Chegam ao Brasil lojas inspiradas no bem-sucedido
modelo da Apple. Lá, os vendedores são "gênios em Mac"
e os clientes mexem em tudo à vontade
Marcos Todeschini
Fotos Roberto Setton e Michael Nagle/Getty Images![]() |
Marcelo Sé tem um plano ambicioso: investir em oitenta lojas imitando, em menor escala, o que se passa na Apple da Quinta Avenida, em Nova York (à dir.) |
As lojas da Apple são espécies de templos da era digital, por onde todo mês passam em romaria 10 milhões de pessoas ávidas pelos novos modelos de iPods e iPhones. Não é raro esbarrar com uma fila na porta de lojas como a da Quinta Avenida, em Nova York, onde um escultural cubo de vidro na entrada dá o tom do design que domina o interior. O lugar tem 2 000 metros quadrados, mas mesmo assim lota. Esse já seria um fenômeno por si só. Impressiona mais ainda o fato de essas lojas já representarem um quinto de todo o faturamento da Apple, de 24 bilhões de dólares por ano. Isso tendo partido do zero em 2001, quando o próprio Steve Jobs, dono da empresa, criou a primeira de uma série de 209 lojas, hoje distribuídas em seis países. Como a Apple não tem plano de abrir nenhuma por aqui, dois empresários brasileiros tiveram a idéia de copiar o modelo concebido por Jobs. As duas lojas, ambas inauguradas em São Paulo, no mês passado, são bem menos portentosas do que aquelas que lhes serviram de inspiração. No entanto, conseguiram aplicar o básico da cartilha da Apple, sobretudo por tornar a ida à loja "uma experiência" para gente como o maestro Reynaldo Martinelli, 58 anos. Durante a visita, Martinelli relata a satisfação de mexer nos eletrônicos à vontade e encontrar quem compartilhe o mesmo hobby: falar de tecnologia. Ele resume o clima local: "Num lugar como esses, estou em casa".
Não foi apenas o sucesso das lojas Apple mundo afora que motivou a réplica da fórmula de Jobs no Brasil, mas também algo que diz respeito à realidade brasileira: num momento em que a economia prospera, a venda de computadores no país cresce em ritmo três vezes maior do que a média mundial. O empresário Edson Shimada juntou dados como esse à própria experiência para decidir abrir a A2You, uma revendedora autorizada da Apple, onde 80% dos produtos pertencem à marca. Diretor da Fast Shop, uma rede nacional de 42 lojas especializadas em eletrônicos, Shimada entendeu na prática que havia um mercado inexplorado ao observar que suas lojas causavam certa frustração a um grupo específico de pessoas. Elas se queixavam de não poder manusear os aparelhos confinados em vidros e procuravam modelos de que a loja não dispunha, sobretudo os da Apple. Com dinheiro para gastar, saíam de mãos vazias. Isso explica o fato de Shimada ter investido na melhora da oferta de produtos na antiga rede e autorizado sua livre experimentação. Também esclarece sua decisão de apostar numa loja ao estilo Apple e já ter planos de abrir mais duas nos próximos meses. Ele diz: "Sempre quis ser dono de uma".
As lojas no Brasil já chamam atenção para uma característica bem própria do cenário local: além dos fissurados em tecnologia, elas atraem pessoas sem especial interesse no assunto nem intenção de comprar. "O que as fascina, basicamente, é o design", diz o engenheiro Daniel Pereira, 29 anos, estudante de pós-graduação em nanotecnologia e vendedor na A2You. Gente tão bem formada quanto ele tem ainda a missão de dar aulas e palestras sobre os aparelhos in loco, tal qual ocorre na Apple original. Caso trabalhasse numa delas, Pereira seria mais conhecido como "gênio em Mac". No Brasil, é também uma espécie de "alfabetizador digital". "Aqui, essas aulas e palestras têm uma segunda função: formar os clientes", conclui o empresário Marcelo Sé, dono da MisterTech, a outra loja no modelo da Apple. Marcelo é um novato no meio. Por dezoito anos, ele trabalhou nos supermercados da família, a rede Sé, até que o avô decidiu passar o negócio adiante. Migrou, então, para o ramo de tecnologia. De quatro anos para cá, ele montou quarenta revendedoras da empresa de telefonia celular TIM. Agora, planeja esparramar, até 2010, mais oitenta lojas MisterTech em diversas capitais brasileiras.
Não custa pouco abrir e manter um negócio desse tipo – algo como 20% mais dinheiro do que na média das grandes redes de lojas onde se vendem eletrônicos. Isso porque o salário dos "gênios em Mac" é mais alto do que o de um vendedor comum, a linha de eletrônicos à venda é mais cara e os vários produtos fora da vitrine ficam inutilizados. No caso brasileiro, há ainda um complicador: num terreno por desbravar, não é prudente investir em um estoque grande demais, uma vez que, caso encalhem, os aparelhos perigam tornar-se obsoletos e perder valor. O lado bom diz respeito ao faturamento. Nos Estados Unidos, ele é 75% maior nas lojas da Apple do que nas grandes redes especializadas em eletrônicos (veja o quadro). Na concorrência com uma profusão de lojas do ramo e ainda com a internet, por meio da qual 30% dos americanos já fazem suas compras de eletrônicos, a Apple tem levado a melhor por uma razão: associando sua marca a uma espécie de parque de diversões high-tech, conseguiu valorizá-la como nenhuma outra empresa de tecnologia fez nos últimos tempos. Ao copiarem a fórmula, os brasileiros esperam retorno rápido. Aposta Marcelo Sé: "Recupero o investimento em um ano".