Entrevista:O Estado inteligente

sábado, maio 03, 2008

Speed Racer, com Susan Sarandon e Christina Ricci

Em alta velocidade

Speed Racer, herói do desenho dos anos 60, ressuscita
numa superprodução dos diretores de Matrix


Marcelo Marthe

Divulgação
O Speed Racer dos irmãos Wachowski e o original (no detalhe): recriação digital da animação japonesa

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Trailer do filme

Numa cena de Speed Racer (Estados Unidos, 2008), o herói tem seu carro arremessado de um despenhadeiro por um de seus adversários numa corrida. Sem problemas: como o veículo tem rodas com esporas de aço, basta Speed Racer (Emile Hirsch) escalar uma encosta vertical para logo adiante voltar à disputa. Acrobacias que contrariam a lei da gravidade são a pedra de toque da fita que estréia nesta sexta nos cinemas. Em pistas que lembram mais montanhas-russas que autódromos, os carros dão saltos e piruetas absurdos. São equipados ainda com armas como serras e arpões, já que ali a competição é suja. Trata-se, em essência, do mesmo tipo de situação que se via no desenho homônimo japonês que serve de inspiração ao filme. Com um herói tão implacável nas pistas quanto consciencioso de seus deveres familiares (e personagens que atiçarão a nostalgia do pessoal acima dos 40 anos, como seu irmão gorducho e o chimpanzé do clã, também presentes na nova versão), Speed Racer conquistou as crianças e os adolescentes ocidentais nos anos 60 e 70. Mais que pela trama em si, chamava atenção por uma qualidade técnica: seu criador, Tatsuo Yoshida, inventou um jeito de transmitir a sensação de vertigem da velocidade, mesmo dispondo de recursos escassos (os automóveis se moviam num cenário estático). Agora, coube aos irmãos Andy e Larry Wachowski, do sucesso Matrix, o desafio de reproduzir esse efeito na era do videogame, e não mais do autorama. Primeiro trabalho de ambos na direção desde a trilogia que arrecadou 1,6 bilhão de dólares nos cinemas, Speed Racer é um filme de ritmo frenético e apelo família para crianças e adolescentes.

Embora em vários momentos enverede pela animação quase pura, Speed Racer a conjuga de forma inusitada com elementos realistas. E não se está falando apenas da presença de atores de carne e osso – o elenco conta com gente como Susan Sarandon no papel da mãe certinha do corredor, John Goodman como seu pai e cérebro por trás do carrão Mach 5, e Matthew Fox (da série Lost) como o misterioso Corredor X, que Speed suspeita ser seu irmão supostamente morto num rali. Por meio da computação, objetos e paisagens reais foram recombinados em cenários totalmente artificiais – o que é realçado pelas manobras improváveis dos carros e pelas cores berrantes. Numa mesma cena, pode-se avistar um castelo italiano e o deserto do Marrocos sob um céu vermelho chapado, por exemplo. Ainda que por vezes o resultado dessas colagens canse os olhos, é inegável que os Wachowski encontraram uma forma de atualizar aquela sensação de vertigem do desenho original.

Como ocorreu com as duas seqüências decepcionantes de Matrix, contudo, fica evidente que os irmãos estão mais empenhados em ganhar o espectador pela engenhosidade do visual do que pelo roteiro. As bases da trama são as mesmas do velho desenho japonês: fala-se do embate de um indivíduo e sua família modesta contra o dono de uma megacorporação que maneja as corridas conforme seus interesses comerciais, tornando-as um jogo de cartas marcadas. Ou seja, é o argumento surrado de que a culpa é do "sistema" – e os Wachowski não se preocuparam nem em injetar emoção nele. Apesar dos bons atores (a começar pelo protagonista, a revelação Emile Hirsch, de Na Natureza Selvagem), os personagens não têm profundidade e os diálogos são burocráticos.

Não é uma história com alma, enfim, como a da animação Carros, da Pixar, para ficar no mesmo tema. Mas há que reconhecer que, apesar dos defeitos, o filme não chega a ser um desastre ainda mais se tendo em mente que seu público preferencial são os garotos vidrados em videogames. Não à toa, na mesma semana em que o filme de 120 milhões de dólares é lançado nos Estados Unidos, jogos desenvolvidos pelos diretores estão chegando às lojas. Uma produção como Carros tinha máquinas que pareciam gente. Já Speed Racer tem pessoas que se parecem com carros. E isso não é só um detalhe.

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