Apesar do resultado exagerado, ou por causa dele,
mulheres que sonham ter boca voluptuosa recorrem
cada vez mais cedo ao preenchimento de lábios
Sandra Brasil
Silvana Garzaro/Contigo |
Isabella: duas cirurgias para corrigir os efeitos do "presente" que ganhou para modificar uma boca que nunca teve defeito |
Bico de pato, boca de truta e, supremo insulto, carão de Donatella Versace. As muitas maneiras de designar o resultado artificial das intervenções estéticas nos lábios indicam a dúvida cruel: por que a medicina, numa era de técnicas literalmente miraculosas, não consegue dar às mulheres uma das coisas que elas mais cobiçam, a boca carnuda, voluptuosa, perfeita, de uma Angelina Jolie ou de uma Scarlett Johansson? Nem todas gostam de ouvir a resposta: porque, infelizmente, a maioria das mulheres não é Angelina nem Scarlett. "Não dá certo transformar uma boca fininha num bocão. Quem sonha com uma boca à la Jolie esquece que não tem o rosto dela. O preenchimento de lábios exige respeito à simetria do rosto e ao desenho original de cada paciente. Senão, fica com boca de peixe", avisa a dermatologista Adriana Vilarinho, de São Paulo, que cuida das respeitáveis belezas de Gisele Bündchen, Daniella Cicarelli e Adriane Galisteu, entre outras. Nem por isso elas deixam de tentar – cada vez mais, e cada vez mais cedo, mulheres (e alguns homens também) buscam o procedimento. "Nos últimos dois anos, a procura por preenchimento de lábios aumentou 30% entre as pacientes de 20 a 30 anos", avalia outra especialista do ramo, Denise Steiner, de São Paulo. "A média de idade, que era por volta de 50 anos, caiu para 30", confirma a paulista Ligia Kogos, que não vê nisso nenhum problema. "Tenho clientes de 16 anos que já fizeram, com autorização dos pais. Quando há um ganho de harmonia no rosto todo, não vejo por que não fazer."
Segundo os dermatologistas, o aumento de boca é o segundo procedimento mais procurado no consultório – só perde para tratamentos anti-rugas. "O mais difícil é controlar os pedidos. Todas querem colocar mais do que deviam", diz Adriana. Muitas conseguem, e tem-se então os deletérios resultados observados no rosto da nada controlada Donatella, 53 anos, com grande vontade de nunca passar dos 20. A estilista italiana é um caso típico de como inflar os lábios pode virar uma espécie de vício: apesar da dor e do preço, elas sempre acabam voltando. Por um preço que varia de 1.000 a 3.000 reais (dependendo do produto), a paciente toma anestesia local e, durante uma hora, submete-se a cerca de dez picadas que injetam em volta dos lábios 1 mililitro (2, para as que não gostam de limites) de um dos preenchedores temporários existentes no mercado. Há preenchimentos com colágeno e com gordura retirada da própria paciente, mas a maioria é feita com produtos à base de ácido hialurônico. Num prazo médio de oito meses, ele é absorvido pelo organismo. Enquanto dura, o ácido ocupa espaço, atrai líquidos e estimula a produção de colágeno, inflando os lábios. A secretária executiva Silmara de Oliveira Freitas, 28 anos, experimentou o ácido hialurônico há três anos. "Nunca tive lábios finos, mas notei que muitas modelos tinham bocão e fiquei com vontade de ter um igual", diz. "Gostei tanto do resultado que, um ano depois, voltei ao consultório para o preenchimento definitivo." Este, feito com uma substância derivada de petróleo chamada polimetilmetacrilato (PMMA), é mais barato e muitíssimo mais arriscado, pela tendência a formar pequenos mas visíveis caroços e pela contradição que cria – enquanto o resto do rosto cai, a boca continua ali, inflada e deslocada.
Que mulheres comuns queiram ter "boca de modelo" é compreensível, mas por que uma modelo se sente tentada a melhorar o que já é perfeito? "Curiosidade", responde Isabella Fiorentino, 30 anos, um dos rostos mais belos do Brasil. Por causa de um preenchimento definitivo exagerado, feito em 2005, ela já enfrentou duas cirurgias corretivas. "Fiquei com um bocão que não combinava comigo. Também apareceram umas bolinhas no lábio. Passei uns quatro meses esperando diminuir e só então descobri que o produto utilizado tinha sido o polimetilmetacrilato", conta. "Depois de duas cirurgias, acho que ficou bom, mas sinto falta da minha boca de antes, que era mais chique e elegante", lamenta Isabella, tão chique e elegante como sempre, às vesperas de se casar com o empresário Stefano Hawilla.
O cirurgião plástico carioca Carlos Fernando Gomes de Almeida diz que já atendeu casos de rostos deformados por causa do polimetilmetacrilato, substância que pode deflagrar processo alérgico e não é recomendada pela Sociedade Brasileira de Dermatologia. Mesmo com o preenchimento temporário é preciso cuidado, alerta ele. A sutileza do contorno dos lábios e a harmonia com o resto do rosto são detalhes difíceis de manter. Almeida propõe: "Antes de qualquer coisa, faça um teste. Contorne com lápis um pouco além dos limites naturais, preencha com batom vermelho e avalie o resultado. Em boca e olho, meio milímetro equivale a um quilômetro." O médico é mais liberal com o uso do ácido hialurônico para preencher os sulcos em volta da boca. "Eu mesmo já fiz quatro vezes nos últimos sete anos", diz. Embora não endosse exageros, a dermatologista Adriana Vilarinho também usa os recursos estéticos em proveito próprio: faz preenchimento de lábios com ácido há nove anos, desde os 30, e finaliza com um toque de Botox. "O efeito dura mais e não se formam ruguinhas", explica.