Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, agosto 09, 2006

Míriam Leitão - Palavra errada


Panorama Econômico
O Globo
9/8/2006

O candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, usou, na entrevista ao “Jornal Nacional”, a palavra “guerrilha” para se referir aos ataques dos criminosos em São Paulo. Errou no termo. Depois falou em terrorismo, mas inicialmente usou a palavra que em geral está ligada à violência com ideologia, causa e propósito. Os bandidos que atacam os cidadãos em São Paulo são criminosos sem causa, nem qualquer atenuante.

O candidato do PDT, Cristovam Buarque, definiu o que acontece no Brasil como “guerra civil”. Isso ocorre quando uma parte do país entra em confronto armado com outra parte do país. A guerra civil divide os povos, divide o país. No caso do Brasil, o que existem são criminosos que não têm seguidores, nem partidários; têm cúmplices. Aterrorizam a população cada vez que o PCC é contrariado com a transferência de presos ou a suspensão de folgas, ou o aperto das condições carcerárias.

No combate às gangues de criminosos, o Brasil está numa situação muito grave, porque as autoridades não conseguem sequer fazer o diagnóstico do problema, quanto mais apresentar a solução.

Guerrilhas têm um quê de legitimidade. Fizeram guerrilha os vietcongues que combateram a invasão americana no Vietnã. Foram guerrilhas que, na América Latina, abrigaram os mais extremados opositores dos regimes militares. Naquela época, os militares evitavam usar essa palavra: preferiam, nas declarações públicas, falar em terroristas, mesmo quando era para se referir a um grupo de jovens estudantes fazendo inofensivas pichações. O candidato tucano deveria evitar a palavra que dá um status aos bandidos que eles não têm.

O sociólogo Gláucio Soares, que acaba de lançar o blog Conjuntura Criminal (www.conjunturacriminal.blogspot.com), registrou que a simultaneidade dos ataques do PCC nessa segunda-feira mostra que houve planejamento. E diz que os dados mostram que de 7% a 8% dos que saem em indultos ou saídas temporárias não voltam. Ou seja, tinha razão o Ministério Público em tentar vetar o indulto. Devem sair dez mil presos. Isso significa que, se a média for mantida, de 700 a 800 não voltarão. Em 2003, 782 não voltaram.

Soares, um dos mais competentes estudiosos do assunto no Brasil, expõe no blog os dados que comprovam que houve, de fato, queda do número de homicídios em São Paulo. O sociólogo compara cada um dos últimos anos com 2002 para mostrar que, em 2003, morreram 901 pessoas a menos do que no ano anterior; em 2004, nova queda, de 2.920 homicídios; e, no ano passado, nova queda em comparação com 2002, que representou 4.578 vidas poupadas. Ao todo, deixaram de morrer vítimas de crime 8.399 pessoas. Mesmo assim, o gráfico que mostra ano a ano em seu site exibe uma alta, que contraria a tendência, nos últimos meses.

Quando passarem as paixões eleitorais, será possível avaliar com calma os erros e acertos cometidos pelas autoridades paulistas. O estado tem algumas boas batalhas vencidas, mas está perdendo a guerra, quando cidadãos temem sair de casa para ir trabalhar pelo risco de serem alvos aleatórios de criminosos. Qualquer um pode ser vítima, já que o que eles querem é demonstrar força, exibir organização e capacidade de planejamento. Como uma política que acertou em reduzir o número de homicídios pode parecer tão refém do crime como acontece em São Paulo? Por enquanto, o debate eleitoral vai tratar tudo com uma dicotomia burra entre os candidatos.

Algumas coisas ficaram claras: os governos do PSDB e do PT cometeram o mesmo erro de não se envolver diretamente com o problema. O presidente Lula, durante a campanha de 2002, prometeu mudar isso e não o fez; a população, em todas as pesquisas, elege a violência como o principal problema, o que mostra sua preocupação; independentemente de as estatísticas mostrarem melhoras localizadas, a sensação de insegurança aumentou muito nos últimos tempos, principalmente em São Paulo.

México: situação piorou para Obrador

O Tribunal Eleitoral do México decidiu por unanimidade rejeitar o pedido de López Obrador, o candidato de esquerda derrotado, de recontagem total dos votos. Disse que não houve indício de fraude e que as eleições respeitaram os princípios de “correção, legalidade, independência, imparcialidade e objetividade estabelecidos na Constituição”.

O México vai piorar um pouco mais antes de melhorar, pensa o cientista político Octávio Amorim Netto. Só no fim do mês será anunciado oficialmente o vencedor, provavelmente Felipe Calderón, do PAN. Mas, incentivados por seu líder, os partidários do PRD continuam fazendo manifestações. Um grupo expressivo de intelectuais do México assinou um manifesto reconhecendo como limpas as eleições presidenciais. Foram acusados pelos líderes do PRD de terem vendido sua opinião. O país está entrando em uma rota cada vez maior de polarização.

O vencedor governará um país dividido em três e precisará fazer uma coalizão para governar. O problema é como armar essa coalizão. Uma união do PAN com o PRD é impossível, pelo conflito atual. Uma união do PAN com o PRI será ruim por dois motivos: o PRI sempre foi acusado de fraude eleitoral durante seu longo reinado, e ele é justamente o partido do qual todos querem se distanciar, por representar o passado que se quer vencer. 

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