente

domingo, janeiro 01, 2006

ELIO GASPARI

O GLOBO

Caixa tucana

O tucanato continua acreditando que o Padre Eterno concedeu-lhe um hábeas-caixa. Por maiores que sejam os prenúncios de denúncias das malfeitorias cometidas nas campanhas de 2002, 1998 e 1994 os grão-senhores fingem que o problema não existe. O PT, inebriado com a vitória de 2002, teve a mesma ilusão.

Quando a panela for destampada, dirão que tudo não passa de denuncismo de ano eleitoral. Mentira.

Nome de 2006

Depois das férias o ministro Marco Aurélio de Mello, do Supremo Tribunal Federal, assumirá a presidência do Tribunal Superior Eleitoral. À primeira vista, será apenas uma movimentação burocrática. Há fortes indicações de que irá para a cadeira disposto a mudar os co$tume$ das eleições nacionais.

Quem sabe, ele ajuda a derrubar a tradição dos depósitos de dinheiro, estimulando o povoamento dos depósitos de presos.

Sábio lapso

O senador Tasso Jereissati cometeu um lapso verbal e criou uma expressão típica da época. Referia-se ao rolo compressor usado pelo PT em algumas votações e reclamou da "tropa de cheque".

Bons tempos aqueles em que o governo se protegia com uma tropa de choque.

Não confere

Cerca de 50 deputados já anunciaram pelos jornais sua disposição de não embolsar os R$ 25,7 mil da convocação extraordinária do Congresso.

Alguns deles se esqueceram de tomar a mesma providência junto à Diretoria Geral da Casa.

Enquanto não assinarem o ofício formalizando a devolução, faturam duas vezes. Numa, lesam a Viúva. Noutra, a patuléia crédula.

UniLula 1

Depois de inovar a História ("quando Napoleão foi à China..."), e a genética ("... minha mãe nasceu analfabeta"), Nosso Guia revolucionou a matemática: "Eu acho que, crescendo o Brasil, crescem os estados, crescendo os estados, crescem os municípios."

Dentro da Teoria Lulocêntrica do Universo, a ordem do produto altera os fatores. Ele acha que um dia o Brasil crescerá, porque ele é presidente. O que aconteceu no terceiro trimestre de 2005 foi uma curva fora do ponto.

UniLula 2

Referindo-se às delinqüências-companheiras, Nosso Guia disse o seguinte ao repórter Pedro Bial: "Não interessa se foi a, b ou c. Todo o episódio foi uma facada nas minhas costas."

Há em Pindorama cerca de 350 mil pessoas encarceradas pela prática dos mais diversos delitos. Tudo o que eles querem é usufruir do carinho com que o jurisconsulto Lula protege seus correligionários: "Não interessa se foi a, b ou c."

A marca de Bento

De um observador da cena do Vaticano:

— O pontificado de Bento XVI poderá ser marcado por uma aproximação com os judeus, com os ortodoxos e com os anglicanos. Acredito que ele reduza o poder da Secretaria de Estado e fortaleça as congregações em que está dividida a Santa Sé. Acima de tudo, poderá ocorrer o fortalecimento da Congregação para a Doutrina da Fé, que ele chefiou durante 23 anos.

Ao final do pontificado de João Paulo II a Igreja era dirigida pela Secretaria de Estado, uma espécie de Casa Civil do Vaticano.

A falta de referência à América Latina não foi esquecimento.

Voto nulo é coisa séria

Voto nulo. É aí que mora o perigo de 2006. Depois do massacre do mensalão, das arcas delúbias e das pizzas, o eleitor nutre um desejo secreto de chutar o pau da barraca no dia 1 de outubro. Vai à urna, anula o voto, faz uma careta e usufrui o que sobrar do domingo da desforra. Ninguém tem nada que se meter no voto dos outros, mas a decisão ficará mais rica (ou pobre) medindo-se o alcance desse gesto.

Quem anula o voto numa eleição majoritária (presidente, governador e senador) protesta e não beneficia ninguém. Quem anula o voto no pleito proporcional (deputado federal e estadual) pode beneficiar o tipo de político que pretende punir. Se todas as pessoas que ficaram indignadas com o mensalão anularem seus votos (ou votarem em branco) o resultado será a eleição de um Congresso mensalista.

Em 2002, Nosso Guia se elegeu com um bonito resultado. A soma dos votos em branco e nulos ficou em 5,5 milhões (6%). Em 1998, quando FFHH

venceu, os brancos e nulos chegaram a 15,5 milhões, ou 18,6% do eleitorado, um número feio, prenúncio de um certo horror ao tucanato.

Admita-se que a eleição deste ano fique parecida com a de 1998, com um aumento votos nulos de 10,6% para 20%. Para isso seriam necessários mais de 15 milhões de votos. Nesse caso, a soma da abstenção, dos votos em branco e do nulos passará dos 50%. Número ruim, parecido com o absenteísmo das últimas eleições americanas, nas quais o voto é facultativo. Essas contas são apenas um exercício, pois a Constituição determina que se dê posse ao candidato que tiver metade dos votos válidos, mais um.

É no efeito do voto nulo na eleição proporcional que se esconde o Tinhoso. Na eleição majoritária o protesto é frontal, efetivo e neutro. Desdenha a opção oferecida pela máquina, mas não favorece outros candidatos. Quem anula o voto majoritário se ausenta da escolha conhecendo todas as variáveis da questão.

Na eleição para a Câmara o efeito é muito outro. (Vale lembrar que se pode anular o voto para presidente sem anular o voto para o Congresso.)

Quem anula o voto proporcional não tem como saber a conseqüência da sua decisão. Imagine-se um eleitor de 2002. Ele decidiu não votar em Lula nem em Serra. Tudo bem. Anulando o voto proporcional pode ter favorecido a eleição de um Severino Cavalcanti. Nesse caso, a justificativa do tanto-faz não funciona com a mesma precisão. Uma coisa é ficar indiferente a uma escolha Lula-Serra. Outra é mostrar a mesma indiferença num dilema imperceptível na hora da eleição. O voto negado a Abraham Lincoln pode ter contribuir para a eleição de Severino.

Ao contrário do que pode parecer, voto nulo é coisa muito séria. Tão séria que não deve ser considerada estúpida.

Bevilaqua foi para a luz do sol

Aconteceu uma coisa boa, o diretor de política econômica do Banco Central, doutor Afonso Bevilaqua, saiu da clandestinidade e apareceu na vitrine de Brasília explicando a ruína que coordena. Ele é, de longe, a personalidade mais forte da mesa do Copom. Discreto, nem biografia na página da instituição tem.

O professor Bevilaqua se doutorou na Universidade da Califórnia de Berkeley e chegou ao BC depois de uma profícua carreira no Departamento de Economia da PUC do Rio de Janeiro. Desde a fundação da Sorbonne, em 1253, nenhuma equipe de professores de instituição de ensino superior produziu tantos banqueiros bem-sucedidos como a PUC carioca.

Como ensinou o juiz Louis Brandeis, "a luz do sol é o melhor desinfetante". Se Bevilaqua sair da sombra, todo mundo ganha.

Em outubro de 2002, quando Lula pedia votos atacando a política de juros do BC, Bevilaqua disse que o companheiro dava "sua contribuição ao festival de disparates econômicos". Em maio de 2003, Nosso Guia o colocou na diretoria do Banco Central, unificando a produção de disparates.

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