Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, janeiro 16, 2007

Clóvis Rossi - Sonhar e pensar pequeno



Folha de S. Paulo
16/1/2007

No livro "Projeto de Brasil, opções de país; opções de desenvolvimento", escreve João Paulo dos Reis Velloso, ex-ministro do Planejamento durante parte do regime militar: "O Brasil, hoje, se contenta com pouco. Mas, por trás, há uma crise de auto-estima. O brasileiro tem pena de si mesmo, e se afasta da política -o que é um boomerang".
Pode-se concordar ou não com as duas últimas frases, mas a primeira parece-me indiscutível. Só não estou certo de que se aplique o "hoje". Suspeito que o brasileiro sempre tenha se contentado com pouco.
Prova-o o fato de que a colossal desigualdade social, das maiores do mundo, se arrasta há séculos, entra governo, sai governo, entra ditadura, sai ditadura, entram os civis, saem os militares, sem que tenha havido qualquer tipo de revolta.
Quantas vezes se ouve da mãe que vê o filho morrendo de doença trivial a frase "Deus qué"? Deus não quer, não, senhora. Quem permite a perenização dessa miséria são os homens, especialmente os homens públicos de sucessivas gerações -e bota sucessivas nisso.
O dramático é que esse tipo de conformismo está se alastrando para a classe média, a julgar pelo depoimento de Contardo Calligaris em seu mais recente artigo para esta Folha, publicado no dia 11.
Escreve esse notável especialista: "Ao longo de 30 anos de clínica, encontrei várias gerações de adolescentes (a maioria, mas não todos, de classe média) e, se tivesse que comparar os jovens de hoje com os de dez ou 20 anos atrás, resumiria assim: eles sonham pequeno".
É doloroso verificar que dois estudiosos de áreas completamente diferentes, como Velloso e Calligaris, sem que tenham se encontrado ou debatido o assunto, ponham no papel uma avaliação que é rigorosamente a mesma.
O que é feito do "seja razoável, peça o impossível" que embalou os sonhos da minha geração?

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