O Estado de S. Paulo |
16/1/2007 |
A tese da proporcionalidade da ocupação dos cargos na Câmara dos Deputados, invocada como justificativa para a negociação interna das candidaturas, não é uma obrigação constitucional, mas também não é uma norma tão frouxa que imponha aos partidos a necessidade de barganhar apoios para ter assegurado o direito de participar das atividades legislativas, um lugar à Mesa Diretora ou as presidências de comissões permanentes. Isso quer dizer o seguinte: não há infração institucional na apresentação de candidaturas fora do critério da proporcionalidade e também não há o imperativo da negociação. Portanto, os partidos negociam os cargos entre si por conveniência e não por respeito à legalidade, como alegam. A Constituição nada registra sobre o tema, apenas fixa em 1º de fevereiro a data para a escolha do novo comando e veda a recondução para os mesmos cargos na mesma legislatura. Só podem ser escolhidos os mesmos dirigentes quando houver no interregno a eleição popular. O regimento interno, que dá as normas para o funcionamento da Casa, diz sobre a eleição: “Na composição da Mesa será assegurada, tanto quanto possível, a representação proporcional dos partidos, ou blocos parlamentares, que participem da Câmara, os quais escolherão os respectivos candidatos aos cargos que, de acordo com o mesmo princípio, lhes caiba prover, sem prejuízo de candidaturas avulsas oriundas das mesmas bancadas”, observado o estatuto de cada agremiação. Se o regimento garante por si só a proporcionalidade na composição do comando da Câmara – ainda assim, “tanto quanto possível” – e autoriza a existência de candidaturas avulsas, os partidos não estão obrigados a emprestar seus apoios aos candidatos das maiores legendas para ter acesso à Mesa. Ainda mais que cada cargo tem uma eleição específica. Depois de contados os votos e eleito o presidente da Câmara, os outros integrantes da Mesa são votados individualmente. A regra, se levada ao pé da letra, faz do argumento do líder do PSDB, deputado Jutahy Magalhães Júnior, para apoiar o candidato do PT, Arlindo Chinaglia, um sofisma. Segundo ele, o critério da proporcionalidade não deixa aos tucanos outra opção senão a de se definir por uma das duas candidaturas já postas. Como o maior partido, o PMDB, abriu mão da primazia de concorrer à presidência, o PSDB não teria, na visão dele, outra escolha institucionalmente perfeita a não ser a de apoiar o PT. Pela norma escrita, teria sim. Se o funcionamento da Câmara fosse regido pela norma estrita e valesse a impessoalidade recomendada – aí, sim, pela Constituição – a todos os ocupantes de funções públicas, o PSDB já teria sem barganhar coisa alguma, direito a ocupar a primeira vice-presidência, o PMDB a secretaria-geral e assim por diante os outros postos seriam destinados às demais bancadas. O regimento determina inclusive que pode participar da Mesa um representante de partido pequeno, “ainda que pela proporcionalidade não lhe caiba lugar”. Se não é a regra o que vale, prevalece a negociata. Portanto, se o PSDB achou por bem anunciar um apoio baseado num sofisma, lícito concluir que o fez por iniciativa própria, movido por necessidades internas impostas ou por circunstâncias externas que nada tem a ver com o estrito funcionamento do Poder Legislativo nacional. Daí, fazer todo o sentido a desconfiança de que Jutahy Magalhães Júnior não conta toda a verdade quando nega que a pressa do PSDB em se definir, fazê-lo baseado em consulta telefônica e tomar por “ampla maioria” o apoio de 34 dos 63 deputados da bancada, seja decorrente de uma negociação de interesse dos governadores de São Paulo (em troca do apoio do PT a um presidente da Assembléia Legislativa do PSDB), de Minas Gerais (em troca da vice-presidência para um deputado ligado a Aécio Neves) e do próprio líder (em troca da indicação do presidente da Assembléia da Bahia, estado de Jutahy). De mais a mais, a invocação do respeito a princípios de civilidade, boa convivência e naturalidade institucional seria aceitável e até desejável, se o Parlamento brasileiro estivesse vivendo tempos de normalidade e de respeito àqueles mesmos princípios em relação aos cidadãos que elegem seus integrantes. Como não está, configura-se uma situação de emergência e urgência na confrontação do status quo, que é exatamente a via pela qual se pode ter alguma expectativa de que o Congresso Nacional seja digno da denominação de representante da vontade e das demandas do País. Da mesma forma como governos não podem cobrar da oposição a responsabilidade de governar, pois não foi eleita para isso, a oposição tampouco pode perder de vista a sua função de fiscalizar e, no que esteja ao seu alcance, transformar. A eleição de um presidente da Câmara compromissado com as transformações necessárias de forma alguma pode ser interpretada como uma burla à lei. Ainda mais quando essa mesma lei abre espaço para a ação diferenciada. É uma questão de escolha entre restabelecer a moralidade e locupletarem-se todos. |
Entrevista:O Estado inteligente
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terça-feira, janeiro 16, 2007
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