Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, agosto 17, 2006

Bater em Lula, como? por Paulo G. M. de Moura, cientista político-

blog de Diego Casagrande
Aparentemente, instalou-se a discórdia nas hostes tucano-pefelistas. O pomo dessa discórdia, se ela existe, é a estratégia de marketing de Alckmin. O candidato tucano estreou na TV com um programa light, centrado na apresentação do candidato, suas realizações e suas idéias. Esteticamente, os programas de Lula e Alckmin foram iguais, diferindo apenas na forma de apelo ao voto dos dois candidatos.

A direção do PFL e o articulista tucanófilo Reinaldo Azevedo estrilaram. Ontem meu amigo Denis Rosenfield seguiu a mesma linha aqui. Reinaldo, inclusive, já havia reclamado da atuação de Alckmin no debate da Band TV. Reinaldo, Denis e os pefelistas acham que sem bater pesado em Lula não há como ganhar a eleição. E criticam o marqueteiro Luiz Gonzáles, temendo a derrota com essa linha light sugerida pelo primeiro programa de Alckmin na TV. Quem tem razão?

Difícil saber sem acesso a pesquisas qualitativas que revelem como o eleitor está percebendo a campanha. E - senhoras e senhores - é a opinião desses eleitores, que podem decidir o pleito, o que interessa e define quem está certo e quem está errado sobre essa questão. Reinaldo, Denis, eu, você e os pefelista já somos eleitores de Alckmin. Falo por experiência, pois já cometi o erro de supor que Fogaça deveria bater duro no PT para vencer a eleição para a prefeitura de Porto Alegre de 2004. Eu, opinando sem ver as pesquisas qualitativas do Fogaça, estava errado. E os meus amigos estrategistas de Fogaça estavam certos.

Em política, a realidade não costuma obedecer aos manuais. Existem inúmeras receitas sobre estratégias de marketing, mas, como diria José Genoino, uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. Posso estar errado, mas já tendo alguns anos de janela analisando pesquisas eleitorais e subsidiando marqueteiros, aprendi que o candidato que começa uma campanha batendo desde o primeiro programa de TV, pode até prejudicar seu adversário, mas muito dificilmente vencerá a eleição. Além disso, uma dinâmica de ataques mútuos, desencadeada desde o início da eleição, tende a contaminar o ambiente eleitoral com a virulência do debate, levando ambos os contendores a serem rejeitados pelos eleitores. Foi assim que Rigotto derrotou Tarso Genro e Antônio Britto nas eleições para o governo gaúcho de 2002: apenas surfando a rejeição que seus contendores atraíram contra si.

A configuração estrutural do tabuleiro político que se conformou no Brasil após a eleição de Lula já existe em Porto Alegre desde o início dos anos 90. Devido à força eleitoral do PT aqui, cerca de 35% dos eleitores são PT; cerca de 35% são antipetistas e os demais 30% definem a eleição conforme o lado para o qual penderem. O caminho da vitória, portanto, passa pela conquista dos eleitores de centro. Isso impõe ao candidato que pretende vencer, a necessidade de adotar um posicionamento centrista. Nesse contexto, considerando-se que o contingente de eleitores de centro está com Lula, Alckmin só vence se tirar eleitores do petista, atraindo-os para si. Não é fácil.

Qual o caminho mais eficiente para fazer isso? Bater em Lula como bate Heloisa Helena? Parece-me que não. Acho que HH está crescendo sobre eleitores antilulistas devido a sua contundência na retórica de ataque a Lula. Esse discurso tem teto e não vai além dos 35% do eleitorado, no limite. O teto efetivo de HH é menor, pois uma parte do eleitorado de oposição não quer o velho PT (atual PSOL) no poder e não vai largar Alckmin para adotá-la. É Alckmin que vai ao segundo turno e, para não se confinar no limite dos 35% do eleitorado antilulista, não pode bater em Lula da forma como querem os pefelistas, Denis Rosenfield e o nosso virtual amigo, Reinaldo Azevedo. Ninguém seduz agredindo o objeto do desejo do outro a quem se deseja conquistar. O sucesso está nas preliminares.

Isso significa que é possível vencer a eleição sem desconstruir a imagem de Lula? Não. Só Duda Mendonça acha que quem bate perde. Há casos em que é necessário bater, sim. Mas, desconstruir não é, necessariamente, sinônimo de bater. Especialmente de bater com virulência no adversário, do início ao fim da disputa.

Cesar Maia e Reinaldo Azevedo usam como exemplo de seus argumentos em prol da porrada em Lula, o caso de Lopez Obrador, no México, que derrotou o populista Calderón, batendo duro no adversário. Ambos se esquecem que no México não há segundo turno e que, com 35% dos votos elege-se um presidente naquele país. No Brasil, com 35% dos votos, ou menos, vai-se ao segundo turno. Mas, para vencer, é preciso 50% mais um voto.

Como, então, desconstruir a imagem de Lula perante seus eleitores? Bem, confesso a vocês que não penso em outra coisa ultimamente. Não sei o que Luiz Gonzáles anda pensando, mas intuo que ele começou bem. Alckmin ainda é desconhecido de muita gente e precisa conquistar uma posição que Lula já tem. Há um desequilíbrio de imagens entre Lula e todos os seus adversários, decorrente do fato de que todos querem ser o que Lula já é. Essa é uma das vantagens do candidato à reeleição.

O primeiro passo para Alckmin desconstituir Lula, então, é constituir-se, aos olhos do eleitor, como alguém que tem estatura e atributos que o qualificam para ocupar o trono. O equilíbrio da balança de imagens que possibilitará a Alckmin polarizar com Lula, permitindo-o questionar o candidato que já é presidente como alguém que é percebido pelo eleitor como um "igual" a Lula, é uma construção que precisa ser erigida na primeira fase da campanha. E, me parece, é isso que Gonzáles começou a fazer. Espero. A similaridade entre os programas de Lula e Alckmin no primeiro dia favoreceu Alckmin, nessa linha de argumentação, já que igualou os, até então desiguais, aos olhos do eleitor.

Observando-se, de um ponto de vista apenas racional, o péssimo desempenho de Lula na entrevista do Jornal Nacional pode ter ajudado a oposição na tarefa de trazer Lula ao rés do chão. Mas, e se os eleitores de baixa renda e baixo grau de instrução perceberam Lula como vítima de um massacre da "malvada Rede Globo"?

É a leitura que o "eleitor médio" de Lula faz do desempenho dos candidatos na mídia o que interessa e não a opinião do Cesar Maia, do Reinaldo Azevedo, do Denis Rosenfield, a minha ou a sua opinião, o que interessa para efeito de estratégia eleitoral.

Ou seja, o péssimo desempenho de Lula no JN, sob um ângulo racional de análise, pode ter sido percebido de outra forma pelo eleitor de Lula. Analisando-se o fato do ponto de vista de uma leitura emocional feita pelo eleitorado de baixa qualificação que prefere o molusco no poder, Lula pode ter se beneficiado daquilo que um eleitor racional vê com desastre.

Não sei se foi isso que aconteceu nesse caso. Intuo que não, pois foi depois desse mau desempenho que Duda Mendonça decidiu proibir Lula de ir aos debates do primeiro turno. Mas fiz esse exercício de raciocínio para permitir ao meu leitor a reflexão sobre a complexidade do problema para quem lida com estratégias de marketing.

Discordo de Cesar Maia, que acha que essa etapa de apresentação dos candidatos aos eleitores já foi cumprida pelo Jornal Nacional. A desconstituição da imagem de um político com o capital simbólico que Lula acumulou não é simples. Os eleitores de Lula que Alckmin precisa conquistar não têm perfil de gente muito informada sobre política. Informá-los sobre quem é Alckmin é pré-requisito para obter credibilidade, de forma a, depois, poder informá-los sobre quem realmente é Lula.

Existem inúmeras fórmulas de propaganda negativa, aplicáveis à necessidade de desconstituição da imagem de um adversário. Pode-se usar o humor; pode-se recorrer a denúncias de ex-aliados traídos; pode-se chamar o eleitor à reflexão estimulada; podem-se usar reportagens-denúcia com estilo jornalanda (jornalismo+propaganda); pode-se tentar o confronto direto em debates; pode-se recorrer a ataques desferidos por lideranças aliadas que poupem o candidato do desgaste de atacar diretamente o preferido da maioria; pode-se usar de maior agressividade no rádio do que na TV; pode-se comparar as cenas de Lula dizendo à Fátima Bernardes que demitiu Palocci, com as cenas de lula na transmissão do cargo de Palocci, quando este é chamado de meu irmão pelo molusco; o mesmo pode ser feito com a demissão de Zé Dirceu. Seria Lula desconstruindo Lula. Que tal essa?

Seja qual for o caminho a ser adotado, me parece pouco inteligente partir para a agressão virulenta na largada. Para isso, felizmente, já temos Heloisa Helena como companheira de viagem. Mesmo assim, bem que o Cesar Maia poderia parar de ajudá-la com seus conselhos sobre como lidar com a TV, nesse caso, infelizmente, corretos.
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