Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, janeiro 10, 2007

Clóvis Rossi - Quem late morde



Folha de S. Paulo
10/1/2007

Ao apresentar estudo sobre a Venezuela para o Council on Foreign Relations, há pouco, o jornalista Richard Lapper, editor de América Latina do "Financial Times", definia o presidente Hugo Chávez como quem, até então, latia, mas não mordia.
Alusão, como é óbvio, ao fato de que a retórica incendiária e até revolucionária de Chávez não era acompanhada de uma administração igualmente revolucionária.
Agora, Chávez morde. Não, a mordida não está dada pelo tal "socialismo do século 21", embora seja essa expressão a que causará mais faniquitos nos setores hoje ideologicamente dominantes.
Não me assusta por dois motivos:
1 - Não sei do que se trata, mas, se é do século 21, deve ser diferente do fracasso que foi o do século 20 (o único socialismo real conhecido);
2 - O capitalismo adotado na Venezuela no século 20 foi também um baita fracasso, tanto social como econômico e ético. Só por isso surgiu um Chávez e, por extensão, o "socialismo do século 21".
A mordida grave, portanto, não está dada, acho, por estatizar ou não a energia e a telefonia. O grave é morder a democracia.
Neste capítulo, as mordidas são várias. A saber: a não-renovação da concessão a um canal de TV (que foi, sim, golpista, mas é algo que, na democracia, se resolve ou na Justiça ou no controle remoto à mão de cada espectador); a nomeação para vice-presidente de um funcionário da Justiça Eleitoral logo depois de uma eleição em que, como todas, houve queixas e dúvidas sobre a legalidade e/ou legitimidade de certos atos, ainda que a vitória de Chávez tenha sido incontestável; o projeto de reeleição eterna, que está mais para Stroessner/Somoza do que para "socialismo do século 21".
O governo Lula, que engoliu todos os "latidos" de Chávez, vai engolir também as "mordidas"?

Arquivo do blog