Entrevista:O Estado inteligente

sábado, dezembro 20, 2008

Os Irmãos Karamabloch, de Arnaldo Bloch

Tudo em família

A ascensão e a queda do negócio dos irmãos Bloch, criadores
da revista Manchete, narradas por um de seus descendentes


Geraldo Mayrink

Fotos divulgação

ÓDIOS FRATERNAIS
Adolpho (à esq.), Arnaldo e Bóris (com um cunhado ao centro) e a Manchete: conflitados como personagens de Dostoievski


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Imigrantes judeus ucranianos que se estabeleceram no Brasil depois da revolução comunista e ergueram um império das comunicações no novo país, os Bloch contam com uma história familiar que daria um romance. E é quase isso que faz um dos membros do clã, o jornalista e escritor carioca Arnaldo Bloch, ao reconstituir os feitos de seus antepassados em Os Irmãos Karamabloch (Companhia das Letras; 344 páginas; 48 reais). Os irmãos do título são Bóris, Arnaldo (avô do autor) e Adolpho, filhos do ucraniano Joseph Bloch. O trio foi alcunhado de "Karamabloch" pelo escritor e jornalista Otto Lara Resende, numa alusão à conflitada família criada pelo russo Fiodor Dostoievski em seu clássico Os Irmãos Karamázov. A família toda gravitava em torno de Adolpho Bloch (1908-1995), um tirano, segundo o autor, um gráfico que chegou com a parentada em 1922 e que nos primeiros tempos tinha dificuldade até em pagar a passagem de bonde. Os Bloch vieram para o Brasil para descobrir a "terra promissória", como se comentava maldosamente, e a descobriram mesmo, a partir da criação da Manchete, em 1952. A revista logo se tornaria líder do mercado, dando impulso a um gigante empresarial que englobaria gráficas, emissoras de rádio e televisão. Foi a televisão, aliás, a grande responsável pela debacle da empresa. Criada em 1983, nunca saiu do vermelho. Em 2000, quando as dívidas acumuladas chegavam perto de 17 milhões de reais, foi decretada a falência da Bloch Editores.

O livro centra-se mais na crônica familiar que na história empresarial – embora as duas coisas se sobreponham inevitavelmente na trajetória dos Bloch. Arnaldo não poupa seus ascendentes. Expõe todas as suas falhas – físicas e morais. Haisura, irmã do patriarca Joseph, por exemplo, é descrita como "a mulher mais feia da Rússia". O primo Bernardo era conhecido como "o corcunda". Bóris era priápico diagnosticado. Nem as mascotes da família são preservadas: Biriba, cão felpudo e preto, tinha o apelido de "lascivo". Todos os personagens falam ao longo do livro, às vezes com sotaque. Eram viciados em jogos. Demitiam-se uns aos outros e costumavam se odiar com a intensidade de que só os irmãos são capazes. Mas reuniram uma série de notáveis nos imponentes salões da empresa, no Rio, entre eles o ex-presidente Juscelino Kubitschek.

A trajetória de Adolpho, o gráfico-empresário, é tragicômica, suja, doída e doente. Embora fosse o homem forte da família, não teve descendentes diretos. "Quem precisa de um filho? Melhor ter um cachorro", dizia, referindo-se à mimada cadela Manchetinha, que costumava comer em sua mesa. Editor implacável, Adolpho tinha o hábito de mastigar as fotos das quais não gostava (embora sabiamente não as engolisse). Sua ascensão foi notável para um homem que aos 30 anos não terminara o ensino médio e um dia ouvira do irmão Bóris um comentário: "Dá graças a Deus por estar aqui. Era para você nem ter nascido". Os Irmãos Karamabloch é muito bem pesquisado, dada a intimidade sanguínea do autor com as fontes. Pode ser lido por todos os interessados em histórias de bastidores da imprensa – e pelo leitor que busca uma envolvente saga familiar.

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