Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, agosto 02, 2006

Boas-vindas ao embaixador Sobel Élio Gaspari




Folha de S. Paulo
2/8/2006

Se o doutor entrar na fila dos brasileiros, só verá Lula em setembro. Pagará R$ 260 e esperará em pé, na rua

CHEGOU A Pindorama o novo embaixador americano, Clifford Sobel. Empresário bem-sucedido, vem na cota de escolhas pessoais do presidente George Bush. O embaixador, o Itamaraty e os consulados americanos poderiam organizar um espetáculo para o cerimonial de entrega das suas credenciais ao "nosso guia". Num gesto de amizade, ele se submeteria ao ritual que seus serviços impõem aos brasileiros que desejam visitar os Estados Unidos.
Sobel triunfou na vida criando empresas e sabe a importância que o atendimento aos clientes tem para uma quitanda, uma embaixada ou uma fábrica de metralhadoras.
Sua última façanha foi dirigir uma empresa pioneira na telefonia pela internet, a Net2Phone. Meteu-se em política, concorreu a uma cadeira de senador em Nova Jersey, perdeu e levou a embaixada em Brasília como consolo.
O embaixador poderá avaliar o tratamento que seu serviço consular dá ao povo brasileiro, adaptando-se ao cerimonial servido à escumalha. Para apresentar-se ao "nosso guia", passaria pelo seguinte:
1) Sua embaixada terá que telefonar ao cerimonial do Itamaraty, pedindo que se marque um dia para a entrega de suas credenciais a Lula.
Para dar esse telefonema, deverá pagar R$ 38. Será atendido por um funcionário que escolherá o dia da sua ida ao Planalto.
2) O tempo de espera a que são submetidos os brasileiros que solicitam um visto americano em Brasília é de 32 dias. Sorte de Sobel, porque em São Paulo são 73 dias e, no Rio, 49. Em março, a espera em São Paulo era de 45 dias e no Rio, de 140.
Quando alguém reclama desses prazos, a burocracia consular americana informa que o atendimento é lento porque a demanda aumentou.
Como empresário, Sobel sabe avaliar gerentes que justificam a má qualidade do atendimento reclamando da freguesia.
Em Damasco, a demora é de um dia. Em Assunção, dois.
3) Para a entrevista com Lula, o embaixador deverá levar a carta que o presidente George Bush lhe deu, mais um boleto do Citibank, comprovando que pagou o equivalente a US$ 100. O banco não pode aceitar cheques.
4) Tudo resolvido. No início de setembro, Sobel será recebido pelo presidente. Engano. Irá para a fila do Planalto. No Rio e em São Paulo, terá direito a uma espera no meio da rua. Coisa de até uma hora. Nos últimos meses, houve uma melhora: a patuléia ganhou proteção de toldos.
Esse atendimento é produto do massacre a que foram submetidos em Washington os serviços diplomáticos americanos.
Mesmo assim, resulta de uma administração consular inepta e arrogante, que não faria a mesma coisa numa empresa privada ou com cidadãos americanos.
Para dar nomes aos bois, o recorde paulista é do doutor Christopher McMullen, o serviço de Brasília está sob a direção de Simon Henshaw, e o refresco ocorrido no Rio tem o patrocínio de Edmund Atkins.
A diplomacia americana no Brasil sempre teve altos e baixos. Em 1944, quando o presidente Franklin Roosevelt resolveu mandar um amigo para o Rio, nomeou Adolf Berle, um profeta do capitalismo moderno. Há uma lenda segundo a qual o embaixador Edwin Morgan, que ficou no cargo de 1912 a 1933, inventou a caipirinha. Em 1930, ele achava que Getúlio Vargas não tinha futuro. Morgan vivia em Petrópolis, onde foi sepultado.

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