Entrevista:O Estado inteligente

sábado, agosto 30, 2008

China: medalhas e exportações

Folha de S Paulo


A China passou de 7,58% das exportações mundiais totais em 97 para 11,76% em 2006; o Brasil, de 1,08% para 1,25%

A CHINA acaba de dar uma clara demonstração de como é possível, com planejamento, determinação e compromisso, realizar avanços extraordinários. As medalhas olímpicas são fruto disso. Foram 110 no total, 6,3 vezes mais do que as obtidas pelo Brasil.
Pode-se argumentar que a China tem quase sete vezes mais habitantes do que o Brasil, mas o argumento se esvai se compararmos as medalhas ganhas por outros países, como França (40), Austrália (46), Coréia do Sul (31), Reino Unido (47), só para citar alguns que têm menor população e nos bateram com sobras.
Além disso, temos evoluído pouco nas últimas Olimpíadas. Foram 15 medalhas em 2008, número igual ao de 1996. A China passou de 50 em 1996 para as 110 deste ano.
Isso sem falar na espetacular infra-estrutura montada para sediar a Olimpíada de Pequim. Claro que tudo isso tem a ver com a necessidade de mostrar ao mundo uma cara mais moderna de um país que ainda é pouco conhecido e ao qual se atribuem falhas na questão dos direitos humanos etc. Mas o fato é que a China deu um show.
Se fosse apenas na Olimpíada, poder-se-ia dizer que foi uma posição política exibicionista, e que o resto vai mal. Mas não é assim.
O Departamento de Competitividade da Fiesp acaba de fazer um estudo sobre as exportações chinesas para o Brasil. Os dados são impressionantes.
Em primeiro lugar, salta à vista o que aconteceu nos últimos dez anos quanto ao saldo comercial entre os países: entre 1997 e 2000, nosso déficit com a China girava em torno de US$ 270 milhões e no ano passado cresceu para US$ 1,9 bilhão, seis vezes mais! Considerando que o saldo positivo da agropecuária cresceu de US$ 90 milhões em 1997 para US$ 3,12 bilhões em 2007, fica visível o desastre comercial da indústria de transformação, que teve déficits de US$ 630 milhões em 1997 e de US$ 9,69 bilhões em 2007. Muito ruim para a indústria brasileira, embora não tão grave para o agronegócio.
Obviamente existem fatores econômicos diferentes entre os dois países que explicam esses números.
O estudo da Fiesp aponta que a carga tributária entre 2000 e 2005 na China ficou estável, em torno de 15,7% do PIB, enquanto a brasileira foi mais do que o dobro disso, chegando a 34,1% do PIB em 2005.
A questão cambial tem muito a ver com tudo isso: de 1997 a 2007, o yuan manteve relação praticamente constante com o dólar, enquanto o real apresentou fortes oscilações no período e, ultimamente, sempre prejudicando nossas exportações.
A diferença do crescimento das exportações chinesas e brasileiras é impressionante. A China saiu de 7,58% das exportações mundiais totais em 1997 para 11,76% em 2006. O Brasil cresceu só de 1,08% para 1,25%. E o mais importante é que a China avançou para valer nas exportações de produtos de alta tecnologia, superando os Estados Unidos, a Alemanha e o Japão. Isso provocou aumento no valor do quilo exportado de US$ 26,50 para US$ 46,66, em dez anos.
No Brasil, no mesmo período, saltamos de US$ 22,91 por quilo para US$ 28,39.
Claro que, por trás desse espantoso crescimento, quando comparado com o nosso, está a estratégia, a determinação, o compromisso, assim como na Olimpíada.
Mas o grande fundamento para tudo isso é a educação. A China tem 4,6 engenheiros para cada 10 mil habitantes. O Brasil tem 1,6...
Eis aí a razão da diferença: sem educação, nem mesmo a determinação e o compromisso dariam conta de montar a estratégia.

ROBERTO RODRIGUES , 66, coordenador do Centro de Agronegócio da Fundação Getulio Vargas, presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp e professor do Departamento de Economia Rural da Unesp - Jaboticabal, foi ministro da Agricultura (governo Lula). Escreve aos sábados, a cada 15 dias, nesta coluna.

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