Adeus pegar a estrada e se mandar no fim de semana, levando uma mochila só com um repelente e um filtro solar |
DOIS CASAIS muito jovens me telefonam na mesma semana para dizer que vão ter um bebê. Um deles, mesmo com pouca grana, vai se mudar para um apartamento que comprou na planta e, quando o filho nascer, já estará instalado. O outro, com menos grana, vai ter que se mudar de onde mora de aluguel para um maior, para que o bebê tenha um quarto só para ele.
Num primeiro momento me enterneço; sei que esses dois casamentos foram por amor de verdade, que tanto eles como elas são pessoas do bem, que acreditam nas coisas, que têm as melhores intenções a respeito do futuro, e me emociono pensando no momento de felicidade que estão vivendo. A chegada do primeiro filho, para um casal apaixonado, é tão importante, tão cheio de alegrias -lembra? É tão bom começar a vida, com esperanças e certezas quanto ao futuro.
Mas ao mesmo tempo me dá uma certa pena pensar que por melhor que tudo corra e que esses casais sejam felizes para sempre, a vida vai mudar. Em alguns pontos, até para melhor, mas vai mudar. E o gosto da irresponsabilidade, essa coisa tão prazerosa, estará perdido para sempre. Adeus pegar a estrada e se mandar no fim de semana, levando uma mochila só com um repelente e um filtro solar. A sacola vai ter que ser maior -isso se enfrentarem o fim de semana, o que é improvável- e cheia de fraldas, mamadeiras, latas de leite em pó, sapatinhos, casaquinhos, mantinhas e nem sei mais o quê. E a ilusão de que vão jantar tomando vinho não vai passar de uma ilusão, porque crianças pequenas parece que adivinham a que horas ficar inquietos e chorar com fome.
O bebê vai crescer e logo entrar numa creche, para que a mãe possa voltar a trabalhar. E depois vai ser o colégio, que custa caro. Para fazer frente às novas despesas -tênis, skate, aula de judô, escolinha de futebol, natação (isso sem falar do pediatra, da dor de ouvido, da tosse noturna, do xarope de duas em duas horas). O pai vai arranjar um bico para aumentar a renda familiar e começar a chegar em casa mais tarde, mais cansado. A mãe vai abrir mão das mechas no cabelo, e talvez até da manicure, por falta de tempo e para economizar e poder levar seu filho à Disney. Mas a vida continuará um mar de rosas até chegar aquele momento de que nenhum pai e mãe escapam: a adolescência.
Tudo pode acontecer, até mesmo do garoto ser um adolescente tranqüilo e estudioso, mas segundo as estatísticas, é bom não contar com isso. E se em vez do garoto, for uma menina, aí as preocupações se multiplicam. As baladas, as noites em claro esperando que eles cheguem (sempre mais tarde do que a hora que foi estipulada), o medo do trânsito, dos assaltos, das drogas, da Aids, da gravidez inesperada. É claro que quando você, recém-casado, abriu o envelope do exame e leu POSITIVO não pensou em nada disso, até porque nessa idade não se pensa nessas coisas.
Mas corta meu coração saber que ao ter o primeiro filho eles estão deixando para trás a juventude, que não tem nada a ver com a idade; juventude é ser dono e responsável apenas por si mesmo, aos 20 ou aos 80. Porque depois que se é mãe ou pai, mesmo que os filhos estejam casados e felizes, já com seus próprios filhos, nunca mais se vai a lugar nenhum sem deixar com cada um deles o lugar onde poderá ser encontrado "se acontecer alguma coisa", e nunca mais, mesmo tendo ido a uma festa e dormido às 6h da manhã, vai ter coragem de desligar o telefone, de medo que "aconteça alguma coisa" e você não possa ser encontrada.
Nunca mais, nunca mais, se dorme em paz; mas não sei o que seria de mim sem os meus.