Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, janeiro 02, 2007

Celso Ming - Tudo OK na nave global



O Estado de S. Paulo
2/1/2007

Não basta contentar-se com o bom estado do camarote. É preciso conferir o comportamento de todo o navio. E o que dá para dizer é que, se o navio é a economia mundial, a economia brasileira não tem do que se queixar.

A todo o momento, o mercado financeiro mundial está sujeito a solavancos que refletem insegurança sobre o futuro da economia global. Administradores de carteiras de ativos, por exemplo, estão sempre prontos a defender suas posições. Foram treinados para que, a qualquer instante, sejam capazes de farejar perigos como o da desvalorização do dólar diante das outras moedas fortes ou de eventual alta brusca dos juros nos países ricos que cause impacto sobre seus ativos. É só rastrear essas inseguranças e conferir o que pode acontecer.

Em princípio, três são os riscos que vêm mantendo os analistas internacionais em estado de alerta. O primeiro é o de que os Estados Unidos não consigam administrar adequadamente seus enormes rombos: o déficit externo (déficit em conta corrente), de aproximadamente US$ 840 bilhões neste ano; e o déficit orçamentário, da ordem de US$ 250 bilhões por ano. Na falta de ajuste, o dólar tenderia a desvalorizar-se diante das outras moedas fortes e é preciso saber em que proporção e em que velocidade isso poderia acontecer.

O segundo risco é o de que a alta dos preços do petróleo e das commodities mais a eventual desvalorização do dólar produzam mais inflação. E, nessas condições, os bancos centrais dos países ricos não terão outra opção que não a de puxar pelos juros, situação que provocaria uma debandada de aplicações hoje mais voltadas ao risco para os treasuries (títulos dos países ricos).

E o terceiro risco, relacionado com os dois anteriores, é o de que o ajuste da economia mundial desemboque em recessão. Os pessimistas continuam temendo o hard landing, ou pouso desastrado da economia americana. Seria um cenário de retranca, redução de exportações, desemprego e perda de renda.

Mas a probabilidade de que, ao longo de 2007, ocorram turbulências graves nessas três faixas parece baixa. O atual equilíbrio global baseado em déficits dos países ricos e superávits dos países emergentes não é sustentável a longo prazo. E, como dizem os tautologistas, o que não é sustentável um dia não se sustenta.No entanto, a percepção prevalecente é a de que esse ajuste pode e será feito suave e lentamente.

O Fundo Monetário Internacional, o organismo oficial que está em melhores condições para avaliar o que se passa pelo mundo, prevê um crescimento econômico global de 4,9% em 2007, apenas um pouco mais baixo do que os 5,1% projetados para este ano. Isso significa que a tendência é de leve desaceleração, e não de recessão braba.

Também parece improvável que os bancos centrais bombem uma forte alta dos juros. Ao contrário, 2006 tem tudo para ter sido o auge do aperto monetário nos países ricos. Talvez ainda aconteça uma pequena alta dos juros básicos, mas nada que prenuncie um tranco.

Não apareceu nas telas dos radares algo capaz de espantar a abundância de recursos existentes nos mercados. E dinheiro farto é garantia de que haja não só cobertura para as necessidades brasileiras de financiamento em moeda estrangeira, mas também de bom fluxo de investimentos fixos.

Uma das incertezas com que os analistas estão tendo de lidar está relacionada ao comportamento dos preços das commodities, especialmente do petróleo.

Se a economia mundial continuar crescendo acima dos 4,5% ao ano, nível para o qual apontam as projeções, não há como impedir aumento proporcional da procura por petróleo e pelas commodities metálicas.

O momento é, também, de alta das commodities alimentícias, especialmente de proteína vegetal (milho, soja, trigo e sorgo), não só porque o fim da gripe aviária e o controle da doença da vaca louca aumentaram o consumo de rações animais, mas também porque cada vez mais grãos (como milho e soja) estão sendo desviados para produção de bioenergéticos (álcool e biodiesel).

Isso sugere que, sustentados pela demanda asiática e pela pequena desaceleração da economia dos países ricos, é baixa a probabilidade de queda acentuada nos preços das commodities. A tendência é a de que, embora não voltem a subir, continuem altos. E isso garante boa receita com exportações de commodities e de produtos intermediários.

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