Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, maio 13, 2008

Celso Ming Vácuo decisório

O presidente Lula lançou ontem no Rio novo pacote de incentivos à indústria, que o ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, chamou de "aprofundamento da política industrial implantada em 2004".

A rigor, a política de 2004, que teoricamente contemplou quatro subsetores da indústria (software, fármacos, semicondutores e bens de capital), não chegou a decolar ou, se decolou, não pegou altura. O ministro Guido Mantega defendeu esse pacote como necessidade de empurrar as exportações industriais, algo que parece suprir falta de substância, porque as exportações dependem de outras alavancas.

Então, se for de fato aprofundamento daquela política, como diz o ministro Miguel Jorge, o risco é o de que esse programa se torne o aprofundamento do irrelevante. Tomara que não seja assim. Está em jogo uma renúncia fiscal da ordem de R$ 21,4 bilhões, e isso não é pouco.

Nos próximos dias ainda vamos saber o que há dentro do pacote. Por ora, convém examinar coisas básicas. Política industrial é um tema polêmico, em especial depois da redemocratização do País. No governo Collor, foi dada ênfase à abertura ao comércio exterior. O período Itamar avançou alguns passos, então chamados de política de câmaras setoriais, mas foram os Estados que atuaram mais pesadamente. Distribuíram créditos de ICMS, que favoreceram as montadoras de veículos e produziram a guerra fiscal.

A administração Fernando Henrique concentrou-se na privatização, para que os próprios agentes buscassem nichos de atuação, e fez questão de não ter uma política industrial propriamente dita porque isso sugeria favorecimentos e artificialidades.

O governo Lula começou vacilante. O PT chegou a ser avesso à distribuição de subsídios. O ex-governador Olívio Dutra (PT-RS) afugentara a Ford do Rio Grande do Sul em 1999 (depois, viu que foi besteira pragmática). Mas o partido também queria uma política que favorecesse o emprego e a criação de um mercado interno de massa. O governo Lula pareceu chegar até aqui sem opinião formada sobre o tema.

A limitação maior não é falta de recursos. É não saber para onde ir. A macronovidade é a forte competição asiática num ambiente cambial adverso. As enormes oportunidades no agronegócio podem prejudicar o produto industrial que padece com falta de acesso aos mercados externos, os quais deviam ser garantidos (e não são) por acordos comerciais.

Às vezes, o governo parece inclinado a enfrentar os chineses com defesas tarifárias bizarras, como ocorre na área têxtil, e outras, com compensações tributárias e cala-bocas do gênero (como as anunciadas para os setores de calçados e móveis), que passam pomadinha nas feridas internas, mas não defendem o mercado externo.

É preciso saber o que fazer com nosso petróleo e como ajustar a indústria aos novos tempos; o que desenvolver e o que deixar para trás; que tratamento dar à Zona Franca de Manaus; e como treinar mão-de-obra qualificada, cada vez mais escassa - tarefa que o Sistema S não desempenha satisfatoriamente, pelas limitações de recursos e vícios de origem e de trajetória.

A política industrial anunciada leva o risco de sumir no vácuo decisório, como sumiu a política industrial de 2004.

CONFIRA

Consenso - Pela primeira vez em muitos anos, ortodoxos e heterodoxos chegam a um acordo num ponto essencial da política econômica. As duas igrejas econômicas concordam em que, ao menos para evitar a alta dos juros, é preciso aumentar o superávit primário (sobra de arrecadação para cortar a dívida).

E, se é verdade que o Fundo Soberano do Brasil será constituído com superávit fiscal, a iniciativa, vista inicialmente com ceticismo, pode encontrar amplo apoio.

Mas isso não esclarece como será capitalizado o Fundo, nem quais as suas finalidades.

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