Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, janeiro 23, 2007

Dora Kramer - Pacote interditado




O Estado de S. Paulo
23/1/2007

À primeira vista, o que se depreende do Programa de Aceleração do Crescimento anunciado ontem é que se trata de uma mistura de expectativas - numa espécie de bumbo que o governo bate para animar o ambiente - com ordenamento de projetos já existentes e obras em andamento.
De qualquer forma, não pode ser desprezado nem ignorado como iniciativa de governo. É sempre auspicioso ver o presidente da República e sua equipe empenhados na administração do País, em lugar de passarem o tempo - como ocorreu nos primeiros quatro anos - produzindo discursos ou, pior, ocupados ora em se defender, ora em se esconder de denúncias de corrupção.
Se as medidas são exeqüíveis, se sairão do papel ou se o pacote é apenas um jeito de o governo manter acesa a chama da esperança nacional na perspectiva de que o Brasil comece a andar para a frente, dentro de algum tempo saberemos.
Mas um fato é objetivo: não se pode mais dizer que o único interesse do presidente da República em relação ao Congresso é o de manter o apoio dos partidos em geral, e dos presidentes das duas Casas em particular, só com o objetivo de conter a oposição, controlar prováveis comissões de inquérito e principalmente impedir a tramitação de eventuais pedidos de impedimento do presidente por reais ou eleitoralmente produzidos crimes de responsabilidade.
São sete medidas provisórias, três projetos de lei e dois projetos de lei complementar que dependerão de uma articulada e organizada base parlamentar, além de uma interlocução permanente e civilizada com a oposição.
As MPs, a despeito de seu efeito imediato, têm a característica de paralisar a pauta do Legislativo e, por isso, carecem, como os projetos, de negociação para serem aprovadas.
A tarefa é grande, complicada e por enquanto não há sinais de que o novo modelo de articulação política inaugurado logo após a reeleição do presidente Luiz Inácio da Silva - quando ele avocou para si a missão de fazer a interlocução com o Congresso, por intermédio do conselho político formado pelos presidentes de seus oito partidos aliados - esteja à altura dela.
A nova sistemática, por exemplo, não foi eficiente na organização dos parceiros governamentais em torno da disputa pela presidência da Câmara. O cálculo inicial de que o mais útil para o governo seria ter mesmo dois candidatos ocupando todos os espaços e garantindo a vitória em qualquer hipótese parece não ter se revelado muito eficaz.
O presidente Lula parece ter sentido o peso da decisão e ontem pediu a seus aliados que, passada a eleição do presidente, tratem de aplacar as diferenças decorrentes do embate em atenção à necessidade de aprovar o pacote.
Mas as coisas não são tão simples assim. Uma luta eleitoral, para usar um lugar comum, é como uma CPI: só se sabe como começa, a evolução dos acontecimentos é imprevisível e pode resultar em abertura de feridas incuráveis.
Além disso, há as seqüelas de uma outra manobra pretensamente esperta, mas que pode produzir o efeito da paralisação na tramitação do PAC: o adiamento da formação do ministério do segundo mandato.
Tida inicialmente como hábil até pela oposição, a jogada pode se revelar contraproducente. Tinha o objetivo de não produzir insatisfações desnecessárias, capazes de prejudicar a eleição dos candidatos governistas para as presidências da Câmara e do Senado.
Agora, se não for feita com rapidez, tem tudo para manter o pacote interditado até o atendimento das expectativas por cargos por parte dos partidos aliados. Além disso, contaminará uma questão de Estado com a lógica e os anseios do fisiologismo.
Talvez o governo conte - com excesso de otimismo, diga-se - com a hipótese de aproveitar a baixa credibilidade do Congresso para obrigá-lo a ceder a custo zero para não ser acusado de atrapalhar o crescimento do País.
Ora, para um colegiado que considera normal instituir por ato autocrático das Mesas um aumento de 91% nos próprios subsídios e não vê, a não ser por pressão, necessidade de dar satisfações à sociedade e trata a disputa pela presidência como uma “questão interna”, o que vale mais: a imagem ou os cargos?
A resposta não requer prática nem tampouco habilidade no conhecimento das prioridades de suas excelências.

“Teje”

O insistente uso de preposição depois do verbo “implicar” - transitivo direto - não foi dos mais chocantes (por consagrado) erros de português cometidos pelos ministros Guido Mantega e Dilma Rousseff ontem, durante a apresentação do Programa de Aceleração do Crescimento.
Muito pior que afirmar que alguma coisa implica “em” é flexionar o verbo “ter” na primeira pessoa do plural do presente do subjuntivo como “tenhemos” - com ênfase e vagar, sem caracterizar tropeço acidental de linguagem -, como fez o ministro da Fazenda, ou acentuar a palavra “contorno” no plural, ao molde da pronúncia adotada pela ministra-chefe da Casa Civil.
Ela repetiu três vezes “contornos”; na quarta, corrigiu-se.

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