editorial |
O Estado de S. Paulo |
18/1/2007 |
Só podem pertencer ao Mercosul países que adotem o regime democrático. Mas a cláusula democrática do Mercosul é matreiramente vaga. Não define o que é democracia e muito menos lista as infrações à ordem democrática que motivariam a expulsão do infrator da comunidade regional de nações. Dá-se por barato, então, que um país democrático é aquele que realiza eleições periódicas, livres e limpas - e isso basta. Ora, nessa fôrma entra qualquer pé. A Venezuela tornou-se membro pleno do Mercosul, em agosto do ano passado, quando o presidente Hugo Chávez já havia acabado com todos os vestígios de democracia no país, exceto a realização rotineira de eleições. Na Bolívia, que na reunião de cúpula que se inicia hoje no Rio de Janeiro deve tornar-se membro pleno do Mercosul, as duas últimas eleições - a que elegeu Evo Morales e a que compôs a Assembléia Constituinte - foram livres e limpas, como atestaram a OEA, a União Européia e o Centro Carter. Mas a Bolívia, assim como a Venezuela, não é uma democracia. Nos dois países houve eleições, mas faltam outros requisitos básicos. Na Venezuela, todos os poderes estão englobados nas mãos do coronel Hugo Chávez, que agora quer a institucionalização da presidência vitalícia. Na Bolívia, o Poder Judiciário acaba de sofrer golpe mortal com a criação dos tribunais comunitários, o Legislativo está inoperante e o funcionamento da Assembléia Constituinte depende do que decidir o presidente Evo Morales. Esta semana, o governador de Cochabamba, da oposição, foi obrigado a se refugiar em Santa Cruz e o governador de La Paz recebeu um ultimato para acabar com suas veleidades oposicionistas. Os 'movimentos sociais' controlados por Morales estão se incumbindo de extirpar qualquer vestígio de democracia no país, no berro e na marra. Pois é a entrada desta Bolívia no Mercosul, como membro pleno, que o governo brasileiro está apadrinhando. Passemos ao largo da cláusula democrática. Argumenta o chanceler Celso Amorim que 'a Bolívia é um país pobre e o Brasil não tem interesse em tirar vantagem (disso). O que nos interessa é a estabilidade da Bolívia'. Ora, o Mercosul não é uma entidade beneficente. É um organismo de coordenação política e comercial, fundado em regras bem definidas. Está estruturado como união aduaneira, isto é, os seus membros têm um regime tarifário comum, que é aplicado no comércio com países de fora da região. Mas o regime tarifário da Bolívia não é o do Mercosul - é o da Comunidade Andina, muito diferente e do qual Evo Morales não está disposto a abrir mão. Sendo assim, dispõe-se o Brasil a aceitar que a Bolívia entre no grupo com um regime diferenciado. Isso significa, em termos práticos, que a união aduaneira, que já era um queijo suíço e agonizava, estará morta e sepultada com o ingresso da Bolívia. Mas esse é, a rigor, um problema menor. O mais grave é que, com a entrada da Bolívia, depois do ingresso da Venezuela, o Mercosul passará a ser um bloco de tendências heterogêneas e conflitantes entre si. Os quatro países originais do grupo - Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai - têm compromissos cada vez maiores e mais consistentes com a economia de mercado. Já os dois novatos estão promovendo extravagantes experiências de socialização dos meios de produção. Não há, na história dos processos de integração, exemplo bem-sucedido de mistura de modelos. Na União Européia, há governos socialistas, social-democratas e conservadores, mas a convivência harmônica entre eles deve-se a um fator comum: todos estão comprometidos com a economia de mercado. Sem essa unidade de compromisso não pode haver unidade de ação. Como poderá o Mercosul, integrado por dois países cujos governos fazem do combate ao capitalismo um dogma, negociar com outros países ou grupos acordos complexos que envolvem, além de questões comerciais, investimentos e serviços? E, sendo uma mixórdia política e ideológica, como o Mercosul poderá se apresentar como uma unidade política - ou ser levado a sério - nas negociações globais? O ingresso da Bolívia como membro pleno, assim como aconteceu com o da Venezuela, não amplia nem fortalece o Mercosul. Condenando-o irremediavelmente, se não à morte, à irrelevância. |
Entrevista:O Estado inteligente
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quinta-feira, janeiro 18, 2007
A condenação do Mercosul
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