Entrevista:O Estado inteligente

sábado, janeiro 21, 2006

Editorial da Folha de S Paulo

CONFORTO ACINTOSO
 
"Não faz sentido receber o ministro da Saúde aqui e não ter ar-condicionado. Ele está repassando R$ 45 milhões para nós. Isso é implicância de quinta categoria (...). É uma bobagem."
A declaração acima, do secretário municipal de Saúde do Rio de Janeiro, Ronaldo Cezar Coelho, foi estampada neste jornal ontem. Coelho foi o responsável pelo aluguel de dez aparelhos de ar-condicionado para o auditório do Hospital Municipal Souza Aguiar, o maior pronto-socorro do Rio de Janeiro. Eles foram instalados por apenas quatro horas, especialmente para a visita do ministro da Saúde, Saraiva Felipe.
O centro cirúrgico e a emergência permaneciam imersos no calor -fazia 37,5 ºC no Rio naquele momento. O sistema de refrigeração do hospital estava com defeito. Nas salas, lotadas, pacientes refrescavam o corpo à base do improviso, com panos úmidos.
Descontado o caráter anedótico, a cena e a espantosa justificativa do secretário ilustram uma prática há muito cristalizada na cultura política brasileira. A maquiagem de obras e edifícios públicos para visitas oficiais é uma triste praxe nacional, mas desta vez ela adquire um tom de acinte.
O aluguel do equipamento seguramente teve custos para a prefeitura. Mas isso importa menos do que notar a inversão de valores patente nesse caso. O anúncio de repasse de R$ 45 milhões para os hospitais municipais -motivo da visita oficial do ministro Saraiva Felipe- adquiriu uma importância simbólica maior do que o funcionamento adequado do próprio hospital.
Lamentar cenas como essa não é denuncismo vazio, como quis fazer crer o secretário. É cobrar um mínimo de austeridade dos detentores de cargos públicos. A menos que "implicância de quinta categoria" seja esperar que as autoridades não sejam tratadas como cidadãos de uma casta superior.

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