Panorama Econômico |
O Globo |
3/8/2006 |
O inverno só chegou mesmo esta semana, quando as lojas já estão lançando suas coleções de verão. Mas este ano os comerciantes não estão reclamando da falta de inverno e de encalhe nos estoques. Ainda no setor têxtil, do lado das fábricas, elas começam a se estruturar para tentar vencer a briga contra a invasão chinesa. Só este ano, as importações de vestuário vindas da China já aumentaram 60%. As exportações de vestuário estão caindo 30% em volume este ano. As importações aumentam 45,6%. A causa disso, aponta o Sindicato da Indústria Têxtil, está sobretudo no câmbio e na informalidade. Dificuldades não são novidade para o setor. Na década de 90, por conta da entrada de produtos importados, os empresários de têxteis tiveram que se reorganizar para manter mercados e reverter as quedas brutais na produção e venda. Para resolver a situação, modernizaram-se. Agora enfrentam o desafio chinês que, além de tudo, conta com um câmbio controlado pelo Estado. Para tentar manter a competição um pouco mais equilibrada, os governos de China e Brasil fizeram acordos, entre eles, um de "sinergia estatística" entre as aduanas. Apareceram números suspeitos: enquanto a China registrou saída de 39 mil toneladas de têxteis, ao Brasil só chegaram 19 mil toneladas. — Para dar esta diferença, estes produtos entraram aqui de alguma outra forma, afinal não tenho notícia de nenhum navio afundado — brinca o presidente do Sinditêxtil/SP, Rafael Servone Netto. O truque utilizado é o subfaturamento. O produto entra no país como se tivesse custado muito menos, às vezes menos até que a sua matéria-prima. Com informalidade e câmbio jogando contra, a saída tem sido, novamente, buscar a modernização. — Estamos montando pólos têxteis, como o na região de Americana, Santa Bárbara d'Oeste (SP). A região produzia tecidos sintéticos, então sofreu muito com a entrada da China. Faremos uma cadeia que vai se integrar desde a fábrica até a confecção. Quando um estilista desenhar um modelo, ele já terá o tecido para a roupa ser executada no menor tempo possível. Um exemplo disso é a Zara, que lança, em média, um novo produto a cada 10 minutos — conta Rafael. A produção da indústria têxtil nacional caiu 5% este ano, mas o número pode piorar pois as exportações devem cair mais agora, já que no primeiro semestre ainda havia muitos contratos a serem cumpridos. — Nossos grandes concorrentes, China, Índia, Turquia, Paquistão e Vietnã, estão crescendo em torno de 10%. Nos próximos 12 meses, os empresários brasileiros estão pretendendo investir US$ 500 milhões em plantas no exterior. Coteminas, Santista e Vicunha farão investimentos na América Central, por causa dos acordos da região com os Estados Unidos — diz o presidente do Sinditêxtil. Se, por um lado, as fábricas e confecções vão tentando se equilibrar fazendo acordos e se modernizando; os preços mais baixos têm ajudado o varejo, que pode importar tecidos e peças da China. O dado divulgado ontem pela Fecomércio-SP mostra que, no primeiro semestre, vestuário, tecidos e calçados cresceram 13%. Este ano, finalmente, as lojas deixaram de ver no inverno a salvação da lavoura. Sem um "bom" inverno há três anos, muitas grifes optaram por reduzir o tamanho da coleção para não ficar com estoque encalhado. Nesta primeira semana de agosto, algumas lojas, como a de moda feminina Cantão, já estão lançando a coleção de verão: — Fizemos uma coleção menor; conseguimos escoar toda a produção. Estamos bastante satisfeitos — diz Rosana Figueiredo, gerente de marketing da Cantão. Mônica Nabuco, dona da K&T, também de moda feminina, conta que a solução para vender no inverno brasileiro tem sido, além da coleção menor, optar por tecidos que pareçam de inverno, mas que não esquentem tanto. Apesar de reconhecer até qualidade nos tecidos chineses, ainda não se rendeu à tentação desses preços baixos. — Os preços são tão baixos que o produto perderia exclusividade — diz ela. A facilidade de crédito também está ajudando muito o varejo, principalmente os grandes magazines de vestuário, como Lojas Renner, C&A, Leader Magazine. — As lojas de departamento cresceram 3,6% no primeiro semestre. Elas hoje oferecem mais qualidade, concentram todo tipo de produto, com a facilidade do crédito próprio — comenta João Gomes, economista da Fecomércio-RJ. A Lojas Renner, uma das maiores, com 72 pontos de venda e há um ano no Novo Mercado da Bovespa, anunciou esta semana um crescimento de 27,6% na sua receita líquida. A média por compra (tíquete médio) saiu dos R$ 92,86 para R$ 100,13. O crédito, sem dúvida, é o que tem garantido o seu resultado; mais de 70% das vendas são feitos com o cartão. Para se ter uma idéia: no primeiro semestre, 653 mil novos cartões da Renner foram emitidos, totalizando 9,4 milhões. Até o fim do ano, eles devem inaugurar mais sete lojas. — Atualmente até as classes A e B estão comprando nestas lojas de departamento, sem falar nas classes C e D e mesmo E, que está chegando — afirma João Gomes. |
Entrevista:O Estado inteligente
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