O Globo |
12/8/2008 |
No momento em que no Brasil se discute a legalidade da divulgação dos processos a que respondem os candidatos nas eleições municipais, e o custo-benefício dessa divulgação para impedir que os chamados fichas-sujas sejam eleitos, um trabalho de cientistas políticos brasileiros publicado na revista "Political Research Quarterly", da Universidade de Utah, nos Estados Unidos, dá boas indicações sobre o efeito redutor de elegibilidade da divulgação das fichas dos candidatos, ao mesmo tempo em que desmistifica a tese de que o instituto da reeleição reduz a incidência de corrupção. Carlos Pereira, professor-assistente da Universidade de Michigan, e Marcus André Melo e Carlos Mauricio Figueiredo, da Universidade Federal de Pernambuco, com base no resultado de eleições municipais de 2000 e 2004 em todos os 184 municípios de Pernambuco, chegaram a uma conclusão fundamental: os prefeitos que cometeram irregularidades têm menos chance de serem reeleitos quando essa informação é divulgada no próprio ano eleitoral. Do contrário, a tendência é as falcatruas caírem no esquecimento, pois, embora os cidadãos acompanhem a atuação dos prefeitos, não o fazem com tamanha persistência que impeça a reeleição se a irregularidade tiver acontecido há muito tempo. Os testes mostraram também que o efeito redutor da corrupção do sistema de reeleição pode ser compensado quando a expectativa de ganho é muito alta, e a probabilidade de ser detido é muito baixa. Os testes econométricos demonstraram que o papel da informação na redução das possibilidades de reeleição de um corrupto é muito forte, assim como o das auditorias realizadas pelos Tribunais de Contas e pelos Tribunais Eleitorais. As irregularidades cometidas pelos prefeitos e detectadas pelas forças-tarefas durante a campanha eleitoral provocam uma significativa correlação negativa capaz de barrar reeleições, estatisticamente comprovável. Mais especificamente, o estudo sustenta que, quanto maior o número de irregularidades detectadas no ano eleitoral, menor é a chance de o candidato acusado ser reeleito. Os resultados das pesquisas indicam que os eleitores são influenciados pelo momento da divulgação dos atos de corrupção. Enquanto a divulgação no ano eleitoral tem um efeito de reduzir as chances de reeleição em quase 20%, as notícias de corrupção durante o mandato têm a metade desse efeito. Ao contrário de reduzir a possibilidade de corrupção, o sistema de reeleição no Brasil está incentivando práticas corruptas, especialmente quando as eleições são muito disputadas. Oferecer vantagens ilegais aos eleitores pode facilitar a permanência do prefeito no cargo e, além do mais, quando reeleitos, esses corruptos encontram maneiras de se proteger de possíveis sanções, pois não apenas prefeitos têm privilégios legais para se defender das acusações como também têm mecanismos de intimidação e cooptação. Um resultado paralelo do estudo, mas que também dá a dimensão da influência do poder político nas eleições, é o que mostra que o fato de pertencer ao partido do governador aumenta a possibilidade de ser reeleito em 23,85%. Um dos autores do estudo, o cientista político Marcus André Melo, da Universidade Federal de Pernambuco, publicará brevemente na revista "Comparative Political Studies" um outro trabalho que coloca a seguinte pergunta: por que os Tribunais de Contas de alguns estados punem mais do que outros? Em testes estatísticos com uma base de dados com milhares de observações para todos os 33 tribunais brasileiros, o artigo mostra que: a) Se há pluralismo político no estado, há mais punição. Se governadores se alternam no estado, isso se reflete na composição do pleno dos Tribunais de Contas, e é o pleno que ratifica as irregularidades encontradas pelos auditores, em geral independentes e qualificados. b) Os tribunais mais ativos, e que fazem mais auditorias por iniciativa própria, são aqueles que têm auditor fiscal-substituto de conselheiro no pleno, e não apenas políticos profissionais indicados. c) Se procuradores do Ministério Público de Contas têm assento no pleno de tribunal, as chances de punição são mais elevadas. No TCE-RJ, por exemplo, não existe representação do MP de Contas no pleno. Já que estamos falando de eleições para prefeitos, chamou minha atenção a declaração de patrimônio de Alessandro Molon, o candidato petista: ínfimos R$11.161. Por pouco não repete Garotinho, que declarou patrimônio zero. Chegar a essa altura da vida com um patrimônio desses, vindo de uma família de classe média, em vez de mostrar a "honestidade", só depõe contra a capacidade de Molon de gerir as próprias finanças e, em conseqüência, as finanças públicas. O que pode ser uma questão boba, talvez reflita a visão do brasileiro - de que ser pobre é ser honesto, e ser rico é negativo. Diferentemente, a cultura anglo-saxônica faz com que aqui, nos Estados Unidos, poder mostrar um bom patrimônio signifique que o político foi exitoso em seus negócios particulares, o que é uma boa indicação, não uma falha. Na campanha presidencial americana, uma das maneiras de revelar a força de uma candidatura é anunciar quanto arrecadou em doações. Candidatos endinheirados podem também ser afastados da disputa por falta de votos, como aconteceu do lado democrata com John Edwards, ou a senadora Hillary Clinton, que saiu da campanha com uma dívida de muitos milhões de dólares. E do lado republicano, o ex-governador Mitt Romney, que colocou nada menos do que US$35 milhões do próprio bolso na campanha frustrada e agora pode vir a ser o vice de McCain. |
Entrevista:O Estado inteligente
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terça-feira, agosto 12, 2008
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