Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, agosto 04, 2006

Enganando a classe média (Por Lucia Hippolito)


Os estrategistas da campanha pela reeleição do presidente já chegaram à conclusão de que Lula está sem discurso para a classe média e sem discurso para a questão ética.

 

Também já chegaram à conclusão de que Lula está muitíssimo bem no Nordeste, bem no Norte, mais ou menos no Centro-Oeste. E vai mal no Sul e no Sudeste. Lula vai mal também entre a classe média e entre os portadores de diploma universitário.

 

Resumindo, o presidente vai mal nos maiores colégios eleitorais do país e entre o eleitorado mais bem informado. O eleitorado que está indignado com a corrupção, com a roubalheira, com a postura do presidente-candidato ("não sei", "não fiz", "não vi"), com a impunidade dos políticos, com o desprezo da classe política pela opinião da sociedade brasileira.

 

O que fazer para recapturar o voto dessa classe média que, em 2002, foi responsável pela eleição de Lula?

 

Propor uma Constituinte! Que idéia genial! Mas não uma Constituinte ampla, isto não, porque pode suprimir alguns direitos tão caros às várias corporações. Uma Constituinte feita por deputados e senadores normalmente eleitos? Não, porque a classe média não confia mais nos políticos.

 

A proposta, que pode soar como música nos ouvidos de uma sociedade cansada de roubalheira e de impunidade, é a de uma Constituinte exclusiva, especificamente para realizar a reforma política. Bingo! Bem no coração da classe média!

 

Em entrevista à Rádio CBN, o dr. Dalmo de Abreu Dallari, jurista dos mais respeitados, foi sintético e certeiro: "É golpe." Em entrevista ao Globo, o ex-ministro Célio Borja, outro respeitado jurista, foi igualmente sintético e certeiro: "É um engodo. Uma idéia infeliz."

 

É o caso de se perguntar: por que apenas a reforma política? Que tal introduzir também a reforma tributária? É complicada, difícil, os governadores não se entendem. E a reforma trabalhista? Ah, as centrais sindicais não estão de acordo. E a extinção das Medidas Provisórias? Aí já é demais! Como o Executivo brasileiro vai viver sem o conforto das MPs?

 

Quer dizer, então, que a resposta para a inação do Congresso, para a inapetência do governo de fazer uma articulação política minimamente decente será sempre uma Constituinte?!

 

A reforma política não foi realizada porque não houve empenho, porque os caciques preferem deixar tudo como está, porque o Executivo não se interessou. O Poder Executivo é tão poderoso no Brasil, que tudo o que ele deseja acontece.

 

A proposta, segundo dizem, foi aceita com entusiasmo por juristas que compareceram a um encontro com o presidente Lula no Planalto. Houve até um ex-presidente da OAB que declarou que os futuros constituintes não deveriam ser apenas aqueles eleitos através dos partidos políticos, mas "pessoas representativas da sociedade". Será que sua Senhoria já está tentando descolar um empreguinho de constituinte?

 

Não é porque estamos nos despedindo (ainda bem!) da pior legislatura de toda a história do Congresso brasileiro que vamos abolir a democracia representativa baseada em partidos.

 

Condenar todos os políticos como se fossem portadores de todos os vícios é atitude excludente, mesquinha e fascista, comparável a condenar toda a OAB porque alguns advogados transformaram-se em comparsas e pombos-correio de traficantes e do crime organizado.

 

Uma democracia representativa digna do nome não existe sem partidos e sem políticos. Se não gostamos dos atuais, vamos eleger outros. Já houve outros períodos na História do Brasil em que o fosso entre representados e representantes alargou-se excessivamente. Periodicamente, os militares se arvoravam em defensores dos interesses da sociedade e tentavam preencher este fosso. Deu no que deu.

 

Hoje, não há mais o menor perigo de golpe militar. Mas os eleitores indignados com os políticos precisam ficar atentos, porque podem estar servindo de massa de manobra para um golpe dado por civis.

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