A roupa da liberdade
Traje motorizado devolve os movimentos aos paraplégicos.
Em dois anos, começará a ser vendido por 20 000 dólares
Vanessa Vieira
Baz Ratner/Reuters |
PASSEIO PELAS RUAS O ex-soldado israelense Kaiof: "Voltei a falar com as pessoas fitando seus olhos na mesma altura" |
Um aparelho criado recentemente em Israel acena aos paraplégicos com esperanças concretas de viver menos tempo na cadeira de rodas. O invento, batizado de ReWalk, é um traje motorizado que garante a quem tem paralisia da cintura para baixo realizar movimentos impossíveis – como ficar de pé, caminhar, subir e descer escadas e rampas. Ao contrário das cadeiras de rodas mais modernas, que apenas colocam o corpo na vertical, o ReWalk permite que se ande sobre os próprios pés. Isso é possível graças a uma série de suportes mecânicos acoplados ao corpo, da cintura até o tornozelo(veja o quadro abaixo). A única exigência é ser capaz de se equilibrar com a ajuda de muletas – o que se pode conseguir com sessões de fisioterapia. O novo equipamento está em fase de testes com ex-soldados israelenses que se tornaram inválidos em ações militares. Um deles, o ex-pára-quedista Radi Kaiof, cuja foto ilustra esta página, perdeu os movimentos dos membros inferiores há vinte anos. Hoje, depois de um treinamento com o ReWalk no Centro Médico Sheba, de Tel-Aviv, ele passeia pelas ruas com facilidade. "É indescritível a sensação de voltar a falar com as pessoas fitando seus olhos na mesma altura, e não de baixo para cima", diz ele. O engenheiro israelense Amit Goffer, criador do ReWalk, prevê que o aparelho estará disponível no mercado em 2010 e será vendido por 20 000 dólares – preço equivalente ao das cadeiras de rodas mais caras. "Depois de algum tempo usando o ReWalk, sua operação se torna quase intuitiva", disse Goffer a VEJA. O engenheiro, por sinal, é tetraplégico, e não pode usar a própria invenção porque tem os movimentos dos braços limitados.
Vários laboratórios do mundo desenvolvem hoje equipamentos semelhantes ao ReWalk, chamados de exoesqueletos. A pesquisa em torno desses aparelhos ganhou força há uma década, impulsionada, sobretudo, por interesses militares. Tecnicamente, o exoesqueleto é um traje que proporciona aumento da capacidade física. Com ele, em teoria, seria possível compor um exército de supersoldados, capaz de carregar mais equipamentos e armamentos para o campo de batalha e de se deslocar com maior velocidade. A Darpa, agência de pesquisa do Departamento de Defesa dos Estados Unidos, em parceria com a Universidade da Califórnia, já investiu 50 milhões de dólares em projetos de exoesqueletos. O roteiro de ficção científica proporcionado por esses equipamentos no cenário militar, entretanto, perde importância quando comparado aos benefícios que eles podem trazer ao cotidiano dos paraplégicos.
O uso de equipamentos como o ReWalk pode não apenas melhorar a qualidade de vida dos paraplégicos, mas também lhes assegurar mais saúde. Diz a fisioterapeuta Carla Mazzitelli, da Universidade de São Paulo: "Ao andar sobre os pés, o paciente combate a perda de massa óssea. Além disso, ao trocar passos, trabalha músculos que ficariam estáticos na cadeira de rodas. Isso favorece a circulação e evita problemas cardiovasculares". A possibilidade de se mover na vertical também previne problemas urinários, digestivos e respiratórios, característicos de quem passa muito tempo na cadeira de rodas.
A medicina tem feito avanços significativos na reabilitação de pacientes com limitações motoras, principalmente no terreno das próteses para substituir membros perdidos. A grande conquista nessa área, nesta década, foram as próteses biônicas de mãos, dotadas de sensores, sistemas eletrônicos e minúsculos motores. Essas próteses permitem reproduzir os movimentos de um membro natural com enorme precisão. Uma delas foi implantada no ano passado no sargento americano Juan Arredondo, de 27 anos. Servindo no Iraque, ele perdeu a mão esquerda numa explosão durante uma patrulha. Desde então, lutou para curar as feridas físicas e a depressão. Há um ano, recebeu uma mão biônica, dotada de cinco motores que movem cada dedo individualmente. Os movimentos são controlados por sinais elétricos enviados pelos músculos do braço. Com a nova prótese, Arredondo pode girar maçanetas, digitar no teclado do computador e segurar uma bola de tênis para brincar com os filhos. "Acho que só estou vivo por causa da tecnologia", ele diz. Com o ReWalk, os paraplégicos podem se beneficiar de mudanças equivalentes em seu cotidiano.
Passos sincronizados Como funciona o ReWalk 1. Os tornozelos, os joelhos e os quadris são envoltos por suportes mecânicos motorizados 2. Por meio de um controle remoto no pulso, seleciona-se o movimento desejado – ficar de pé, andar, sentar, subir ou descer degraus 3. A direção em que se quer o movimento é indicada por um pequeno deslocamento do abdômen, captado por sensores localizados no peito 4. O movimento se inicia quando o corpo dá impulso com a ajuda das muletas. Se as muletas param de se mover, o deslocamento é interrompido 5. O sistema é alimentado por baterias recarregáveis, colocadas numa mochila Fonte: Argo Medical Technologies |