Um programa para A ou S
E mbora haja fundamento para as críticas do seus adversários, que o acusam de ter começado a correr antes do tiro de partida, tem muita lógica a movimentação do governador Geraldo Alckmin para dominar o noticiário sobre a sucessão presidencial. Primeiro, marcou uma posição singular na crônica política, ao responder com desconcertante franqueza e absoluta brevidade - "sou" - quando, em dezembro, o apresentador do programa Roda Viva da TV Cultura lhe perguntou, de saída, se era candidato ao Planalto. Agora, Alckmin conseguiu transformar uma obviedade em notícia, ao anunciar, dias atrás, que deixará o Bandeirantes até 1º de abril, prazo final para a desincompatibilização dos detentores de cargos executivos interessados em participar das eleições de outubro. Obviedade porque, se não for o escolhido do PSDB para disputar a Presidência, o governador de São Paulo disputará uma cadeira no Senado e deve se desincompatibilizar até o 1º de abril. Mas ele sabia que a imprensa daria manchetes à decisão. Por isso não convenceu ao se declarar surpreso com o evento de mídia que havia construído. De todo modo, assim como tudo que o presidente Lula faz visa à reeleição, a prioridade de Alckmin é cuidar de anular a sua desvantagem maior em relação ao rival José Serra: o fato de ser muitíssimo menos conhecido fora de São Paulo do que o ex-senador, duas vezes ministro e adversário de Lula no segundo turno de 2002. Este não pode assumir desde logo a sua aspiração porque prometeu por escrito - em 2004, quando a reeleição de Lula parecia inevitável - que ficaria na Prefeitura paulistana até o fim do mandato. O PSDB dá sinais de não ter ainda encontrado a fórmula para desatar o nó que consiste não apenas em escolher o candidato mais apto a derrotar o presidente, mas ainda em ter a certeza de que o preterido trabalhará pelo preferido" sem fazer beicinho", nas palavras de um líder tucano. Na presidencial anterior, Serra ficou longe de aglutinar em torno de si a totalidade dos seus correligionários bons de urna - e até hoje não se livrou da pecha de "desagregador", que os seus desafetos não perdem oportunidade de lhe assacar. Além disso, o PSDB corre o risco de pôr em segundo plano um fator de suma importância. Por mais que o currículo e a imagem pessoal dos competidores pautem o eleitorado, este ano os projetos de governo terão um peso incomum. Tempos atrás, o atual presidente tucano Tasso Jereissati admitiu que faltava à sigla uma plataforma segura para contrapor à de Lula. De seu lado, Alckmin diz que "falar mal dos outros não faz ninguém melhor", ciente de que os brasileiros querem do PSDB mais do que ataques a Lula e ao PT. Com efeito, equivoca-se quem prevê que a campanha será exclusivamente um duelo entre a ética e a economia (ou o social). Não bastará ao tucano A ou B - ou melhor, A ou S - apregoar honestidade e competência. Quanto antes o PSDB puder dizer a que virá, seja qual for o nome que oferecer ao País, tanto mais a legenda se mostrará gabaritada a retomar o Planalto: êxitos passados podem servir de referência, mas as expectativas do Brasil de 2006 já não são as mesmas de 1994, 1998 e mesmo 2002. A oposição precisa se definir sem demora, com clareza similar à da Carta aos Brasileiros de Lula, sobre o que manter, o que rever e o que inovar na política econômica. Precisa assegurar que irá recuperar o "tempo perdido", como escreveu terça-feira neste jornal o ex-embaixador Rubens Barbosa, referindo-se ao conjunto de reformas sem as quais "o País poderá perder definitivamente o trem da História" e que o governo Lula foi incapaz de fazer. Não é pouca coisa: legislação política, trabalhista, previdenciária, tributária - o papel do Estado, em suma. É imperativo, aponta Barbosa, fortalecer as suas funções como regulador da economia, "atualizando as regras e o funcionamento das agências, com a eliminação de disposições que envelheceram e vão contra as tendências globais". Nesse sentido, o ex-presidente do Banco Central Gustavo Loyola observou, em artigo no jornal Valor, que Lula interrompeu a "trajetória evolutiva" do País por lhe faltar "convicção firme" sobre o rumo a seguir. Essa convicção urge ao PSDB demonstrar - em termos inteligíveis para o público - enquanto trata de definir o seu candidato.
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