Entrevista:O Estado inteligente

domingo, agosto 06, 2006

Elio Gaspari Bom exemplo- Jornal O Globo


   
Hoje o PSDB apresenta a primeira prestação de contas da campanha de Geraldo Alckmin. De acordo com a lei, deverá mostrar os livros de novo no dia 6 de setembro. Se depender do professor Miguel Reale Jr., fiador moral das contas tucanas, haverá outra prestação de contas pública antes da eleição de 1 de outubro.

O tucanato tem quatro funcionários trabalhando em tempo integral na contabilidade das doações e das despesas. Já houve um caso de magano oferecendo-se para regar o caixa dois. Rebarbado, pingou uma doação limpa, porém menor. Teria sido um teste?

Empresário gosta de caixa dois. Nos anos 80, um grande empreiteiro recebeu um pedido vindo de um campeão da moralidade. Disse que só entregava a mala pessoalmente. Assim aconteceu.

Antonoi Pacclio

Tem gente que gosta de macromentiras. Antonio Palocci é um caso especial de apaixonado por micromentiras: nunca esteve na mansão dos caipiras, não viajou no avião do empresário amigo, assim como não ajudou a detonar o sigilo do caseiro Francenildo.

A última de Palocci foi dar à Justiça Eleitoral um número errado de CPF (081.532.288-70). O seu é 062.605.448-63.

Sabe-se lá o que houve, mas Palocci atribuiu-a a “um erro de digitação”. O ex-ministro tem o resto de sua vida para explicar como uma pessoa pode errar a ordem de dez em 11 algarismos de um número.

Neocastrismo

Aparecerá uma boa oportunidade de negócios para grão-companheiros que tenham boas relações com o aparelho comunista cubano. Vão se tornar consultores de empresários em projetos imobiliários na ilha.

A Constituinte é um golpe parlamentar

Aproposta de convocação de uma eleição para formar uma Assembléia Constituinte depois de outubro é golpista, dissimulada, velha e suicida. É golpista porque pretende obter de um Congresso desmoralizado uma emenda constitucional que eleja e instale uma Constituinte alavancada pelo resultado presidencial de outubro. A idéia foi endossada por Nosso Guia e pelo comissário Tarso (“Fora FHC”) Genro.

Em tese, seria uma Constituinte para fazer a reforma política. Trata-se de matéria que não precisa desse remédio e que não prosperou nos últimos anos porque o governo preferiu manter aberto o guichê pagador da corrupção política. O que se busca é a afirmação autoritária do Poder Executivo.

O governo tem hoje uma bancada sólida de 250 votos num Congresso de 594 cadeiras. Na próxima eleição o PT poderá perder pelo menos 20 de seus 81 deputados. Estimando-se que os outros partidos de mensaleiros e sanguessugas percam outras 20 cadeiras, avizinha-se um Congresso onde Lula, reeleito com pelo menos 50 milhões de votos, terá vida dura. A Constituinte será um videoteipe editado. Algo que permita mostrar Roberto Carlos tirando o passe de Zidane do caminho de Henry.

Quando Lula diz que os deputados e senadores deste Congresso não podem fazer uma reforma política porque “estão legislando em causa própria”, ofende a inteligência da escumalha: de onde virão os constituintes? Do sistema político brasileiro ou de Marte? Vedando aos eleitos de outubro o direito de concorrer à Constituinte, os çábios inventarão o poder da ponta de estoque, com uma bela bancada de refugados.

A proposta é golpista porque pretende modificar o curso das instituições nacionais. Isso já foi feito duas vezes. Em 1840 o Parlamento golpeou a Regência declarando a maioridade de Dom Pedro II aos 14 anos. Em 1961, noutro golpe, instalou-se um regime parlamentarista para mutilar os poderes de João Goulart, presidente constitucional do país.

A proposta é dissimulada porque irá além do pretexto da reforma política. Gerará uma situação parecida com a da Venezuela de Hugo Chávez, a Bolívia de Evo Morales e a Argentina das últimas reformas de Néstor Kirchner.

Ficando-se no varejo partidário, pretende-se revogar os efeitos das cláusulas de desempenho, que afastam da bolsa da Viúva os partidos sem votos. Isso e mais o voto de lista, pelo qual a patuléia não escolherá mais os deputados. Ele virão empacotados pelas cúpula$ partidária$.

A Constituinte de Nosso Guia será um fator de instabilidade política sem paralelo nas últimas décadas. Para gosto de seus mais radicais adversários, recolocará o tema da legalidade no pano verde da política nacional.

O truque da Constituinte como gazua presidencial já foi usado duas vezes. Em 1945, Getúlio Vargas empurrou com mão de gato a campanha da “Constituinte com Getúlio”. Em março de 1964, Leonel Brizola defendeu a eleição de uma Constituinte, a partir do fechamento do Congresso (coisa que Lula jamais sugeriu). Deposto, o Pai dos Pobres foi para São Borja. Exilado, Brizola foi para o Uruguai. Nos dois casos, a manobra serviu muito bem aos adversários.

Bush 2 pode pensar que é Roosevelt 1

Chama-se Colina de San Juan a maior ameaça à sanidade de George Bush no trato com a crise cubana. Na manhã de 1 de julho de 1898, um filho do patriciado americano estava diante daquela colina, de onde se vê o porto de Santiago de Cuba. Havia sido um ardoroso defensor da invasão da última colônia espanhola da América, tinha um ego do tamanho do mundo e jogou seu futuro na guerra.

Nas 12 horas seguintes o coronel Theodore Roosevelt comandou a carga de caubóis (muitos) e grã-finos de Nova York (poucos) que tomou a Colina de San Juan. Foi um daqueles feitos militares que só a valentia produz. Roosevelt tornou-se o homem mais famoso dos Estados Unidos.

Poucos meses depois elegeu-se governador de Nova York e, aos 43 anos, tornou-se presidente dos Estados Unidos. Um quadro de Frederic Remington (aquele da escultura do vaqueiro Bronco Buster, que Bush mantém em seu gabinete) imortalizou a carga de San Juan e amparou a fama de Roosevelt, apesar de ele não estar identificado na cena.

Atolado no Iraque e impopular nos Estados Unidos, Bush parece olhar para a encrenca cubana com a volúpia com que Teddy Roosevelt contemplava a Colina de San Juan. Quando ele diz que “estamos agindo ativamente em Cuba, não estamos apenas esperando a mudança”, pode-se temer o pior. Seria exagero supor que ele pretende invadir a ilha, mas é razoável acreditar que ele queira criar um protetorado, como ocorreu em Cuba no final do século XIX, como ocorre hoje no Iraque.

A decadência de Fidel dará a Bush o prêmio cobiçado por seus nove antecessores. O colapso da ditadura comunista caribenha assemelha-se à ruína da Espanha colonial do século XIX. Há mais de um século, a intervenção americana bateu a carteira da insurreição cubana. Se Bush for acometido da síndrome da Colina da San Juan, envenenará as relações dos Estados Unidos com a América Latina por mais um século.

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