Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, agosto 12, 2008

Míriam Leitão - Ecos do mundo velho



PANORAMA ECONÔMICO
O Globo
12/8/2008

O conflito entre a Rússia e a Geórgia e a polarização na Bolívia, distantes geograficamente, são ecos de um mundo velho. O episódio russo lembra a guerra fria, as velhas idéias de área de influência. Na Bolívia, o referendo cristalizou o conflito racial-ideológico nunca resolvido. A Rússia deveria estar aproveitando o bom momento econômico; a Bolívia deveria estar temendo o desaparecimento da água do país.

O que é mais velho? Uma disputa entre Estados Unidos e Rússia pelo controle de uma área satélite ou o presidente da Bolívia dizer que vai implantar o socialismo? Tudo pertence ao século passado! O século XXI tem outros e diferentes desafios e chances, mas o mundo recria velhos enredos e perde tempo.

A Geórgia está sendo defendida pelos EUA apenas por palavras, porque não tem petróleo. Sua importância é logística para a Europa. Por ela passa um gasoduto que supre o continente europeu. Por outro lado, para os russos, a Ossétia do Sul livre do controle da Geórgia significa a ampliação do próprio território, já que a Ossétia do Norte é parte da Federação Russa. Nem passa pela cabeça de Putin-Medvedev conceder-lhe a independência.

As explicações são de que os russos reagiram porque os americanos estariam se envolvendo num assunto interno da Geórgia, que fica em "área de influência" russa. E Moscou estaria querendo mostrar que não é mais a Rússia de Yeltsin - fraca, em crise econômica - mas a Rússia que volta a ficar poderosa.

As explicações lembram o mundo bipolar, como foi até 1989. Esse tempo foi substituído por um período de poder único e incontrastável dos Estados Unidos, que também já acabou e está sendo substituído por outro equilíbrio de poder no mundo. Os EUA agora têm uma parte menor do PIB mundial, enquanto as potências médias vão aumentando sua parcela. Essa guerra de ocupação russa, sob o pretexto de libertar os sul-ossetianos do jugo da Geórgia, mas mantendo o controle sobre a Ossétia do Norte, tem o mais velho dos panos de fundo: o da definição de área de influência de uma potência.

Já a Bolívia está tão dividida quanto antes do referendo, mas os dois lados estão mais fortes. Quem entrasse ontem de manhã no noticiário do tempo no país já veria a polarização entre as duas regiões: em La Paz, a temperatura era -1°C; em Santa Cruz, era 20°C positivos. O presidente Evo Morales, consagrado nas áreas do país onde já é popular, como El Alto, perdeu em províncias como Beni. Ganharam os governadores de Tarija, Beni e Santa Cruz, que defendem o separatismo. Cochabamba se dividiu: a capital do departamento votou no governador separatista; a zona rural votou contra ele.

Todos vitoriosos, todos radicalizaram suas posições. O presidente Evo Morales quer agora o socialismo, seja lá o que isso signifique hoje. Os governadores avançam no separatismo, como se isso fosse sustentável num país pequeno e pobre como a Bolívia.

Os governadores de oposição anunciaram a criação de uma polícia própria e de um sistema de arrecadação autônomo. O governador Ruben Costas, de Santa Cruz, disse que vai convocar os outros governadores das terras baixas e resistir ao "fundamentalismo aimara". O presidente Evo Morales afirmou que vai aprofundar a revolução socialista, "importante para todos os revolucionários latino-americanos", e que quer a confirmação de uma constituição que foi aprovada num quartel, sem a presença da oposição, e com a Corte Constitucional sem quórum. "Mais fortes e empatados", define o jornal "La Razon". Morales acha que os governadores são racistas; os governadores são contra medidas como a troca do inglês por línguas indígenas no currículo escolar. Ambos estão certos. Há racismo na reação; há necessidade de ensino de língua indígena, mas por que abolir o inglês, que é uma ferramenta universal?

A Bolívia se divide em torno de questões herdadas do colonialismo, o presidente Morales busca um socialismo passadista, enquanto o país se aproxima de um dos piores riscos de sua vida: em poucos anos, poderá ficar sem água. O Human Development Report avisa que, no Peru e na Bolívia, os glaciais foram reduzidos em 30% desde 1970, e que o declínio da oferta de água terá dramáticas conseqüências nos dois países. A área que será afetada mais brevemente é exatamente El Alto, onde está a população mais pobre de La Paz, reduto de Morales. O IPCC e o Relatório Stern têm cenários assustadores para a água da Bolívia. É que os glaciais degelam no verão, alimentam os rios e voltam a congelar com a neve no inverno. Com menos inverno e menos neve, eles não se recompõem e vão desaparecendo. (Veja no blog as imagens de um glacial que acabará em 2010).

Essa divisão da Bolívia é insensata. O país briga por idéias do passado e velhas divisões, quando, à frente, há um problema se formando que afetará todos os bolivianos, sejam descendentes de espanhóis, de aimaras ou de quéchuas; sejam socialistas ou neoliberais. Numa reportagem recente da CNN, um agricult

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