O Estado de S. Paulo |
20/5/2008 |
Depois de produzir diferentes e contraditórias versões sobre o dossiê dos gastos secretos da gestão Fernando Henrique Cardoso, a operação abafa comandada a partir da Casa Civil agora exibe sua fertilidade criativa na antecipação das explicações que José Aparecido Nunes Pires dará hoje à CPI dos Cartões Corporativos. Uma desculpa esfarrapada admite-se; duas, fica mais difícil. Três, parece piada; quatro, é confissão de culpa. Mas cinco já é desrespeito para com a paciência do alheio. Assim que apareceu o Aparecido para assumir a culpa na polícia e na CPI, a história contada pelo Palácio do Planalto dava conta da ira do moço e de sua disposição de entregar todo mundo. Estava nervoso, avisando que não cairia “sozinho” e, por isso, precisava ser contido. Em seguida, o irado pede ao Supremo Tribunal Federal para ficar calado na CPI. Mais calmo, prefere o silêncio e a solidão na queda. Mas, ainda assim, os “temores” de que possa vir a entregar as superioras continuam a freqüentar notinhas aqui e ali. Logo, porém, o rapaz é indiciado pela Polícia Federal - recebendo de presente o respaldo legal ao “direito” de nada dizer à CPI - e informa-se que o dossiê saiu do computador dele em direção ao terminal do assessor do senador Álvaro Dias, André Fernandes, por distração. “Tive uma surpresa quando percebi que tinha enviado”, disse no depoimento na Polícia Federal. Talvez os policiais tenham deixado passar ou talvez tenham pedido para Aparecido explicar por que, então, havia dito em entrevista à TV Globo que o anexo do e-mail enviado a Fernandes continha informações sobre uma determinada legislação. A tese do “mero descuido”, lançada dias antes pelo ministro da Justiça, Tarso Genro, já fazia carreira quando o ministro das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, apresentou outras duas versões da mesma desculpa em menos de 24 horas. No domingo, o ministro informou que Aparecido vazou mesmo, mas não fez por mal, apenas “não mediu as conseqüências” do ato. Na segunda-feira, o ministro veio a público transmitir à Nação um pouco da tranqüilidade reinante no Palácio do Planalto em relação ao depoimento de hoje. Segundo ele, o governo só quer que Aparecido diga a verdade: “Que foi uma troca de informações entre amigos.” Ou seja, primeiro queria falar, depois preferia calar, em seguida aceitaria assumir a falha da distração, que ato contínuo se transformou em ato deliberado, mas desprovido de má intenção e, horas mais tarde, recebia o figurino de um bate-papo de amigos. Para a base governista, maioria na CPI, desse modo está tudo devidamente esclarecido. “Houve um engano e isso desmonta a tese do dossiê para constranger a oposição”, resumiu o deputado petista Paulo Teixeira. Na verdade está tudo mais nebuloso do que nunca. A “tese” do dossiê não se sustenta na trajetória do documento para ambiente externo ao Palácio do Planalto. A “tese” se baseia nas sistemáticas manifestações de ministros e parlamentares sobre a existência de uma seleção de gastos do governo FH, considerados jornalisticamente chamativos, a serem usados para facilitar um acordo com a oposição em prol de uma CPI sem investigação. Municiado com o dossiê, o governo avisava em toda parte que não apanharia “calado” e desta vez não ficaria “nas cordas”. É disso que se trata, é sobre isso que o comando da Casa Civil, e não subordinados cumpridores de ordens, ainda precisa fornecer uma explicação resistente à ação dos fatos. Descontada a apresentação da “nominata” dos mandantes do crime, Aparecido não tem nada de fundamental a dizer na CPI. É secundário o que ocorreu com o dossiê do lado de fora da Casa Civil, se antes não se souber tudo sobre sua origem. O local de nascimento já é conhecido, mas fundamental mesmo é estabelecer com nomes e sobrenomes a filiação do rejeitado rebento. Operações No primeiro turno, a manutenção de Geraldo Alckmin na luta e a disputa dele com o prefeito Gilberto Kassab pelos votos do mesmo eleitorado vai favorecer Marta Suplicy, como analisam os petistas. Nessa fase, a conta é de dividir e, com sorte, o PT leva de primeira. Mas, havendo segundo turno, pela lógica a conta será de multiplicar. E aí a tendência é o favorecido ser o adversário de Marta, pois se a pessoa escolheu Geraldo Alckmin no primeiro turno, natural que na etapa seguinte vote em Kassab. O mesmo raciocínio aplica-se em relação ao eleitor de Alckmin, ser for Kassab o oponente da candidata do PT na final. A hipótese mais remota é a de parcela significativa do eleitorado de um ou de outro optar por Marta no segundo turno. Além disso, por mais que o ímpeto assassino faça serristas e alckmistas trabalharem um contra o outro por baixo do pano, a vocação suicida não é tão acentuada ao ponto de levá-los a se engajar de público na campanha de Marta.
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Entrevista:O Estado inteligente
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