Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, janeiro 16, 2007

Jânio de Freitas - Dois momentos



Folha de S. Paulo
16/1/2007

Ao que parece, do que viveu Paulo Egydio como operador de Geisel nada o marcou mais que o caso Vladimir Herzog

A NARRATIVA DO ex-governador paulista Paulo Egydio Martins em seu vindouro livro de memórias (mencionada na Folha de domingo por Mônica Bergamo), sobre o caso Vladimir Herzog, tem um remoto antecedente carioca.
Já fora do governo, Paulo Edygio viajou ao Rio e, como de costume nessas ocasiões, marcou um almoço com o ex-deputado Gilberto Azevedo, mais do que companheiro de política, seu velho amigo. Almoço no Timpanas, o tradicional e hoje extinto português da rua São José, no centro, que Azevedo, bom conversador e bem informado, freqüentava em companhia de algum convidado. Naquele dia não faltava um convidado, jornalista levado para conhecer o ex-governador.
Paulo Egydio teve participação intensa, como operador de Geisel, no período de maiores dificuldades entre o general e o esquema de repressão militar em São Paulo. Mas, ao que parece, de tudo o que viveu e testemunhou então, nada o marcou mais do que o caso Vladimir Herzog. Natural que, à época do encontro no Rio, o assunto tivesse longa presença. Não, porém, para publicação. Nem seria mesmo o caso, nas circunstâncias da época e nas peculiaridades temerárias do assunto.
Foi uma narrativa pormenorizada que Paulo Egydio fez, do encontro que teve em um evento, quando ainda não divulgada a morte de Herzog, com o cônsul inglês em São Paulo. Do qual ouviu a referência à perda de "um homem nosso" na prisão do DOI-Codi, sem entender a expressão. E sem pressentir o que a explicaria em seguida: "Era agente nosso".
Ao narrar o diálogo, Paulo Edygio continuava atônico com o episódio, não tinha nenhuma comprovação do dito pelo cônsul, nem consta que tenha jamais aparecido um indício ou suspeição a respeito, a não ser para quem assim considerou o período de Herzog na Inglaterra. Resta aguardar a memória organizada por Paulo Egydio para a história, com a expectativa de que, sobretudo em outros assuntos, honre a oportunidade a que seus correligionários têm fugido, ou ludibriado.
Uma linha telefônica especial, entre o Palácio dos Bandeirantes, o Planalto e o Alvorada, servia a parte das tarefas de Paulo Egydio na colaboração a Geisel.
Até hoje ele não sabe de um pequeno incidente proporcionado pela tal linha, e muito ilustrativo daquele período.
Foi na paulistana avenida Angélica, em casa de um grande jornalista, por 25 anos integrante da Folha e, então, já aposentado. O telefone deu uns escalos esquisitos e Noé Gertel, por curiosidade, pegou o fone. Ouviu um diálogo breve. De um lado, era Paulo Egydio, que dizia em seguida a rápido cumprimento: "Houve mais um". Na outra ponta, Geisel responde: com uma imprecação. Depois, duro e veloz: "Desliga e mantém sigilo". E bateu ele o telefone. Nem a linha especial era muito especial. E os trapalhões das escutas policiais-militares, menos ainda.
Não tardou, o general Ednardo D"Avila Mello, comandante do 2º Exército, era destituído por Geisel. Para muitos, data desse ato o inicio do êxito (relativo) de Geisel sobre a repressão militar.

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