Entrevista:O Estado inteligente

sábado, maio 10, 2008

A puberdade precoce nas meninas

Quando é cedo demais

Pesquisadores identificam uma origem genética para a puberdade precoce, doença que atinge meninas antes dos 8 anos de idade


Adriana Dias Lopes

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A puberdade precoce, um distúrbio predominantemente feminino, ocorre quando a criança apresenta os primeiros sinais de maturação sexual antes dos 8 anos de idade. No caso das meninas, o corpo ganha formas arredondadas, os quadris se alargam, os seios se avolumam e os pêlos pubianos começam a crescer. Um ano depois, em média, ocorre a menarca. Descrita como doença no início do século XX, a puberdade precoce ainda não foi completamente decifrada pelos médicos, embora seja evidente que ela está associada a um desequilíbrio hormonal. Um passo importante para a compreensão do problema foi dado recentemente por pesquisadores da Universidade de São Paulo. Em parceria com a Universidade Harvard, nos Estados Unidos, eles constataram que a mutação em um determinado gene induz ao desenvolvimento sexual prematuro. É a primeira vez que se estabelece uma relação entre herança genética e puberdade precoce. "Até então, a influência da genética não passava de uma suspeita, com base no histórico familiar das pacientes", diz a endocrinologista Ana Claudia Latronico, coordenadora do estudo. "O próximo passo é investigar se há outros genes ligados à doença, o que no futuro pode resultar no desenvolvimento de remédios mais específicos." A descoberta foi publicada na revista científica The New England Journal of Medicine.

As transformações fisiológicas ocorridas na transição da infância para a adolescência resultam de uma cascata de reações químicas. Tudo começa com o aumento na produção do hormônio GnRH. Sintetizado na região cerebral do hipotálamo, ele funciona como um maestro do processo de puberdade. Nas meninas, o GnRH está envolvido na fabricação do hormônio estrógeno pelos ovários, que detona o início da puberdade. O problema surge quando os níveis de GnRH sobem antes de a criança completar 8 anos. Os médicos só conseguiam explicar a alta hormonal fora de hora em 10% dos casos – aqueles em que o paciente é vítima de outras doenças, como a meningite. Agora, com o estudo dos pesquisadores brasileiros e americanos, acredita-se que uma modificação no gene GPR54 talvez seja uma das principais causas da maioria dos quadros de puberdade precoce. Encontrado nos neurônios do hipotálamo, esse gene participa da regulação dos níveis do hormônio GnRH.

A puberdade precoce pode ser interrompida. Administrados em doses mensais ou trimestrais, sob a forma de implante cutâneo ou injeção, medicamentos bloqueiam a ação do hormônio GnRH. Entre os principais efeitos colaterais, estão alergias cutâneas, oscilações de humor e sangramentos leves nos primeiros meses de terapia. "A precisão na identificação dos primeiros sintomas é crucial para o sucesso dos remédios", diz o hebiatra Maurício de Souza Lima, do Hospital das Clínicas de São Paulo. Quanto antes o tratamento for iniciado, maior é a probabilidade de a puberdade precoce ser revertida. É uma corrida contra o relógio. Quando vem a primeira menstruação, é sinal de que 70% do ciclo de transição para a adolescência foi concluído – ou seja, não há muito o que fazer.

A antecipação da menarca tem conseqüências pesadas. Ao longo do processo natural da puberdade, o organismo passa por um grande estirão ósseo. Nos três anos de duração dessa fase da vida, as crianças crescem em média 30 centímetros. O desequilíbrio hormonal típico da puberdade precoce prejudica o desenvolvimento dos ossos e faz com que o crescimento seja menor. "Sem tratamento, uma criança com a doença raramente ultrapassa 1,50 metro de altura", diz a médica Ana Claudia. A puberdade precoce impinge ainda à sua vítima um tormento psicológico, principalmente quando ela é uma menina. De uma hora para outra, a garota se vê às voltas com um corpo de mulher, ao mesmo tempo em que só quer brincar de boneca, visto que o amadurecimento psíquico não acompanha a prematuridade das transformações físicas.

Freqüentemente, os médicos são procurados por mães aflitas por conter a puberdade das filhas pequenas. Na maioria das vezes, porém, o distúrbio não requer nenhuma intervenção. No último século, a idade da primeira menstruação caiu consideravelmente (veja o quadro). Atualmente, a menarca ocorre por volta de 12 anos. Isso significa que os primeiros sinais da puberdade começam a surgir de dois a três anos antes, o que se enquadra no padrão de normalidade. Há pelo menos duas explicações para esse adiantamento. A primeira é o fato de que as crianças hoje estão mais gordas. As células adiposas servem de combustível para a fabricação do hormônio GnRH. Há ainda a hipótese de que a exposição ao erotismo – na TV, na internet etc. – tenha o mesmo impacto sobre o cérebro das meninas.

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Fotos Getty Images



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