Entrevista:O Estado inteligente

sábado, janeiro 20, 2007

LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS O Copom e os juros



O preço de uma desaceleração na queda dos juros aparecerá nos próximos meses em mais redução nas previsões do PIB

NOS APROXIMAMOS de mais uma reunião do Copom, e as avaliações dos analistas sobre a nova taxa Selic tomam conta da imprensa especializada. As decisões dos bancos centrais sobre a condução da política monetária constituem hoje o núcleo central da gestão da grande maioria das economias modernas. As ações do poder executivo perderam muito da sua importância na definição do pulsar dos mercados. Poucas nações hoje, e a China é o melhor exemplo, ainda têm nas decisões de seus governos um foco importante de influência sobre a economia.
A lógica desse comportamento é muito simples: a dinâmica dos mercados depende quase integralmente de decisões privadas e essas seguem principalmente a ação dos bancos centrais, a grande maioria deles com independência em relação aos governos. O comportamento futuro dos agentes econômicos, dependendo das decisões da autoridade monetária, expressa-se por meio de uma miríade de contratos futuros que amplificam as decisões sobre os juros. E la nave va...
No Brasil de hoje, vivemos cada vez mais uma dinâmica de normalidade monetária, o que explica a importância das reuniões do Copom e as especulações e análises que tomam conta da imprensa sobre suas decisões. O leitor da Folha já conhece minha opinião sobre a origem dessa dinâmica racional que reencontramos, depois de décadas de um isolamento intenso ocasionado por crises financeiras recorrentes: o incrível ajuste em nossas contas externas e a nova realidade de um Brasil com moeda forte sem truques. Por várias vezes, escrevi que temos hoje um metabolismo econômico que nos aproxima muito das outras economias de mercado. Esse entendimento ainda não permeou a grande maioria de nossos economistas, embora recentemente alguns nomes importantes tenham vindo para o lado das minhas idéias.
Aproveito essa proximidade da decisão do Banco Central sobre a taxa Selic para aprofundar minha análise. Os dados mais recentes sobre o comportamento da economia brasileira permitem, agora de forma mais clara, visualizar esse novo metabolismo. O IBGE acaba de publicar as estatísticas sobre as vendas no varejo em novembro de 2006. A equipe econômica da Quest fez algumas adaptações nesses números e chegamos a algumas observações interessantes. Em novembro de 2006, as vendas no varejo no Brasil cresceram mais de 10% quando comparadas com o mesmo mês de 2005. Os números são ainda maiores no caso de móveis e eletrodomésticos (15%), veículos e motos (12%) e eletrônicos como celulares e computadores (23%). Números suficientemente elevados para que alguns analistas clamem por um cuidado maior por parte do Copom. Estaria havendo, segundo eles, um superaquecimento da demanda e o risco da inflação voltar a subir.
A grande maioria desse grupo é formada por profissionais que se esqueceram de como pensar uma economia de mercado, aprisionados que estão em modelos incapazes de capturar o novo metabolismo a partir do ajuste das contas externas. Se tivessem mais cuidado, deveriam olhar também para as variações dos preços no varejo nesse mesmo período. No total dos produtos vendidos, tivemos uma deflação de 0,4%, no segmento de veículos, uma queda de preços de 2,0%, no de móveis e eletrodomésticos, uma redução de 3,9%, e no de eletrônicos, uma queda de 11%. Ou seja, a oferta desses produtos -incluídas as importações- está em linha com a demanda e não permite o aparecimento do que chamamos de poder de preços dos produtores desses bens.
Esse equilíbrio entre oferta e procura para os mercados mais pressionados pelo aumento da demanda pode ser visto também nos dados de nosso comércio exterior.
O aumento das importações está desviando para o exterior parcela crescente da demanda interna. No terceiro trimestre de 2006, esse vazamento subtraiu 1,2% do crescimento do PIB em termos anualizados; no quarto trimestre, será de 2% do PIB. Para 2007, podemos esperar um número superior porque esse processo de aumento do coeficiente de importação ainda está se acelerando.
A percepção desse novo metabolismo da inflação está restrita a um número pequeno de analistas e por isso é que vemos a grande maioria clamando por uma redução ou mesmo interrupção do processo de redução de juros no Brasil. O preço dessa decisão, se tomada, vai aparecer nos próximos meses em mais uma redução sistemática nas previsões do crescimento do PIB ao longo de 2007.

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