Favelas não são sinônimos de criminalidade. Mas o crime sem colarinho tem relação direta com a favelização |
Transpor os obstáculos para as ações eficazes contra o estado de violência é mais difícil do que repor a criminalidade em níveis, digamos, compreensíveis.
O primeiro dos obstáculos está no próprio motivo que permitiu, no correr de sucessivos mandatos de prefeitos e governadores, a multiplicação e o gigantismo de concentrações "urbanas" desprezadas, em todos os sentidos, pelo Estado e seus deveres.
A motivação inabalável para essa postura anti-social (senão criminosa) dos poderes públicos, apesar das conseqüências óbvias, cabe em duas palavras: interesse eleitoral.
Manifesto em duas vias: possíveis votos nas novas concentrações e, muito mais determinante, evitar manifestações eleitoralmente corrosivas, sempre intermediadas pela mídia, contra ações restritivas à formação e ao aumento incessante das aglomerações desgovernadas.
Favelas não são, por si mesmas, sinônimos de criminalidade. Muito mais que seculares, por longo tempo conviveram nas cidades brasileiras com a imagem, apenas, de mão-de-obra abundante e barata para classes indiferentes à desgraça alheia.
Mas a criminalidade sem colarinho tem relação direta com a favelização descomunal. As favelas densas são, para a bandidagem organizada em torno de armas e crimes, o que a floresta é para a guerrilha. Com uma vantagem incomparável: além da densidade de construções e esconderijos, a melhor proteção não é feita por troncos de árvores, mas por troncos humanos, desarmados, desprevenidos, inocentes no crime e na batalha que ocorra entre policiais e bandidos.
Daí provém o segundo obstáculo para a disposição de quebrar a criminalidade. O grau de violência da bandidagem sobe sem limite. Seu armamento é farto e atualizado. Combinação de violência e recursos que significa a impossibilidade de extingui-los com os métodos convencionais de ação policial. É uma realidade dramática que sugere tragédias, em caso dos enfrentamentos capazes de levar a restauração da segurança pública a níveis aceitáveis.
Por menos que se duvide das intenções de Sérgio Cabral, José Serra, Aécio Neves e do capixaba Paulo Hartung, é difícil imaginá-los dispostos a mais do que métodos convencionais contra a criminalidade sem colarinho e, adversário que lhes seria muito mais difícil e conseqüente, contra os movimentos de opinião que tanto são contra a criminalidade quanto se mostram contrários à polícia de combate. Hoje, parte dessa opinião já chega a recusar aos policiais, postos diante da metralha bandida, que se protejam com um carro-forte, o tal Caveirão, como se fossem candidatos a mártires por nada.
Há muito a discutir sobre esse tema. Só não é aconselhável que alguém se dê ao trabalho de refletir sobre o que cabe em tudo isso aos jornais, TV, rádios e revistas - aos jornalistas, em resumo. O risco de desalento total é muito grande.