Panorama Econômico |
O Globo |
11/1/2007 |
Faça um teste. Imagine que você é um grande empresário, com investimentos fora do Brasil na área de concessão de serviços públicos e produção de matéria-prima e energia. Você mandaria seu dinheiro para investimentos na Venezuela e na Bolívia, que estatizaram empresas estrangeiras, ou para o Equador, que ameaça fazer o mesmo? Aumentaria seu investimento em outros países da mesma região onde está virando moda esse tipo de medida de força? São perguntas que investidores no mundo estão se fazendo agora. No ano passado, a Venezuela expulsou do país duas empresas estrangeiras - Total e Eni - que se recusaram a assinar um novo contrato de exploração de petróleo dando a maioria do capital do empreendimento à PDVSA. A Petrobras ficou porque aceitou os termos. Na Bolívia, o presidente Evo Morales decretou a nacionalização num campo de gás explorado pela Petrobras, enquanto as tropas tomavam instalações da empresa brasileira, a maior investidora no país. Morales a acusou de contrabando, sonegação e manipulação. Impôs às empresas petrolíferas todo tipo de constrangimento para que elas aceitassem assinar novos contratos em outras bases. O Equador, de Rafael Correa, ameaça seguir pelo mesmo caminho. A Argentina congelou, por quatro anos, as tarifas de serviços públicos prestados por empresas estrangeiras que compraram ativos na privatização. Se o investidor conseguir separar os países, melhor para nós. Aí o Brasil fica do lado de países como o Chile, onde isso nem passa pela cabeça do governo socialista; ou a Colômbia, onde o direitista Álvaro Uribe também não tem esse plano. Mesmo assim, o investidor precisará conhecer bem as nuances e as sutilezas da política latino-americana, para não se deixar confundir pelas declarações feitas pelo presidente Lula em favor de Hugo Chávez e de Evo Morales e criticando a privatização. Se o investidor não souber a diferença entre os países e os governantes, o investimento simplesmente não vem. O Brasil corre risco duplo. Como investidor, pode ter perda nos seus empreendimentos nesses países; como receptor de investimento, corre o risco de ser atingido pela reputação dos vizinhos. Os dados da Unctad, órgão da ONU para o comércio e o desenvolvimento, mostraram que o investimento caiu 4,5% na América Latina em 2006 e subiu 34,3% no resto do mundo. A região está ficando isolada, como uma área do planeta onde ainda vigoram leis e atitudes de meados do século passado; onde caudilhos, com discursos nacionalistas e comportamento arbitrário, encampam empresas proclamando que tudo fazem em nome do povo. Pelos dados da Unctad de investimento produtivo - o Investimento Direto Estrangeiro -, o Brasil não teve queda, como no resto da América Latina, mas ficou bem abaixo do mundo e recebeu menos capital que o México. No Chile, a entrada de capital aumentou mais que no mundo: 48%. Nele os investidores confiam. A Venezuela não divulga as estatísticas de petróleo; por isso, toda informação que existe é estimativa. Estima-se que o país tenha 80 bilhões de barris de petróleo, o que são 6,8% das reservas mundiais provadas. O plano de investimentos da PDVSA é modesto para uma empresa petrolífera; é de US$6,3 bilhões por ano até 2010, além de outros US$2,5 bilhões que viriam de fonte privada. Em 2005, o investimento realmente feito pelo setor público foi a metade da meta. A Venezuela precisa atrair investimento privado estrangeiro ou nacional. A empresa estatal precisa de parceria para recuperar sua produção, que está estagnada num nível baixo; mas a forma como o governo hostiliza os investidores está fazendo com que eles se afastem. A Pemex investe o dobro da PDVSA por ano. A Petrobras investe o dobro do que a Venezuela estabelece como meta, ainda não alcançada. Uma grande parte das receitas da PDVSA é usada para financiar a política social dentro do país, ou as bondades diplomáticas a outros países, como Cuba, Bolívia, Nicarágua. Assim, Hugo Chávez está descapitalizando a empresa. Mais que nunca, a PDVSA precisaria da confiança do investidor externo. Chávez está aprofundando seu projeto político e econômico. Depois de estatizar empresas de capital americano esta semana, ele, na posse do seu novo mandato, disse que está começando uma nova etapa da vida do país, e reafirmou seu projeto de mudar a Constituição para permitir eleições sucessivas, já nomeando a pessoa que vai comandar a reforma da Constituição. Depois soltou mais meia dúzia de ofensas; desta vez, contra a Igreja Católica. A um sacerdote que fez uma declaração de que ele não gostou, disse: "Monsenhor, vá me esperar no inferno." Afirmou que vai buscar o socialismo, que é "impossível de se encontrar no capitalismo". Quando jurou pela primeira vez, disse que jurava sobre uma constituição moribunda. Ontem, à hora do juramento, proclamou: "Pátria, socialismo ou morte, eu juro." Esse tipo de arroubo é tão fora de época que soa apenas patético. Se Hugo Chávez prejudicasse apenas a Venezuela, seria lamentável, mas é um assunto deles. O problema é que os freqüentes rompimentos de contrato em países da região podem afastar o investidor da América Latina como um todo, salvando-se apenas os que souberem se diferenciar claramente. |
Entrevista:O Estado inteligente
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