PRIMEIRA LEITURA
Quem lê diariamente as análises do prefeito do Rio, Cesar Maia (PFL),
no famoso “Ex-Blog” que ele distribui no início de toda manhã, sempre
aprende alguma coisa com seu conhecimento de comunicação e história,
sua perspicácia política e senso positivo de provocação. Suas
análises das pesquisas de intenção de voto nunca devem ser
desconsideradas. Maia é um gestor público de primeira classe e está
sempre muito bem informado.
Mas o prefeito é isso tudo e, ao mesmo tempo, o retrato acabado do
estado político da oposição que disputa a Presidência da República
contra Luiz Inácio Lula da Silva. Ele está hoje mais para Cesar Tim
Maia, aquele que bagunça o coreto do festival de música, do que para
prefeito Cesar Maia do PFL, o partido dito aliado de Geraldo Alckmin,
do PSDB, partido igualmente dito aliado do PFL.
Longe de mim achar que o prefeito Cesar Maia seja o culpado político
do que quer que seja na campanha de Alckmin. Tomá-lo por culpado pelo
atoleiro oposicionista seria transformá-lo em bode expiatório de uma
situação de muitos desacertos e nenhuma coordenação. Seria uma
explicação fácil e tola para um imbróglio para lá de complexo.
Juntos, o que o prefeito do Rio, as posturas do PFL e do PSDB, o
candidato tucano Alckmin e o senador José Jorge, vice do tucano,
representam bem é a descoordenação plena das oposições. Elas não
conseguiram definir um manual mínimo de ação e ficam o tempo todo, no
bastidor, lutando para ver qual de duas idéias aparentemente
divergentes vai se tornar hegemônica: a idéia de “desconstruir” Lula
e seu governo ou a idéia de fazer “programas propositivos”, com pouca
crítica política para não vitimizar Lula.
Ora, senhores, cumpram o papel de oposição e façam o que tem de ser
feito, que é, ao mesmo tempo, desconstruir e denunciar o governo Lula
e propor alternativas para que o Brasil cresça mais do que no governo
Lula, a economia gere mais renda do que no governo Lula, o Estado
seja mais bem administrado do que no governo Lula e por aí afora. É
papel da oposição, sim, fazer um programa como o que o PFL levou na
quinta-feira ao ar, no horário do rádio e da TV. O PFL disse o que os
jornalistas descobriram, o PFL mostrou o que as comissões
parlamentares de inquérito apuraram, o PFL apresentou objetivamente o
que concluiu o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza.
O PFL fez o que o PSDB se recusa a fazer. Mas o vice do PFL, o
senador José Jorge, não pode confundir crítica política com desabafo
de botequim, acusação formulada com um frouxo “dizem por aí”... que
Lula, o presidente, trabalha pouco e bebe e viaja muito. Havendo uma
estratégia por trás da crítica e da denúncia e uma combinação mínima
sobre o que dizer em uma convenção regional para fazer mídia
positiva, isso evita que um político pegue no microfone e diga o
andam “dizendo por aí” e o que lhe dá na telha.
O PSDB não se reúne para fazer o dever de casa, preparar uma agenda
objetiva de críticas, uma agenda de propostas e um elenco de frases
de efeito crítico contra Lula. Mas o ministro Luiz Dulci (secretaria-
geral da Presidência) orientou direitinho Lula sobre como reagir ao
ataque de José Jorge. E a ordem foi não responder, de jeito nenhum,
mas nem de raspão, nem em pensamento, jamais abrir o flanco para
discussões sobre se Lula trabalha muito ou pouco, justificar-se sobre
bebida ou sobre viagens. De jeito nenhum! Lula posou de vítima do
“ódio destilado” pela oposição. A essa estratégia ele agregou o
diferencial característico, aquela penca de metáforas futebolísticas,
conversa de pé de ouvido com o povo. Mas não deu um ai sobre viagens,
não deu um pio sobre bebida, não tratou de se justificar sobre como
faz e o que faz na Presidência.
Mas, por mais descoordenados que estejam os tucanos – e estão –, nada
justifica que um estrategista e experiente político como o prefeito
Maia, dito aliado de Alckmin, use o seu “Ex-Blog” para se comportar
como se fosse um consultor independente, a distribuir conselhos
públicos sempre acompanhados do bordão “Ô Alckmin”. Ô Maia, o PT está
quase a publicar o texto do “Ex-Blog” no site do partido. É um
roteiro e tanto!
A culpa é de Maia? Não. A culpa é da coordenação da campanha da chapa
Alckmin-José Jorge, que não coordena nada, não coordena o material
humano que tem à mão. Coordenação mais do que necessária, uma vez que
uma verdadeira constelação de líderes tucanos e pefelistas está de
olho em 2010 – um fato naturalmente desestabilizador, um fato a
impor, naturalmente, ainda mais coordenação política de interesses,
egos e expectativas.
[ruinogueira@primeiraleitura.com.br]
Publicado em 16 de junho de 2006.