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sábado, dezembro 20, 2008

Villas-Bôas Corrêa Onde foi que erramos?


Coisas da Política

Jornal do Brasil - 20/12/2008

Quando descobri Nova Friburgo, quase que por acaso, num giro de automóvel em fim de semana, a cidade encantada espremia-se no vale entre duas cadeias de montanhas, com uma população que não ia além de 30 mil habitantes.

Paixão da família à primeira vista, depois de muito procurar até a descoberta dos dois lotes em Muri que cabiam no orçamento doméstico, conseguimos fazer a casa de um pavimento, com a metade do segundo andar para os dormitórios. Todos os fins de semana, mesmo com tempo duvidoso, fazíamos e refazíamos os 150 km da estrada, antes da Ponte Rio–Niterói, com alguns solavancos, mas, desfrutando a delícia da mudança do clima quando começava a subida da serra.

Em 50 anos, que é um piscar de olhos na vida de uma cidade, tudo mudou da água límpida para o tumulto da cidade que inchou, como doente incurável. Raspando nos 200 mil habitantes que não cabem na área urbana e galgam os morros para o equilíbrio de casas e barracos estancados em áreas de risco. Já não é tão tranqüila a caminhada pelo centro para especular as ofertas nas vitrines para distrair a vista na sucessão de imagens da cidade.

A viagem que era segura e tranqüila transformou-se num inferno. A fúria de entupir o cofre com a indústria das multas perdeu a cerimônia e enfia os gadanhos no bolso dos miliardários proprietários de um Fusca ou de uma Mercedes com a montagem das arapucas da aloucada dança dos limites de velocidade. Daqui a Nova Friburgo, com as alternâncias para aumentar a emoção, as placas de beira da estrada saltitam dos 30, 40, 50, 60, 70, 80, 90, 100 e 110 km, como cartas embaralhadas.

Como não há explicação lógica para o troca-troca das placas, ou o motorista viaja com as butucas fixadas no cateretê das placas ou cada viagem custa o preço de uma ida e volta a São Paulo de avião. Sei que é inútil o esperneio de um simples motorista de carro particular. Mas o exemplo da cidade que conheço, onde tenho casa, é o cartão-postal do Brasil.

As contradições são o carimbo da fase negra que atravessa não apenas o Brasil, pois a maldição parece universal. É fácil, mas inútil, colecionar as estatísticas que expõem o flagrante das tragédias que dão a volta no mapa. Não é caso de inflar o peito de orgulho. Mas o nosso país tem seu lugar no descompasso da incoerência. Nosso presidente Lula, recordista nacional de popularidade em todos os tempos, não cansa de repetir que vivemos o momento mágico da nossa História. Nunca, jamais tivemos um governo tão dedicado a desmanchar o nó das injustiças que castigam os mais pobres. E é o Bolsa Família, o Bolsa Escola, o exemplar atendimento do Sistema de Saúde, o milionário salário mínimo e o baixo custo de vida que sustentam a sua popularidade.

O ministério de luminares de cada setor esbofa-se para atender às demandas sociais, e até projeta o futuro longínquo à sombra das mangabeiras. Quando a natureza cobra o descaso criminoso do desmatamento, do êxodo do campo para as cidades, com a favelização das áreas invadidas pelo tráfico de drogas e a violência das ações pontuais das milícias policiais, descobrimos que o quadro não é de tão brilhante colorido como aparece nas fotos oficiais.

Bilhões de dólares entupiam as arcas do Banco Central, com as nossas reservas à prova de qualquer distúrbio na economia dos países ricos. E não é bem assim. O conselho do presidente para os festejos natalinos, estimulando os que têm emprego e recebem salário a comprar de carros financiados em até 90 meses às bugigangas para enfeitar os sapatos das crianças é uma jogada de risco com o dinheiro dos outros. Se der errado e as prestações atrasarem, cada qual que se vire ou dobrem o endividamento. Escândalo ou rotina?

O pior Congresso desde a ditadura militar não esgotou a taça dos vexames: no lusco-fusco da madrugada, o Senado aprovou a emenda constitucional que recria 7.343 vagas de vereadores em todo o país. No ato seguinte da opereta, o presidente da Câmara, deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), recusou-se a promulgar a emenda das prendas natalinas. Os suplentes de vereadores podem ficar tranqüilos: em briga do Congresso quem sempre paga a conta é o cofre da Viúva. Na abertura da próxima sessão legislativa, pazes feitas, as dos 7.343 serão recriadas. Quem sabe se com direito aos atrasados?

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