Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, agosto 29, 2008

Míriam Leitão - A conta do estouro



PANORAMA ECONÔMICO
O Globo
29/8/2008

Quem olha a economia real não vê o tamanho da sangria que o mercado financeiro americano enfrenta desde que, há pouco mais de um ano, a crise das hipotecas subprime estourou. O PIB caiu nos Estados Unidos, mas, no segundo trimestre, teve até um desempenho acima do esperado. No entanto, em um ano, o índice S&P viu evaporarem-se US$2 trilhões em valor de mercado das empresas listadas. As ações de alguns bancos viraram quase pó; só o Citigroup perdeu US$158 bilhões. Na China, a bolsa já caiu 55% em 2008.

Olhando a lista das bolsas mundo afora, o que se vê é que nenhuma delas está com alta este ano. É sinal negativo do começo ao fim dos países na lista da "Economist". A com maior queda, disparada, é a China, mas também houve baixas surpreendentes nas bolsas dos países desenvolvidos. Ela foi de 25% na Zona do Euro, 27% na Itália, 21% na Alemanha, 22% em Hong Kong, 14% na Inglaterra. Dentre os grupos de países, a América Latina até que não teve perdas tão expressivas, mas o Brasil, por exemplo, registra no ano uma baixa de 13% em moeda local e 5% em dólar, o que fez com que o valor de mercado saísse de R$2,4 trilhões para R$1,9 tri (R$500 bilhões a menos).

- Foram histórias diferentes na China e nos países desenvolvidos, mas ambas estão vivendo estas grandes quedas. Na China, o que havia era uma bolha; em alguma hora, iria estourar. Já nos países desenvolvidos, o que pegou foi a crise das subprime - comentou Ricardo Amorim, diretor-executivo para mercados emergentes do WestLB.

Ricardo Amorim brinca que o que se vê hoje em Nova York, onde ele está sediado, é que sobraram nos bancos apenas aqueles que trabalham com mercados emergentes, pois foram enormes as perdas dos bancos no rolo compressor das subprime; seus papéis derreteram. Para se ter uma idéia, o BofA (Bank of America) perdeu US$83 bilhões do seu valor de mercado e o Morgan Stanley, US$46 bilhões. A tabela abaixo, com os números fornecidos pela Gap Asset, mostra outros exemplos.

Sobre a bolha chinesa, muitos analistas já vinham chamando a atenção há tempos. A bolsa subiu demais no país. Houve um momento em que os três maiores bancos do mundo, em valor de mercado, eram chineses; a maior empresa era a Petrochina (que continua grande, mas caiu para segundo, atrás da Exxon).

Para o diretor do WestLB, ainda que todas as bolsas registrem queda no ano, no futuro, os movimentos devem ser diferentes.

- A bolsa chinesa ainda tem mais para cair. O país tem fundamentos sólidos, como crescimento muito forte do PIB, mas ela subiu mais que podia. Os Estados Unidos e a Europa não têm muito mais para cair, mas não vejo que eles possam ter uma alta forte nos próximos dois anos. Já os emergentes, incluindo o Brasil, têm mais para cair nos próximos meses, mas têm mais chances de voltar a subir - acredita Ricardo.

Pedro Batista, chefe de análise do UBS/Pactual, acha que hoje o investment grade, recém-recebido pelo Brasil, não está refletido no valor das ações brasileiras. Assim como, para ele, está barata a bolsa americana:

- Isso não quer dizer exatamente que elas vão subir. O mercado não gosta de instabilidade. E hoje ainda há dúvidas sobre o que vai acontecer no crescimento mundial.

No início do ano, até maio, o índice da Bovespa subiu. Na comparação com outras bolsas do mundo, a brasileira teve um resultado melhor. Porém, de junho para cá, os investidores estrangeiros saíram em massa: US$17 bilhões foram retirados do país. Eles deixaram de representar 37,2% dos investidores para passarem a 34,5%. Isso não só porque precisam equilibrar as suas exposições a diferentes papéis, mas também para evitar mais riscos numa bolsa em trajetória de queda. O volume diário negociado na Bovespa caiu 31% desde maio.

No mercado financeiro, o estrago da crise é sempre mais imediato e mais visível. Isso não significa que a economia real não sinta os efeitos.

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