Entrevista:O Estado inteligente

sábado, janeiro 13, 2007

GESNER OLIVEIRA Saudades do crescimento

Termino período de quase 7 anos de colaboração na Folha; passou rápido, mas daria para ler a "Montanha Mágica"

NÃO DÁ para disfarçar a dor-de-cotovelo com o resultado da corrida do desenvolvimento das últimas décadas. O Brasil, que já foi campeão de crescimento, está em penúltimo lugar nas projeções de PIB para 2007 entre as 25 maiores economias emergentes, segundo relatório das Nações Unidas divulgado nesta semana. Os artigos desta coluna procuraram refletir sobre essa frustração.
O Brasil assistiu ao sucesso da Irlanda a partir dos anos 70; à rápida integração de Portugal e Espanha ao bloco europeu a partir dos 80. À transformação do Chile e à ultrapassagem do México nos 90. E, neste início de século 21, ao contraste com o fenômeno China e à perda de oportunidade representada pela expansão mundial.
Um país com tantas mazelas sociais como o Brasil não pode se dar ao luxo de desperdiçar chances de ouro. O problema é como romper com quase três décadas de semi-estagnação de maneira duradoura. Ao reler os 344 artigos desta coluna desde 10 de junho de 2000, é possível identificar temas comuns e perceber uma insatisfação com o debate nacional sobre a questão econômica.
Em primeiro lugar, é equivocada a esperança cega de que haverá um Dia D das reformas. O desenvolvimento de uma economia em transição como a brasileira requer um fluxo contínuo de mudanças estruturais que vão muito além de alterações formais ou de novas siglas, como a do esperado PAC (Pacote de Aceleração Econômica). A mudança real exige estratégia, amadurecimento institucional e uma nova cultura. É processo que requer tempo e transcende os ciclos presidenciais.
Em segundo lugar, é falso o dilema entre aqueles que rechaçam qualquer tipo de ação do Estado para induzir o desenvolvimento e os que gostariam de voltar a um passado de intervencionismo. Colocado nesses termos, o ativismo governamental e a preocupação com as instituições acabariam erroneamente em pólos opostos. Em um extremo, é como se o Estado pudesse ser dirigido por uma espécie de piloto automático.
Em outro, é como se governantes bem-intencionados e esclarecidos pudessem maximizar o bem-estar da sociedade, independentemente da qualidade das instituições. Nenhuma das alternativas serve ao Brasil. O segredo reside em conciliar o ativismo da política pública com uma engenharia institucional adequada. Essa expressão pomposa designa a construção de instituições capazes de conferir transparência e credibilidade à política pública.
Em terceiro lugar, houve uma preocupação em valorizar temas normalmente esquecidos no debate.
Durante décadas, o foco recaiu quase que exclusivamente nas questões macroeconômicas. A gravidade do problema inflacionário entre os anos 50 e 90 torna compreensível tal fenômeno. A estabilização da economia a partir do Plano Real permitiu, por exemplo, que questões como a da regulação e da defesa da concorrência ganhassem importância.
É ilustrativo a esse respeito o debate em torno das agências reguladoras. É inegável que o Estado tem um importante papel a cumprir em setores de base. O aumento do investimento público constitui uma das condições essenciais para evitar o apagão geral da infra-estrutura.
Porém a ação estatal apenas será eficaz se a arquitetura institucional for adequada para reduzir a insegurança jurídica. Infelizmente, o enfraquecimento das agências reguladoras federais aponta na direção oposta àquela que seria necessária para reduzir a incerteza e estimular o investimento produtivo.


Hoje, termino período de quase sete anos de colaboração semanal nesta coluna (passou rápido, mas daria para ler com folga a "Montanha Mágica", de Thomas Mann). A partir de segunda, passo a me dedicar a novos desafios na administração pública indireta. Houve uma única interrupção, quando, por conta de um desses excessos de "workaholismo", fui parar no hospital.
Recebi muitas mensagens contendo críticas e sugestões aos artigos. Essa interação é a melhor parte do trabalho do colunista. Uma seleção revisada dos artigos já deveria estar no prelo para virar um livro (ou dois). É uma retribuição modestíssima pelo privilégio deste encontro semanal com os leitores da Folha.

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