Ainda que as estatísticas mostrem equilíbrio entre oferta e procura, não há o que segure os preços. Há dois meses ainda se imaginava que a tão falada recessão americana conteria a escalada. Não se acredita mais nisso. As apostas já não são sobre se os preços chegarão ou não aos US$ 150 previstos pelos especialistas do Goldman Sachs. São sobre quando a marca será ultrapassada.
As demais commodities, especialmente os alimentos, também seguem cavalgando, sabe-se lá até quando e até onde. Assim, energia e alimentos vão injetando gás na inflação mundial.
Houve um momento neste ano em que a predisposição dos analistas foi culpar os bancos centrais por injetarem dinheiro demais na economia a pretexto de combater a crise. "São assopradores de bolhas" - diziam. E, nesse discurso, a alta do petróleo e dos alimentos foi vista como manobra dos especuladores de sempre. Logo se viu que não há estoques que expliquem tanta perversidade. Foi preciso buscar explicação para o acontecido em outros departamentos.
E, assim, ficou consolidada a percepção de que o especulador está apenas pegando carona num movimento mais profundo, que é o forte aumento do consumo dos países emergentes, especialmente da Ásia. Na tomada de consciência mudam também os suspeitos. O desvio de cereais para a produção de biocombustíveis foi apontado como principal responsável pela alta dos alimentos. Agora se sabe que não passa de afluente desse rio. É muita gente nova ascendendo ao mercado de trabalho e consumo, bebendo da água antes disponível quase tão-somente para os ricos.
Tanto que, lá no Hemisfério Norte, há gente importante se perguntando se a súbita corrida dos emergentes aos suprimentos deve ser ou não entendida como ameaça. Foi, por exemplo, o que o ex-secretário do Tesouro dos Estados Unidos Larry Summers tratou em dois artigos recentes (America needs to make a new case for trade e A strategy to promote healthy globalization), ambos comentados na edição de ontem do Financial Times pelo articulista Martin Wolf. A voracidade dos emergentes está criando problemas novos para as economias dos países centrais...
Ora, os emergentes só estão incorporando os padrões de consumo dos ricos. Como, então, condená-los pelo que os outros fizeram impunemente antes deles? A questão não morre aí. É preciso ver se o Planeta agüenta e se a oferta de matérias-primas e de energia dará conta. Gente sábia adverte que haverá trombada se não houver uma virada no paradigma global de consumo e produção.
Ah, sim, all we need is love, martelavam os Beatles. Mas, além do essencial, todos nós queremos casa confortável, ensino de primeira, automóvel na garagem, geladeira farta, seguro-saúde dos bons e aposentadoria generosa.
Se é verdade que o sol nasce para todos, também é verdade que o cobertor é curto, a vida é dura e o medo de perda continua sendo a emoção primária do ser humano - como já alertava Thomas Hobbes.
Confira
Recado passado - Ontem, o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) divulgou a ata da reunião do último dia 30. Lá ficou dito que foi difícil aprovar a queda dos juros de 0,25 ponto porcentual, então confirmada, porque os governadores queriam reinaugurar a linha mais dura contra a inflação.
Ficou entendido que o inimigo mais importante deixou de ser a crise financeira e passou a ser a inflação.
Isso não quer dizer ainda que os juros subirão na reunião do dia 25 de junho. Mas ficou claro que o mercado deve preparar-se para nova guerra.